A presença das micro e pequenas empresas brasileiras no mercado internacional está ficando cada vez mais difícil. Sem incentivos e sofrendo problemas como burocracia e dificuldade para aproveitar as isenções tributárias nas vendas ao exterior, as empresas de menor porte vêm perdendo terreno ano após ano nas exportações. Números divulgados neste primeiro trimestre pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC) apontam para o aumento da concentração dos negócios. A participação das pequenas e micro no total exportado, que já foi de 2,2%, recuou para menos de 0,9%, de acordo com as projeções realizadas sobre dados preliminares.
Em 2013, 1,3% das empresas exportadoras responderam por 79% da receita com vendas ao exterior, de acordo com o MDIC. No ano anterior, o mesmo grupo representava 72% da exportação total. O ministério revela que cerca de 2 mil empresas deixaram de exportar nos últimos seis anos - a grande maioria de pequeno porte.
Embora os números consolidados de 2013 sobre a participação das empresas na balança comercial conforme o porte ainda não estejam disponíveis, é possível concluir que o crescimento das vendas ao exterior se deu pelo aumento das vendas de commodities, de acordo com avaliação do próprio ministério. Como praticamente 100% das vendas de commodities são feitas por grandes empresas, seria natural que a concentração aumentasse.
Números do Serviço Brasileiro de Apoio à Micro e Pequena Empresa (Sebrae) mostram que a participação das pequenas empresas na exportação, em valor, caiu abaixo de 1%, menos da metade do que era há poucos anos, comenta o Marcelo Aidar, professor da Escola de Administração e Economia da Fundação Getulio Vargas em São Paulo. "Se formos verificar, as micro e pequenas empresas brasileiras, na comparação com as de outros países, têm uma participação nas exportações muito tímida."
Para Aidar, parte da responsabilidade cabe às próprias empresas. "Elas não enxergam oportunidades no exterior", comenta. Isso em função da velha ideia de que o mercado interno, por ser grande, é suficiente. "Elas não só não olham para o exterior, como também mal olham para o Brasil."
Parte do problema pode estar na dificuldade em superar a barreira tributária, diz a advogada Cynthia Kramer, do escritório L.O. Baptista-SVMFA. Como as exportações são isentas de alguns tributos, como o ICMS, os impostos pagos pelas empregas ao longo da cadeia produtiva podem ser descontados na etapa final, de venda ao exterior. Mas nem sempre a operação é viabilizada. "Muitas vezes o exportador enfrenta obstáculos para transferir seus créditos tributários obtidos na exportação, principalmente se ele vende pouco ou não vende no mercado interno", afirma. "Nem sempre há interessados na compra desses créditos." Cynthia acha que o governo deveria criar mecanismos para que a negociação de créditos tributários se tornasse interessante para quem os detém e para quem os adquire.
Segundo ela, os entraves burocráticos são "os mesmos de uma empresa grande". A dificuldade maior é que as pequenas não sabem lidar com eles nem têm estrutura e recursos para isso. Pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI) divulgada em janeiro informa que 83% dos empresários consultados apontaram problemas para exportar e 79% disseram não conseguir melhorar seu desempenho externo por conta de questões burocráticas, tributárias e alfandegárias.
O governo deveria ajudar as empresas a conhecer os mercados, defende Aidar. Segundo ele, muitas câmaras de comércio que funcionam aqui auxiliam os exportadores de seus países de origem a entender o Brasil, ao passo que as companhias nacionais não desfrutam desse benefício. "Embora essas câmaras de comércio sejam entidades privadas, o governo deveria oferecer esse tipo de auxílio."
A fuga das pequenas do mercado internacional não é exatamente uma novidade para a economia brasileira. Ana Vecchi, diretora da Vecchi Ancona Inteligência Estratégica, afirma que uma pesquisa antiga mostra que 50% das pequenas empresas que iniciam exportação deixam de exportar no ano seguinte. Depois de cinco anos, só 20% das empresas de pequeno porte que se iniciam no mercado externo permanecem nele.
Algumas iniciativas isoladas têm servido para impedir que esses números tornem-se ainda piores. Uma delas é a parceria firmada entre a Agência de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex) e o Instituto Brasileiro da Cachaça (Ibrac). Projeto assinado em 2012 com validade até metade deste ano - e que deverá ser renovado por mais dois exercícios - promove o destilado em várias partes do mundo.
O marketing explora o fato de que só o Brasil produz cachaça e procura vender a ideia de um destilado com tanta qualidade quanto qualquer outro.
De acordo com Carlos Lima, diretor executivo do Ibrac, as vendas ao exterior cresceram no ano passado em relação a 2012. O aumento foi de 10% em receita e 11% em volume. O setor de cachaça é um dos poucos do país em que a maior parte das empresas exportadoras é de pequeno porte, revela Lima. Entre as 39 empresas que participam do projeto junto à Apex, 28 são micro ou pequenas. Há 1.484 estabelecimentos formalmente registrados para produção de cachaça no país. O Ibrac representa cerca de 80% do volume produzido.
(Fonte: Valor Econômico/Eduardo Belo | Para o Valor, de São Paulo
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