Os baixos preços do milho entre o fim do ano passado e o início de 2014, época em que os agricultores se preparavam para plantar a segunda safra, fizeram com que pelo menos 200 mil hectares que seriam originalmente destinados ao cereal fossem semeados com soja em Mato Grosso e no Paraná. A área é pouco representativa diante dos 13,5 milhões de hectares cultivados com soja na primeira safra desses dois Estados, os maiores produtores de grãos do país. Mas crescem as preocupações em relação aos efeitos dessa opção em detrimento do milho, tradicional cultura da chamada safrinha.
A consultoria Agroconsult estima que o plantio de soja safrinha em Mato Grosso tenha alcançado cerca de 120 mil hectares este ano, aquém dos 500 mil hectares que chegaram a ser cogitados pelo mercado. "Ainda acho bastante, mas a maior parte [das lavouras] é um desastre do ponto de vista de produção e custo", diz André Pessôa, sócio-diretor da consultoria.
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Conforme Pessôa, umas das preocupações é o maior uso de defensivos, em especial de fungicidas, por conta dos problemas com a ferrugem da soja. No ciclo de verão, costumam ser feitas três aplicações do produto, número que passou a seis na safrinha. "Fazer nove aplicações em um intervalo de seis meses é também submeter o fungo a uma pressão de seleção gigantesca", afirma.
Para o consultor, o aumento da incidência de ferrugem está diretamente relacionado à menor eficiência dos defensivos, o que tem elevado a resistência do fungo. "Por causa da soja safrinha, poderemos ter um ataque de ferrugem tão ou mais sério que em 2003/04, quando a doença chegou ao Brasil. Estamos 'contratando' um problema parecido para daqui a dois ou três anos", prevê.
A Bom Jesus Agro, de Rondonópolis (MT), decidiu testar o plantio de soja safrinha em 2 mil hectares. Mas Nelson Vigolo, presidente da empresa, diz que a opção não tem se mostrado muito interessante. Ele acredita que o custo de produção ficará entre 40 e 45 sacas, semelhante ao da safra de verão, mas a produtividade tende a cair de 55 para até 30 sacas, nessa comparação. "Acho que valeria a pena apostar na soja nesse período se houvesse algum valor agregado adicional, plantando para fazer semente, por exemplo", avalia.
Segundo Nery Ribas, gerente técnico da Aprosoja/MT, associação que representa os produtores do Estado, muitos abandonaram as lavouras, e outros tiraram a soja para plantar milho. "Tinha muita mosca branca na soja", diz.
No Paraná, por outro lado, há relatos apenas de casos pontuais de problemas nas lavouras de soja safrinha, de acordo com o Departamento de Economia Rural (Deral), ligado à Secretaria da Agricultura e do Abastecimento do Estado.
A semeadura da oleaginosa na segunda safra superou as expectativas: a área cresceu 38% no Estado, a 111,86 mil hectares. A previsão é de uma produção de 211,13 mil toneladas, 62% acima do ano passado. A produtividade está estimada em 31,5 sacas por hectare.
Apesar da recente reação nos preços do milho, a paridade continua favorável à soja. No início do plantio, a saca do milho no Paraná estava entre R$ 17 e R$ 18, e a da soja, em R$ 65. Hoje, o milho está entre R$ 22 e R$ 23, e a soja, varia de R$ 62 a R$ 63. "Mas não acredito que as apostas na soja safrinha vão se manter. Viemos de três safras de soja com preços muito bons, mas sabemos que uma hora esse ciclo muda", diz Marcelo Garrido, economista do Deral.
Fonte: Valor Econômico/Mariana Caetano | De São Paulo