Principal motor da economia brasileira, São Paulo começa a ver surgir novos polos de exportação de maior valor agregado, mas a venda ao exterior de produtos de alta intensidade tecnológica, como aviões, farmacêuticos, instrumentos médicos e computadores representa, ainda, apenas 11,1% do total. Produtos de média-alta intensidade tecnológica, como veículos, máquinas e equipamentos mecânicos e produtos químicos somam 29,7% de todas as exportações do Estado. Já as importações de produtos com alta ou média-alta intensidade são 65,5% do total.
Com origem concentrada nas regiões de São Paulo, Campinas e São José dos Campos, essas exportações altamente competitivas começam a partir em maior quantidade também de outros centros urbanos, como São Carlos, com a instalação de novas fábricas.
O detalhamento das vocações exportadoras de cada município paulista resulta de um estudo ainda inédito recém-concluído pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo, que pode mudar a maneira governamental de incentivar a produção industrial no país.
"Todos concordam que é preciso inovação e tecnologia, mas é bem mais difícil medir o que está acontecendo nessas áreas", comentou para a coluna o diretor do departamento de Relações Internacionais da Fiesp, Thomas Zanotto, que,
com apoio do governo, coordenou o estudo sobre as exportações paulistas usando metodologia da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), tradicionalmente aplicada para as principais economias ocidentais.
Faz sentido falar em estudos para orientar políticas voltadas à indústria, num momento em que a ordem é cortar gastos, inclusive incentivos oficiais á produção? Zanotto responde com bom humor: "Em momentos complexos assim, há duas opções: ou chorar ou vender lenço". Decididos a não verter lágrimas, os dirigentes da Fiesp buscam conhecer melhor o setor, para oferecer ao governo um quadro mais fácil de entender - e com maior facilidade para identificar problemas, remover obstáculos e avaliar resultados.
Em São Paulo, que correspondeu em 2014 a 30% do fluxo comercial brasileiro, com pouco menos de US$ 60 bilhões em exportações e quase US$ 85 bilhões em importações, saber onde e o que acontece no comércio exterior permitiria modelos inventivos de apoio, deixando de lado a custosa tentativa de criar campeões nacionais e direcionando instrumentos já existentes de incentivo à exportação.
O estudo da Fiesp identificou, por exemplo, o surgimento de um "cluster" industrial (o chamado arranjo produtivo local, com concentração de indústrias compartilhando condições favoráveis de produção) a partir da instalação de uma fábrica da Honda na região de São Carlos, Limeira e Itirapina, antes concentrada em empresas agrícolas. A instalação de fornecedores e a criação de infraestrutura já atraiu outras indústrias não ligadas diretamente, como uma empresa italiana de máquinas de empacotamento para embalagem, que se sentiu confiante em montar fábrica em São Paulo após consultas com outras empresas já instaladas.
O estudo da Fiesp mostra que mesmo o maior centro industrial do país ainda tem forte concentração de produtos de baixa ou baixíssima tecnologia de produção. No Estado de São Paulo chegam a 45,1% do total as exportações de baixa ou média-baixa tecnologia (de combustíveis e produtos metálicos a alimentos e têxteis), e a 14,1% os produtos não industriais, como grãos e minério. "Se é assim em São Paulo, pode-se imaginar as outras regiões", comenta o diretor da Fiesp.
O estudo é, claro, apenas um pequeno passo para a construção de uma agenda proativa na indústria, mas os dirigentes paulistas acreditam que o governo terá interesse em aproveitá-lo no esforço de estímulo à exportação - uma das poucas saídas para promover crescimento da economia no curto prazo. Mais adiante, e expandindo esse tipo de análise para outros Estados do país, será possível ao Brasil ter o que inacreditavelmente não tem ainda: uma metodologia mais acurada para medir o impacto das diversas políticas públicas e das condições macroeconômicas na capacidade tecnológica da produção nas diversas regiões brasileiras.
É interessante que o estudo tenha sido concluído em um momento de aproximação do Brasil com a OCDE vista como uma espécie de clube dos países ricos (embora o México faça parte do grupo). Esta semana, o governo anunciou a decisão de assinar um acordo de cooperação com a OCDE, em temas como aumento de produtividade, acompanhamento estatístico de comércio e crescimento econômico com desenvolvimento sustentável. Numa mudança sensível do tom adotado em Brasília sobre a organização, autoridades da equipe econômica anunciaram o acordo, a ser assinado em junho, como fundamental no esforço de aumento da produtividade.
O Brasil, desde 2007, tem status de "engajamento ampliado" como observador da OCDE, o que significa que participa de vários comitês e grupos de trabalho da instituição, onde são discutidas e decididas regras comuns em temas tão distintos quanto educação e garantia de competição empresarial. O país sempre resistiu a tornar-se membro pleno da OCDE, porém, por temor de perder vantagens conferidas a países emergentes e de criar restrições a políticas públicas em áreas como a de incentivos tributários.
No anúncio desta semana, a equipe econômica informou que quer participar dos comitês da OCDE que debatem e decidem regras para economia digital, para indústria, inovação e empreendedorismo e para políticas regulatórias. Essa adoção de parâmetros e metodologias de consenso entre países desenvolvidos é uma nova tendência na discussão interna do governo que merece ser acompanhada de perto.
Fonte:Valor Econômico/Sergio Leo é jornalista e especialista em relações internacionais pela UnB
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