Lideranças do agronegócio brasileiro afirmaram nesta segunda-feira, 6, que é preciso ter cautela na forma como o País trata a China, o principal destino das exportações agropecuárias e um dos parceiros comerciais mais importantes. É consenso entre as autoridades ouvidas pelo Estado que o momento é de cautela e de pacificação diante das incertezas causadas pelo avanço da pandemia do coronavírus, que já contaminou 1,3 milhão de pessoas e deixou mais de 73 mil mortos.
"Nossa preocupação nesse momento é de pacificar e manter as boas relações. Não queremos briga, precisamos dar suporte ao governo para atravessar crise. Estamos muito preocupados e precisamos de cautela", afirmou o ex-ministro da Agricultura Neri Geller, hoje deputado federal pelo PP-MT. No Mato Grosso, 8 em cada 10 sacas de soja - a principal commodity agrícola exportada pelo País - têm como destino a China. Diante da tendência de redução de consumo e de desaceleração econômica, Geller e outras lideranças pedem serenidade.
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Em 2019, as exportações do agronegócio totalizaram US$ 96,7 bilhões - a China foi responsável por 35% das compras. No fim de semana, o ministro da Educação, Abraham Weintraub, insinuou que os chineses se beneficiaram da crise do coronavírus e postou imagens do personagem Cebolinha na muralha da China trocando 'L' pelo 'R', em alusão a como os chineses falam. Depois, apagou a postagem. A Embaixada da China no Brasil respondeu que as publicações eram "completamente absurdas e desprezíveis, que têm cunho fortemente racista e objetivos indizíveis, tendo causado influências negativas no desenvolvimento saudável das relações bilaterais China".
O também ex-ministro da Agricultura Alysson Paulinelli se mostra preocupado, mas comenta que não é hora de hostilizar A ou B. "Sou muito realista: não devemos insultar ninguém. E não podemos misturar comércio com política, precisamos de uma posição mais sadia, mais madura", afirma o hoje presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Milho (Abramilho).
Sem propósito
O presidente da Associação Brasileira do Agronegócio (Abag), Marcello Brito, afirma que a relação do Brasil com a China é muito importante "tanto na ida quanto na volta" e que não é durante uma crise como essa que se deve resolver problemas. Ele lembra que a China é a maior compradora de várias commodities agrícolas e também de minério ferro, além de ser o maior fornecedor de insumos para muitas indústrias brasileiras.
"Quando a gente abre um tipo de disputa dessas num momento completamente inadequado e completamente desnecessário, o que a gente espera em troca?", questiona.
Sem retaliações
"Já temos tantos problemas, não precisa criar mais um. O Brasil não ganha nada com isso, só perde", concorda Pedro de Camargo Neto, vice-presidente da Sociedade Rural Brasileira. Na prática, no entanto, Pedro de Camargo acredita que os chineses não devem retaliar os produtos brasileiros devido ao pragmatismo e à visão de longo prazo.
"Eles estão vendo que essas bobagens não têm apoio do Brasil, tem sempre havido uma reação forte, e eles entendem que o Brasil é mais que esse governo. Mas, claro, pode criar uma certa má vontade, deixarem de ajudar em algum momento", avalia o ex-secretário de produção do Ministério da Agricultura.
O presidente da Aprosoja Brasil, Bartolomeu Braz, também não vê retaliações e minimiza a disputa política. Ele comenta que a relação China-Brasil é forte e afirma que os chineses conhecem a produção brasileira e confiam na qualidade dos produtos nacionais. "Não nos preocupamos com isso, o momento é de instabilidade e qualquer vírgula pode acirrar os ânimos. Mas somos produtores de matérias-primas para as proteínas animais, não vejo outros mercados que possam atender nesse momento. Mesmo diante dessa situação, continuaremos no campo produzindo", comenta.
Fonte: Estadão