A confirmação pela Agência Nacional do Petróleo (ANP) da existência de um reservatório gigante de petróleo na área de Libra, que está no pré-sal da bacia de Santos, ainda da União, reacende as discussões sobre o modelo de partilha de produção no Brasil. O projeto de lei que institui a partilha deverá voltar a ser discutido depois das eleições, gerando tensões principalmente em torno da emenda do senador Pedro Simon (PMDB-RS). Ela acata a emenda Ibsen Pinheiro (PMDB-RS) sobre a divisão dos royalties para todos os Estados e municípios do Brasil e não apenas para os produtores de petróleo e gás, indo adiante ao prever que caberá à União ressarcir as perdas dos Estados.
A perfuração em Libra, ainda em curso, já custou US$ 50 milhões. A área pode ser a primeira a ser oferecida no novo modelo, exclusivo para o pré-sal, que prevê a cessão de direitos de exploração e produção para a empresa, ou consórcio, que oferecer para a União a maior parcela do óleo produzido, descontados custos. O modelo também prevê que a Petrobras será a única empresa operadora dessas áreas, com participação mínima obrigatória de 30% de todas as áreas oferecidas para partilha.
Por se tratar da área com maior volume de informações, Libra pode estrear a partilha, o que deve acontecer no ano que vem ou em 2012. Haroldo Lima, diretor-geral da ANP, acha difícil que o projeto de lei seja votado ainda nesta legislatura. Ele aposta que vai ficar para o novo Congresso, que só toma posse em fevereiro. "Isso é o que minha experiência de 20 anos no Congresso me faz acreditar", disse ele ao Valor.
"Enfrentamos as vicissitudes da mudança da composição do Congresso e isso cria uma situação que pode levar a uma demora maior. Congresso em fim de legislatura tem um grupo que foi reeleito e outro que não foi reeleito. Isso cria uma composição que já não está mais no pique de trabalhar intensamente, sobretudo em assuntos complexos e polêmicos. E os novos deputados já estão aí, à porta. Eles vão querer para eles esse assunto. E não vão aceitar votar o que foi discutido pela turma que não foi reeleita", diz Lima, ligado ao PCdoB.
Polêmica não vai faltar na discussão do assunto. Libra é o segundo reservatório em área da União perfurado pela ANP com recursos da Petrobras. O primeiro foi Franco, que foi cedido para a estatal no processo de cessão onerosa, parte do processo de capitalização da estatal. Os dois foram perfurados em locais definidos pela agência reguladora e financiados pela Petrobras.
Existem ainda duas áreas da União com reservatórios mapeados e não perfurados: Pau Brasil e Peroba (que foi oferecido para a Petrobras como reserva, caso as demais áreas da cessão onerosa não tenham os 5 bilhões de barris previstos). O dinheiro para perfurar os próximos poços deve vir do orçamento da agência. Magda Chambriard, diretora da ANP responsável pela área de exploração e produção, disse ao Valor que a intenção é incluir os próximos poços no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Dessa forma, o investimento entra no planejamento do governo, facilitando também as negociações entre ANP e outros órgãos como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e a Receita Federal, por exemplo.
"Quero incluir os poços no PAC e concorrer melhor por recursos da União. Mas será preciso mostrar que pagar esses poços é melhor do que construir um hospital, por exemplo, já que os recursos são escassos", diz a diretora. Por outro lado, ela defende o projeto, lembrando que quanto maior o conhecimento da ANP sobre o pré-sal da União, mais valiosas as áreas se tornarão. "Sem conhecermos as bacias sedimentares, não podemos identificar sistemas petrolíferos. E perfurar poços dá um salto no valor das áreas", afirmou a diretora.
Magda explica que o Plano Plurianual de Geologia e Geofísica (PPA) da ANP prevê investimentos para aumentar o conhecimento geológico. "É uma verba atribuída à agência para investir onde o setor privado não investe", explica a diretora. O PPA 2007-2011 prevê investimento de R$ 1 bilhão em cinco anos (média de R$ 200 milhões por ano) e a ANP discute com o Ministério de Minas e Energia a ampliação do PPA, já que o custos no pré-sal são muito elevados.
Os US$ 50 milhões gastos até agora em Libra representam menos de um terço do que foi gasto com o poço de Franco, que custou US$ 180 milhões. Como os próximos não deverão ser financiados pela Petrobras, a ANP terá que adquirir dados sísmicos junto a empresas de aquisição de dados (EADs).
Sobre a divulgação da descoberta de petróleo em Libra na sexta-feira, último dia útil antes da eleição, Magda explicou que a ANP exige de todas as concessionárias a notificação da descoberta em 72 horas, e ela mesma não poderia deixar de informar isso, ainda mais considerando que o feriado do dia do funcionalismo público foi transferido de 28 de outubro para hoje, e amanhã é dia de Finados, feriado nacional.
Ela explicou, ainda, que decidiu, no primeiro momento, divulgar apenas a estimativa de reservas da empresa de consultoria Gaffney, Cline & Associates, que previu a existência de volumes recuperáveis de petróleo entre 3,7 e 15 bilhões de barris. A estimativa moderada é que existam ali 7,9 bilhões de barris recuperáveis e a previsão da ANP será divulgada mais adiante. Se confirmado o maior volume - e a perfuração ainda não atingiu o fim do reservatório, o que está previsto para quando alcançar 6,5 mil metros de profundidade - Libra poderá ser a maior área encontrada até agora no Brasil. Maior inclusive do que Tupi, da Petrobras, BG e Galp, onde as estimativas até agora são de 5 bilhões a 8 bilhões de barris, e Franco, onde as reservas prováveis foram estimadas em 5,45 bilhões de barris pela Gaffney, Cline.
Fonte: Valor Econômico/Cláudia Schüffner | Do Rio
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