Empresas do setor de energia aguardam para este ano ainda a regulamentação que definirá como serão realizadas a cessão de áreas, as licenças ambientais e os leilões que darão o pontapé inicial para a construção de instalações eólicas offshore. Elbia Gannoum, presidente da Abeeólica, avalia que, num horizonte de sete anos, os primeiros aerogeradores em alto-mar começarão a gerar energia elétrica no país.
“Esperamos a regulamentação para este ano e, sendo assim, acredito que o primeiro leilão de energia elétrica para segmento offshore deverá ocorrer em 2023. A partir de então, as empresas precisarão entre cinco e sete anos para construir uma instalação eólica offshore”, calcula. Isso significa que a energia elétrica gerada com a força do vento que sopra no mar poderá ocorrer entre 2029 e 2030.
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O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais (Ibama) tem em mãos hoje mais de 80 GW de projetos offshore em análise, sinalizando o interesse de grandes investidores, apesar dos custos altos de instalação e da complexidade tecnológica envolvida. Entre as interessadas estão a Shell Energy, TotalEnergies, Equinor e a Acciona.
Entre 2020 e 2021 a capacidade adicional de energia eólica offshore no mundo mais do que triplicou, passando de 6 GW para 21 GW. Esse avanço faz parte dos esforços para a descarbonização e transição energética mundial, de acordo com a Agência Internacional de Energia (IEA, na sigla em inglês). Daí a expectativa de aumentar o potencial atual em 15 vezes, e atrair cerca de US$ 1 trilhão de investimentos até 2040.
No Brasil, o interesse por esse meio teve início há alguns anos e, desde janeiro, tornou-se uma possibilidade, com a publicação do Decreto 10.946, que dispõe sobre a cessão de uso de espaços físicos e o aproveitamento dos recursos naturais no mar para a geração de energia elétrica a partir de empreendimentos offshore. Estudos preliminares apontam que o potencial da costa brasileira gira em torno de 700 GW em locais com profundidade até 50 metros.
Felipe Gonçalves, superintendente de pesquisa do Centro de Estudos em Energia da Fundação Getulio Vargas (FGV), avalia que eólicas offshore têm vantagens relevantes em relação à tecnologia em terra. Além de ventos com velocidades mais altas, a baixa rugosidade da superfície no ambiente marinho proporciona menos turbulências e uma menor variação da velocidade em diferentes alturas.
Com ventos mais regulares, segundo ele, os projetos offshore têm observado em diferentes regiões do país fator médio de capacidade de 41%, superior ao de projetos onshore, com média 36%. “Outra característica que tem estimulado seu crescimento [no âmbito global] é o potencial de integração com o setor petrolífero, em virtude de economias de escopo advindas do aproveitamento conjunto da estrutura portuária e logística já existente, além de todo o conhecimento adquirido com o desenvolvimento de projetos de energia e petróleo”, diz Gonçalves.
Segundo ele, a experiência do setor de óleo e gás na instalação de plataformas fixas em leito marinho ou flutuante pode reduzir o tempo de desenvolvimento dos projetos. Daí não ser surpresa o fato de a Shell Brasil ter entrado em março com um pedido de licenciamento ambiental para seis projetos de geração eólica offshore.
São três no Nordeste (Piauí, Ceará e Rio Grande do Norte), dois no Sudeste (Espírito Santo e Rio de Janeiro) e um no Rio Grande do Sul, com potencial total de 17 GW. “No momento, a Shell aguarda a definição do termo de referência com as orientações para as análises socioambientais que serão desenvolvidas para cada zona logo após a disponibilização do termo pelo órgão ambiental”, explica Maria Gabriela da Rocha Oliveira, gerente de geração renovável da Shell.
De acordo com ela, além do longo período de estudos, cada projeto deverá passar por um processo de audiência pública e por avaliação técnica do Ibama. Na visão da Shell, o potencial eólico offshore precisa ser visto para além da geração de eletricidade, já que se trata de uma fonte que pode assumir diferentes formas, com sinergias com diferentes setores.
“A eólica offshore é uma forma para o país manter elevada a participação de renováveis em sua matriz elétrica, e uma grande oportunidade para uma economia mais verde, na qual o elétron das usinas eólicas pode ser utilizado para a produção de hidrogênio renovável e ser a base de um planeta que busca a desfossilização”, diz Gabriela.
Gonçalves, da FGV, lembra que, apesar de o potencial eólico brasileiro ser bastante importante, a sua expansão no curto prazo traz alguns pontos de atenção porque o país tem, neste momento, outras fontes com custos menores e de melhor aproveitamento. “Acredito que não precisamos incentivar. Com a queda nos custos, ela [a offshore] vai se viabilizar, e sua inserção será natural”, diz.
Fonte: Valor