Trabalhadores que atuam em empresas do ramo de serviços em transportes viram colegas perder o emprego em quase a metade das companhias em 2020. Na indústria automotiva, o corte foi semelhante, em torno de 45%.
Em ambos os casos, parte das companhias ainda prevê demitir empregados neste primeiro semestre.
Essas empresas dependem da circulação de pessoas e mercadorias, comprometida com as restrições sociais impostas pelo novo coronavírus, cujos casos estão em ascensão novamente.
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Um estudo de quesitos extraordinários aplicados nas Sondagens da FGV, em dezembro, mostra que 45,9% das empresas do ramo de transportes rodoviários fecharam vagas em 2020. Além disso, praticamente 20 de cada 100 delas preveem novos cortes até junho deste ano.
Dentre aquelas de transporte ferroviário, aéreo e aquaviário (que, na pesquisa, se encaixam na categoria “outros serviços de transporte”), 52,4% declararam que fecharam postos de trabalho.
“Esses segmentos muito impactados pela pandemia fizeram muitas demissões no ano, e a expectativa é que não piore mais. Mas existe um caminho lento de recuperação”, disse Rodolpho Tobler, um dos autores da pesquisa.
Na avaliação do pesquisador, a perspectiva do setor de serviços de transporte para 2021 é de, ao menos, sustentação do cenário atual—quase 70% esperam manter o quadro de funcionários. Mas a base de comparação é baixa, pois as perdas foram bastante expressivas no ano passado, durante a pandemia.
Ainda nos prestadores de serviços, o segmento ligado aos transportes que mais espera demitir em 2021 é o de armazenagem, serviços auxiliares de transportes e correio, com expectativa em 20,3% das empresas é de novos cortes, sendo que 4 de cada 10 já demitiram no ano passado.
Do lado da indústria, a situação é semelhante. Nas fábricas de veículos automotores, houve redução no número de pessoas ocupadas em pelo menos 46,3% das companhias. E mais 11,3% ainda esperam demitir no primeiro semestre de 2021.
Nas indústrias de outros equipamentos de transporte, 20,6% reduziram em mais de 15% o contingente de trabalhadores.
Tobler ressaltou que as expectativas para 2021 são incertas. O fim do auxílio emergencial, interrompido em dezembro, deixará a população com menos poder de compra ao mesmo tempo que o mercado de trabalho, especialmente o informal, não dá sinais de retornar aos níveis pré-pandemia tão cedo.
Além disso, há dúvidas sobre quando a vacinação contra a Covid será efetuada, limitando as previsões sobre a volta da circulação normal de pessoas.
“No setor de serviços, a situação é mais crítica. O ano de 2020 foi bem ruim, com pouquíssimas empresas aumentando contratação e muitas fazendo demissão”, disse o pesquisador.
Na indústria, avalia Tobler, a crise pode estar sendo “parcelada”. Houve demanda aquecida no fim do ano passado, mas uma nova crise pode ocorrer ao longo de 2021.
De acordo com dados da Anfavea (Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores), as vendas de veículos no Brasil subiram no fim do ano, mas não o suficiente para evitar que 2020 terminasse com queda de 26,2% sobre o ano anterior. Isso levou as vendas ao patamar de 2016, quando houve a crise econômica anterior no Brasil.
A produção diminuiu em 31,6%, e as receitas com exportações (US$ 7,4 bilhões) foram menos da metade do que em 2017 (US$ 15,9 bilhões).
Para este ano, a Anfavea prevê aumento de 15% no licenciamento de veículos, 9% nas exportações e 25% na produção. Essas projeções são insuficientes para a retomada ao nível pré-pandemia.
“Nunca foi tão difícil projetar os resultados de um ano, pois temos uma neblina à nossa frente desde março, quando começou a pandemia”, disse o presidente da entidade, Luiz Carlos Moraes.
Nos transportes coletivos, milhares de empregos foram perdidos Brasil afora. Armando Guerra Júnior, presidente da Fetranspor (Federação das Empresas de Transportes de Passageiros do Estado do Rio de Janeiro), disse que todas as 118 empresas do estado no setor esperam novas demissões neste ano.
“Em 2021, 100% das empresas vão demitir. A discussão é se demitem 40% ou 30% [do total de trabalhadores]. Vai ser muita coisa. Estamos trabalhando com 62% do número de passageiros de antes da pandemia, mas tem empresa trabalhando a 73% e empresa a 46%”, analisou Guerra Júnior.
No Rio, o setor estima que a pandemia tenha afetado ou vá afetar o trabalho de 40 mil pessoas, entre os que já foram e os que serão demitidos após o período de estabilidade proporcionado pelas medidas de preservação do emprego propostas pelo governo federal.
E não foi só nos transportes que os empregos foram dizimados. Segundo o estudo da FGV, a indústria de informática e eletrônicos teve perdas em 59% das empresas, fruto das mudanças nas taxas de câmbio em 2020.
Mais 32,3% ainda preveem cortes neste ano, o maior patamar apresentado na pesquisa.
“Esse segmento tem produtos dolarizados, peças importadas, o que impacta o preço. Em 2021, existe a incerteza principalmente em relação à renda, com as pessoas se contendo mais para gastar. Uma expectativa de vacina ainda pode trazer o setor mais ao normal, sem uma demanda tão aquecida”, disse Tobler.
Já 51% das empresas de serviços ligados às famílias tiveram perdas de empregos, sendo os maiores índices nos segmentos de alimentação (54,3%) e alojamento (50,6%), fruto do distanciamento social que fechou bares, restaurantes e hotéis em todo o país, como forma de conter o avanço da Covid-19.
Tobler apontou que a pesquisa mostra um impacto muito grande no mercado de trabalho e liga o sinal de alerta para 2021.
Segundo ele, uma vacinação em grande escala pode melhorar o processo, mas o estudo sugere cautela, pois uma piora nos casos de Covid-19 pode ter como consequência um repique na recuperação do emprego.
No varejo de tecidos, vestuários e calçados, 40,7% das empresas demitiram trabalhadores e mais 11,9% preveem novas demissões em 2021. Por outro lado, a indústria têxtil foi a que mais contratou, com 61,6% das companhias admitindo terem aumentado o contingente.
O setor de construção também viu alguns segmentos contratarem. Nas obras de acabamento, 38,1% aumentaram o pessoal ocupado. Já em outros serviços para construção, 30,1% também contrataram. Em serviços especializados, 23,3% relataram números positivos.
Fonte: Folha SP