Passada a crise, é hora de preparar as bases que vão garantir a sustentabilidade da siderurgia brasileira.
Aidar Abouchar*
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Após um período conturbado, em função da crise econômica mundial, a siderurgia brasileira retoma o fôlego e passa a encarar 2010 com os olhos do otimismo. Os números consolidados até o momento indicam que o setor vem se recuperando e pode alcançar, em breve, os indicadores pré-crise. Mais do que isso, anima a siderurgia o horizonte futuro de oportunidades.
No ano passado, o fechamento de mais da metade dos alto-fornos existentes no país tornou-se símbolo das dificuldades vivenciadas pelas usinas. A queda na produção, no comparativo com 2008, chegou a 21,4% no caso do aço bruto (totalizando 26,5 milhões) e 18,2% no de laminados (20,2 milhões de toneladas), de acordo com o IABr - Instituto Aço Brasil, entidade representativa das empresas do setor. Os negócios também encolheram: as exportações, da ordem de 8,9 milhões de toneladas e US$ 4,9 bilhões, ficaram 2,9% menores em volume e 38,6% em valor. Apesar da ação do governo de desonerar a carga tributária de grandes consumidores de aço, como as indústrias automobilística e de eletrodomésticos, as vendas domésticas também tiveram retração: 25,2%, passando a 16,3 milhões de toneladas.
O cenário projetado para 2010 difere bastante do descrito acima. Já em janeiro a produção de aço bruto somou 2,7 milhões de toneladas, volume 4,4% maior do que o de dezembro e 66,6% superior ao do mesmo mês de 2009. A previsão do IABr para o ano é de recuperação no consumo doméstico (alta de 23,3% ) e nas exportações (crescimento de 23,4%), possibilitando uma produção de 33,2 milhões de toneladas de aço bruto, próximo ao resultado de 2008 (33,7 milhões de toneladas).
Além do melhor momento da economia brasileira e mundial, essas previsões refletem a expectativa da cadeia produtiva do aço em relação a diversos projetos que vão movimentar o Brasil nos próximos anos. Obras de infraestrutura de porte, programas de estímulo à construção civil, como o Minha Casa, Minha Vida, investimentos para exploração de petróleo na camada pré-sal, além dos previstos para a Copa do Mundo e as Olimpíadas, devem impactar positivamente a demanda de produtos siderúrgicos e abrir caminho para o crescimento sustentado do setor. Segundo o IABr, somente os projetos relacionados aos dois eventos esportivos devem aumentar o consumo de aço em 8 milhões de toneladas, entre 2010 e 2016.
É mirando essas oportunidades que as usinas anunciaram aportes de US$ 39,8 bilhões para o período, valor que seria suficiente para elevar a capacidade produtiva de atuais 42 milhões de toneladas de aço para 77 milhões de toneladas. A maior parte das empresas tem planos ambiciosos para o período, que incluem tanto a modernização e ampliação da capacidade instalada das usinas, como a implantação de novas plantas.
Claro, o avanço da siderurgia brasileira vai depender de fatores que vão além da disposição das empresas em levar adiante os planos anunciados. Cabe ao governo estruturar uma política industrial eficiente, garantir um ambiente institucional com regras estáveis – importante ressaltar que os projetos siderúrgicos têm prazos longos de maturação, em função de características próprias à atividade – e se empenhar para solucionar questões que hoje impedem o setor alcançar uma performance compatível com suas potencialidades. Entre elas, as altas taxas de juros praticadas no país, entre as maiores do mundo, e o complexo e oneroso sistema tributário.
Na área fiscal, o governo sinalizou recentemente que pode modificar a política de tributação da mineração, de forma a estimular a agregação de valor na indústria. Atualmente, as vendas externas de minério de ferro pagam menos impostos que as de produtos manufaturados. Por conta dessa distorção, temos um país que é o segundo maior produtor de minério de ferro do mundo, com reservas que somam 33 bilhões de toneladas, mas que ocupa apenas a nona posição no ranking da produção global do aço. De acordo com a World Steel Association, corresponde ao Brasil a fatia de 2,5% do mercado siderúrgico – reduzida para 2,2% em 2009.
Há também desafios no que diz respeito às barreiras comerciais protecionistas que atrapalham o acesso da indústria a certos mercados. O caso mais importante é o das taxas de importação impostas pelos Estados Unidos ao aço brasileiro desde a era Bush. A sobretaxação chega a R$ 400 por tonelada de produto, em determinadas situações. Destaco ainda a formação de mão-de-obra, das áreas operacionais às executivas, como um fator preponderante para o sucesso dos empreendimentos da siderurgia e de todos os setores que agora se veem diante de oportunidades como nunca antes. O capital humano é e sempre será o principal motor do desenvolvimento.
A siderurgia já é uma das atividades que mais contribui para o desenvolvimento do Brasil e pode, nos próximos anos, ampliar esse compromisso. Passada a crise, o horizonte é de otimismo e o momento, de formar bases que vão garantir a sustentabilidade do setor nos próximos anos.
*Diretor de Mineração e Siderurgia da ABEMI – Associação Brasileira de Engenharia Industrial