SÃO PAULO - Os sucessivos aumentos do minério de ferro já começam a mostrar seus efeitos na cadeia do aço. Grandes siderúrgicas nacionais já renegociam o preço do produto junto aos clientes, pressionadas pelo aumento de um de seus principais insumos. Ontem foi a vez da Gerdau, que há um ano e meio não reajustava sua tabela de preços, de anunciar uma revisão de valores, menos de um mês depois de o presidente da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), Benjamin Steinbruch, admitir que a empresa aplicaria uma alta de até 7,5% até o mês de junho.
Mesmo contando com uma possível mudança do perfil do mercado, as siderúrgicas devem manter no Brasil os investimentos, calculados em cerca de R$ 70 bilhões até 2016, e voltados principalmente ao aumento de sua capacidade instalada.
Jorge Gerdau Johannpeter, presidente do conselho de administração do Grupo Gerdau, comentou, em entrevista exclusiva ao DCI, que o reajuste do aço não será feito de uma vez. “A tendência é de que haja repasse, mas não imediatamente; ainda temos de calcular os gastos e dialogar com os clientes.”
Ontem, durante a divulgação dos resultados trimestrais da empresa, André Gerdau Johannpeter, seu presidente, confirmou a tendência de ajustes no preço do aço, o que, segundo o executivo, deve acontecer não só no Brasil, mas em outros países onde a empresa atua, variando conforme as região e o mercado.
Na ponta da cadeia, a Associação Nacional dos Fabricantes dos Veículos Automotores (Anfavea) afirmou que as montadoras de veículos estão conversando sobre os preços do aço diretamente com as siderúrgicas, confirmando as negociações.
O presidente da Gerdau, que no primeiro trimestre viu lucro R$ 573 milhões, montante 16 vezes maior do que o registrado em 2009, reiterou que o pacote de investimentos de R$ 9,5 bilhões, previstos pela companhia até 2014, está mantido. São destaques a ampliação de capacidade no Brasil, na área de aços espaciais e rolos, e o aumento da produção de aços especiais nos Estados Unidos.
“No Estado de Minas Gerais apenas, vamos destinar R$ 352 milhões para aumentar nossa autonomia de produção de minério de ferro”, afirmou o presidente da Gerdau. Ele explicou que os aportes permitirão aumentar a autossuficiência de minério de sua coligada, a Açominas, de 60% para 100%, até 2012.
A ação reforça a tendência de algumas siderúrgicas de buscar maior autonomia no abastecimento de minério para se descolar das variações de preço, como já acontece com a Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais (Usiminas), que anunciou recentemente investimentos de R$ 7 bilhões até 2011, plano que inclui a criação de uma companhia de mineração a partir de algumas minas que o grupo adquiriu.
Demanda
Sobre a recuperação da demanda, os executivos da Gerdau colocaram que está programada, no Peru, a retomada das atividades de um alto-forno (equipamento produtor de aço) no mês julho. Em relação ao mercado europeu, a companhia sinaliza cautela, ao operar a níveis próximos de 50% de capacidade. “Se formos remodelar essa operação, acredito que 60% seja uma margem confortável”, afirmou Osvaldo Schirmer, vice-presidente executivo de Finanças da Gerdau.
Quanto ao mercado norte-americano, a perspectiva da Gerdau é de que ele retome fôlego lentamente. Apesar do pacote de estímulos anunciado recentemente pelo presidente Barak Obama, que deve impulsionar o setor de construção civil, entre outros, e consequentemente, o consumo de aço, a retomada será gradual. “Começamos a ver alguns sinais, mas de forma lenta e gradual, pois o que existe ainda é projeto. Nossa expectativa era de que fossem um pouco mais rápidos do que está acontecendo”, disse o presidente da Gerdau.
PAC e Copa
Se se levarem em consideração os negócios no mercado brasileiro, a visão é de que a comercialização do aço cresça com a ascensão do consumo em setores como automotivo, mas o impacto das obras de infraestrutura ligadas ao Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) e à realização da Copa do Mundo de Futebol e das Olimpíadas por aqui deve começar a impulsionar o setor somente a partir do final do segundo semestre deste ano.
“Como boa parte das obras está em projeto, veremos o aquecimento destas demandas a partir do final deste ano”, projetou o responsável pelas finanças da Gerdau, ao calcular que o pico de demanda deve chegar em grande volume em 2012 e 2013, incluindo as oportunidades que vão surgir com o avanço do pré-sal.
Ele acrescentou ainda que os efeitos positivos do programa “Minha Casa, Minha Vida” (de construção de moradias populares), ainda não começaram.
Outra empresa que apresentará seus resultados financeiros hoje é a Companhia Siderúrgica Nacional (CSN), cuja alta de preços foi confirmada mês passado. De acordo com prévias divulgadas pelos analistas da corretora do grupo Itaú, os volumes de produção da empresa, devem atingir a casa de 1,3 milhões de toneladas, com mais de 80% da produção voltada ao mercado interno.
Também foi sinalizada uma possível subida das receitas na casa dos 10%, além de um esperado recuo nos lucros. Entre os investimentos anunciados pela companhia este ano, estão US$ 600 milhões em três novas fábricas de cimento no Brasil.
Investimentos
Um dos mais antigos executivos do setor de aço Brasil, Jorge Gerdau, acredita na capacidade do empresário brasileiro de enfrentar os mais diferentes cenários da economia. Segundo ele, os investimentos crescem no País e suplantam uma capacidade instalada possivelmente insuficiente da indústria. “As empresas investem rapidamente e o empresário sempre encontra forças e capacidade dentro da sua própria equipe”, disse ele. Gerdau acrescentou que o Brasil investe 1,2% do seu Produto Interno Bruto (PIB), e a carga tributária chega a 40% do PIB. “É preciso gerir melhor os gastos públicos para ter dinheiro para investir”, completou.
Em relação a parcerias público-privadas, apontada por muitos como opção para crescer e realizar obras no País, Gerdau disse que existe uma “confusão jurídica e muita ideologia em parcerias com o governo”, sendo que só em alguns setores como no energético elas já funcionam melhor.
O executivo comentou que o Brasil tem condições em enfrentar os futuros gargalos de infraestrutura com um forte ritmo de crescimento. A entrevista foi realizada em Comandatuba (BA), no final do mês de abril.
Fonte: DCI/Fabíola Binas/ Danielle Fonseca
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