O novo ministro interino do Desenvolvimento, Mauro Borges, ex-presidente da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial, era, até a semana passada, um dos principais conselheiros do então ministro Fernando Pimentel. Era quem lhe fornecia os dados para apostar em uma maior recuperação da confiança e dos investimentos industriais a partir deste ano no país. O setor de óleo e petróleo e grandes projetos no setor farmacêutico, animados pelas compras governamentais, estão entre as principais fontes do otimismo. Borges terá, porém, trabalho para animar outros setores.
A divulgação do índice de confiança do empresário industrial, da Confederação Nacional da Indústria (CNI), nesta segunda-feira, deve confirmar o desânimo. Esse indicador está em seus mais baixos níveis desde que começou a ser registrado, em 2000. Outras pesquisas da CNI confirmam a queda no ânimo da indústria que, em dezembro, alcançou as grandes empresas de forma preocupante. Setores de base e de bens de capital estão entre os pessimistas, o que é mau sinal.
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"A sinalização sobre qual será a direção da taxa de câmbio é fundamental para que empresas retomem investimentos", avalia o presidente da Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica (Abinee), Humberto Barbato. Para ele, o ano de 2014, devido às eleições, deve ser um "ano perdido" em matéria de novidades capazes de animar investimentos no setor eletrônico.
Empresários pedem mais câmbio, mais proteção e reformas
À frente de uma associação com fabricantes de produtos de consumo, como TVs e tablets, animados com a perspectiva de aumento na demanda, e o setor elétrico, com grandes equipamentos de infraestrutura, Barbato reflete sentimentos ambíguos dos empresários, alguns com maior expectativa de resultados da "agenda positiva" do governo, a partir da retomada tardia das concessões de serviços públicos; outros desalentados com o chamado "custo Brasil" e a perda de competitividade da indústria nacional.
A expectativa do governo, de um dólar oscilando próximo a R$ 2,40 neste ano, está ainda abaixo das esperanças do setor privado. Barbato aponta como desejável a cotação acima de R$ 2,50; o presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, Marco Polo de Mello, que representa as siderurgias, prevê que, sem o dólar acima de R$ 3,0, seu setor seguirá arredio à ampliação de investimentos, acossado pelo excesso de capacidade interna e externa, e pela competição violenta das importações, especialmente chinesas.
"A siderurgia tem de operar acima de 80% da capacidade para ter resultado; estamos com 65%, abaixo da média mundial de 69%", lembra Marco Polo. A perda de competitividade da indústria não se limita ao aço, é sistêmica e generalizada, ressalta. Não à toa, a participação da indústria de transformação no Produto Interno Bruto (PIB) despencou de 24% para menos de 13%, e o superávit da indústria de transformação no comércio exterior, da ordem de US$ 120 bilhões acumulados entre 2002 a 2007, tornou-se um déficit de US$ 130 bilhões (também acumulado) entre 2008 e 2013, argumenta.
Os empresários elogiam o corte de impostos sobre folha de pagamentos, que, segundo o governo, beneficiou 66% dos manufaturados do país; mas notam que não há espaço para ampliar o alívio nos tributos, reduzindo impostos sobre investimentos, por exemplo. Marco Polo lembra que a China concede um rebate de 17% nos impostos para os exportadores. No Brasil, o aperto no caixa extinguiu o programa similar de compensação de impostos à exportação, o Reintegra, que devolvia 3% do faturamento para cobrir tributos cobrados indevidamente.
Essa margem restrita de manobra do governo para novas medidas de apoio à indústria alimenta o pessimismo, segundo o diretor-secretário da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Carlos Pastoriza. Com uma queda de 5,7% no faturamento, descontada a inflação, em 2013, a Abimaq prevê para 2014 faturamento próximo ao do ano passado, o que deixaria o desempenho da indústria cerca de 10% abaixo do de 2011.
Pastoriza fala em "desindustrialização silenciosa", com fechamento de empresas e troca de produção nacional por importações. A valorização do dólar, se for abrupta, pode até prejudicar indústrias, que levarão tempo para recuperar fornecedores locais, diz ele.
"O governo até fez boas ações pontuais para ajudar nesse ambiente tóxico para os investimentos, como a desoneração da folha e do IPI e a redução no preço de energia", lista Pastoriza. Ele também reconhece os benefícios da recuperação de grau de investimento para o país nas agências de classificação de risco e o aumento do mercado consumidor. A falta de competitividade, porém, tem raízes mais profundas, que exigiriam as famosas "reformas" na tributação, na lei trabalhista e no sistema político-partidário, argumenta.
O desânimo com as perspectivas de avanço em médio prazo leva setores como o do aço a cobrar, em 2014, maiores tarifas, ainda que temporárias, contra importados. "A apreciação do dólar é mundial, não muda muito nossa competitividade em relação a outros países emergentes", comenta Marco Polo de Mello, que prevê uma ligeira melhoria das condições das siderúrgicas, mas por causa da base baixa de comparação de 2013. "Não só no caso do aço, temos de ter coragem de falar que precisamos de proteção emergencial para poder respirar".
Mauro Borges tem à mão estatísticas sobre o volume bilionário de financiamento a juros mais baixos oferecido pelo governo nos últimos anos, e o impacto positivo das ações oficiais sobre emprego e investimentos. Os executivos cobram mais. E, o que é preocupante, não creem que serão atendidos.
"Não há ninguém no horizonte capaz de fazer as reformas que devem ser feitas, nem clima político nem clamor popular", diz Pastoriza, da Abimac. "Talvez tenhamos de esperar uma crise, como na Espanha".
Fonte: Valor Econômico/Sergio Leo é jornalista e especialista em relações internacionais pela UnB