Em meio aos desdobramentos da Operação Lava-Jato sobre a Petrobras e seus fornecedores, o governo federal se prepara para realizar nos próximos meses o primeiro leilão de um gasoduto sob regime de concessão do país. Apesar do clima de incerteza, o Valor apurou que mais de dez empresas procuraram a Agência Nacional de Petróleo (ANP) ao longo dos últimos meses, interessadas em participar da licitação.
Companhias como as espanholas Abengoa e Gas Natural Fenosa, as brasileiras Cosan e JMalucelli e empreiteiras de menor porte como as paranaenses Pattac e Construtora Elevação são algumas das empresas que têm monitorado de perto as primeiras fases da licitação do projeto Itaboraí-Guapimirim, gasoduto de 11 km, no Rio.
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Algumas empreiteiras envolvidas nas investigações da Polícia Federal, como a Galvão Engenharia e GDK, também chegaram a participar da fase de consulta pública do pré-edital do leilão.
A percepção no setor é que devido ao pequeno porte do gasoduto ofertado, a licitação consiga atrair substitutos para as empreiteiras citadas nas investigações da Polícia Federal. "A Operação Lava-Jato pode criar uma inibição natural em determinadas empresas, mas afeta apenas uma pequena parcela de potenciais participantes", diz a superintendente de promoção de licitações da ANP, Claudia Rabello. "Certamente mais de dez empresas nos procuraram ao longo desse processo."
O diretor-técnico da consultoria Gas Energy, Ricardo Pinto, afirma que o gasoduto, por ser um projeto de pequena complexidade e baixo volume de capital, abre espaço para empresas menores. Quem arrematar a concessão do gasoduto Itaboraí-Guapimirim terá de investir R$ 112,32 milhões, segundo o investimento estimado pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE). A receita anual máxima do empreendimento, por sua vez, foi fixada pela ANP em R$ 20,579 milhões.
O consultor, contudo, não acredita que o interesse na concorrência se limite a pequenas construtoras. "Para uma grande empreiteira não é um projeto grande, mas essas empresas podem entender que participar da primeira licitação de gasodutos do país é um aprendizado. É um projeto de baixo risco e pode servir de laboratório para futuras licitações", diz Pinto.
Outra empresa que também tem interesse na licitação é a Transpetro, que opera os dutos da Petrobras. A subsidiária da estatal espera se valer de sua expertise e fechar com a vencedora da licitação um contrato para operação remota do gasoduto Itaboraí-Guapimirim, a partir de seu Centro Nacional de Controle Operacional, no Rio. A empresa já possui contratos para operação de dutos de terceiros.
O projeto Itaboraí-Guapimirim visa escoar o gás das futuras unidades de processamento de gás natural (UPGNs) do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj) até o gasoduto Gasduc 3, que conecta o polo de produção de Cabiúnas, em Macaé, até a refinaria Reduc, em Duque de Caxias. A redução dos investimentos e a revisão do plano de negócios da Petrobras, contudo, geram incertezas sobre o aproveitamento do gasoduto.
O temor é que o projeto, previsto para entrar em operação 13 meses após a assinatura do contrato de concessão, ainda em 2016, fique pronto antes das unidades de processamento do Comperj. O risco desse descasamento dos cronogramas, contudo, é da Petrobras, que contratou o serviço de transporte e, se não concluir a tempo as obras das UPGNs, terá de arcar com o pagamento do serviço sem poder comercializar o gás.
Há, ainda, dúvidas de quando o gasoduto passará a transportar sua capacidade máxima, de 17 milhões de metros cúbicos por dia, diante da expectativa de que a Petrobras reveja sua curva de produção. Segundo uma fonte do mercado de distribuição, a expectativa é que a Petrobras utilize o gás transportado pelo Itaboraí-Guapimirim para deslocar o consumo de GNL importado nas termelétricas.
Apesar do cenário pouco otimista para o setor de óleo e gás, a licitação do gasoduto Itaboraí-Guapimirim marca não só a estreia do regime de concessão no transporte de gás, como também inicia o processo de desverticalização da indústria brasileira de gás natural.
Dona de praticamente todos os gasodutos do país, a Petrobras decidiu participar do projeto como carregadora (que contrata a capacidade de um duto). A estatal contratou, sozinha, toda a capacidade do Itaboraí-Guapimirim, o que a impede de participar na construção e operação do gasoduto, segundo a regulamentação vigente.
Fonte: Valor Econômico/Por André Ramalho | Do Rio