Sem alarde, nem cerimônia com políticos ou propaganda, as obras no local onde será construída a primeira fábrica de placas de silício para a montagem de semicondutores no país já começaram. Caminhões e escavadeiras trabalham no terreno em Ribeirão das Neves, município da região metropolitana de Belo Horizonte. O projeto de US$ 500 milhões vem sendo tratado com máxima discrição pelos principais acionistas, o grupo EBX, de Eike Batista, e o BNDES. Nenhum dos dois quer falar, mas cada um poderá ter cerca de 30% do investimento.
No governo de Minas, que tem uma participação menor no negócio, a regra também é o silêncio. A alegação é um suposto pedido de Brasília para deixar que a presidente Dilma Rousseff dê detalhes do empreendimento, dos investimentos e dos sócios.
Em março, quando o governador Antonio Anastasia (PSDB) anunciou que Ribeirão das Neves havia sido escolhida para receber a fábrica, ele disse que a área do terreno tinha 160 mil metros quadrados e geraria 288 empregos diretos. "Será a primeira fábrica brasileira com condições de se inserir em um mercado mundial competitivo. É muito significativa para o Estado a implantação dessa fábrica com US$ 500 milhões de investimentos", disse ele, segundo nota veiculada pelo governo.
Na época, o governo mineiro afirmou também que o anúncio oficial seria feito em Brasília, no início de abril, em cerimônia com a participação da presidente. Até hoje isso não ocorreu.
O projeto começou sendo tratado pelo nome de Companhia Brasileira de Semicondutores (CBS). Agora, no entanto, passou a se chamar SIX, segundo disse recentemente Anastasia a um interlocutor em Belo Horizonte.
O nome é o mesmo da empresa de tecnologia criada pelo Grupo EBX, em outubro do ano passado. A SIX Soluções Inteligentes surgiu com a aquisição de 70% do capital da AC Engenharia, empresa carioca especializada na área de automação industrial. Os 30% restantes ficaram com seu fundador, Alexandre Caldas.
Em abril, a EBX anunciou que a IBM havia comprado uma participação de 20% na SIX. Em comunicado à imprensa, a EBX informou que a IBM contribuiria "com soluções inteligentes de indústria, provendo novos produtos, softwares e serviços que complementam a expertise da SIX Automação para os setores de petróleo e gás, mineração, construção naval, portos e outros a serem definidos". O negócio fez parte de um acordo que envolveu também a terceirização da área de tecnologia da informação da EBX, um projeto de US$ 1 bilhão em dez anos.
A participação de Minas no negócio se dá por meio do Banco de Desenvolvimento de Minas Gerais (BDMG). O banco tampouco se pronunciou oficialmente sobre o andamento do projeto. Mas uma fonte do Valor na instituição disse que o BDMG já alocou cerca de 50% dos US$ 26 milhões previstos. Esse é total que caberia ao banco numa previsão inicial dos investimentos necessários. Segundo a fonte, nesse primeiro momento, os recursos estão sendo usados para construção do edifício onde funcionará a fábrica.
Outro acionista minoritário é o ex-presidente da Volkswagen no Brasil, Wolfgang Sauer.
Em Ribeirão das Neves, a SIX é ainda um nome desconhecido; as obras de terraplanagem não estão ao alcance da vista facilmente. Para chegar ao terreno, é preciso entrar em uma estradinha de terra que sai de uma estrada a poucos minutos do centro. Sem placa ou qualquer indicação, é esse o caminho que leva ao terreno onde operários trabalham com máquinas e caminhões para abrir espaço para a futura fábrica.
A prefeitura, que destacou dois funcionários para acompanhar a reportagem até o local, disse que pouco sabe sobre o empreendimento e que ainda não há sinal de contratação mais intensa de mão de obra para a construção.
Há outros projetos em andamento no Brasil na área de semicondutores, dois deles voltados inicialmente para a fabricação de chip de memória para computadores. O mais adiantado é o da gaúcha HT Micron, criada em parceria pelo grupo local Participações em Inovação e Tecnologia (Parat) com a sul-coreana Hana Micron, cada qual com fatia de 50%.
A HT Micron, que produziu chips para cartões de crédito e para celular com tecnologia GSM, a título de testes, no fim do ano passado, pretende começar a fabricar em escala comercial a partir de novembro. Foi planejado um lote inicial com 3 milhões de chips para computadores. O projeto está orçado em R$ 200 milhões e a fábrica funcionará inicialmente em instalações da Universidade do Vale dos Sinos, em São Leopoldo (RS). A fábrica definitiva ficará no Parque Tecnológico da mesma instituição.
Também ligado a uma universidade poderá ser o projeto da portuguesa Nanium, nascida em 2010 quando capitais privados e estatais de Portugal assumiram o controle da Quimonda, antiga fábrica de capital alemão em território português. Há muito tempo negociando a instalação de uma fábrica no Brasil, a Nanium assinou, no fim de agosto, compromissos com o governo de Minas, a prefeitura de Juiz de Fora e a Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). O objetivo é investir em uma instalação na cidade da Zona da Mata mineira, dentro do Parque Tecnológico da UFJF. Estão previstos recursos de US$ 30 milhões (cerca de R$ 60 milhões).
A Nanium pretende encapsular 1 milhão de chips de memória para computadores por semana no país, mas o projeto ainda depende de duas etapas fundamentais: encontrar um parceiro local, preferencialmente uma empresa de telecomunicações ou fabricante de PCs, que divida o investimento e a gestão da unidade. Em outra fase, será preciso definir um fornecedor internacional de "wafers", os moldes de silício usados para encapsular os chips. A Nanium estima que após solucionar as pendências, vai precisar de um prazo de seis a nove meses para começar a produzir.
Fonte: Valor Econômico / Marcos de Moura e Souza e Chico Santos
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