Compras externas representam atualmente 65% das necessidades de insumos, gerando um déficit comercial de US$ 2,5 bilhões
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva quer que a Petrobras e a Vale se unam para atuar na área de fertilizantes e reduzam, com isso, a vulnerabilidade externa do País no abastecimento desses produtos. "Vamos chamar a Vale e a Petrobras, porque a nossa agricultura não pode ficar dependente de duas ou três empresas externas", afirmou Lula.
A preocupação do governo é com a dependência brasileira de insumos importados que são matéria-prima para a formulação de fertilizantes. Atualmente, as importações chegam a representar 65% das necessidades totais do País, respondendo por um déficit de US$ 2,5 bilhões na balança comercial. O caso mais grave é o potássio, que tem 91% da demanda atendida por importações. Na avaliação do governo, o Brasil fica sujeito à vontade dos países fornecedores de vender minerais e sofre também com a volatilidade de preço. O fator agravante, na avaliação oficial, é que o País possui jazidas, mas elas não são adequadamente exploradas.
Análises preliminares de técnicos da área indicam que a mina de potássio da Petrobras em Nova Olinda, no Amazonas, é a terceira maior do mundo, atrás apenas de jazidas localizadas na Rússia e no Canadá. A estimativa é de que essa mina necessite de investimentos em torno de US$ 2 bilhões. Isso sem contar com os custos ambientais. O Ministério de Minas e Energia (MME) também considera que outra mina de potássio - localizada em Sergipe, cujo direito de exploração foi concedido à Petrobras, que depois o arrendou à Vale - é o "filé mignon" da área.
A pressão do governo sobre a Vale nesta questão não é de hoje. O ex-ministro da Agricultura Reinhold Stephanes já criticou a mineradora pelo fato de a companhia não explorar todo o potencial da mina de potássio existente em Sergipe. "Isso foi entregue pela Petrobras a então estatal Vale do Rio Doce e, com a privatização, a empresa levou a jazida com ela, mas a Vale manteve apenas a produção em uma das faixas e não vai explorar as outras. Temos que ver como vamos agir em relação ao restante", disse Stephanes. As equipes de Stephanes e a do ex-ministro de Minas e Energia Edison Lobão elaboraram um anteprojeto de lei com propostas de reformulação do setor, que já foi enviado à Casa Civil para avaliação. O anteprojeto cria regras mais rígidas para as empresas que detêm o direito de explorar as minas, com o objetivo de evitar que elas atrasem a produção.
Apesar de estar na órbita das propostas de reforma do novo Código Mineral, o anteprojeto sobre fertilizantes foi elaborado em separado, porque o governo avalia que há urgência de resolver os problemas nessa área. No entanto, se o projeto não for enviado ao Congresso ainda neste primeiro semestre, dificilmente o assunto será definido neste ano por conta das eleições. Daí a preocupação do presidente com uma possível associação entre a Vale e a Petrobras.
A parceria sugerida por Lula refere-se aos segmentos de fosfato e potássio. Fora isso, a estatal já vem desenvolvendo quatro projetos de novas fábricas de fertilizantes na área de nitrogenados, que constam da segunda fase do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2). O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, já afirmou que esse trabalho a estatal fará sozinha. Dos quatro projetos, uma unidade é de sulfato de amônia, em Sergipe; outra de ureia em Três Lagoas (MS); uma terceira, de amônia, em Uberaba (MG); e um complexo químico de ureia e amônia no Espírito Santo. O PAC prevê investimentos de R$ 11,2 bilhões no setor como um todo, dos quais R$ 9,1 bilhões serão aplicados de 2011 a 2014 e R$ 2,1 bilhões após esse ano.
Criação de estatal para o setor provoca polêmica
Entre as propostas para o segmento de fertilizantes estudadas pelo governo está a de criar uma estatal para gerenciar o setor - mas não para produzir diretamente. A intenção foi confirmada pelo presidente Lula. "O Estado não vai se meter, mas vai conduzir oxigênio para que a nossa agricultura possa se desenvolver", garantiu.
A possibilidade de usar uma empresa estatal para coordenar o setor de produção de fertilizantes no Brasil faz parte de esforço do governo para buscar a autossuficiência do insumo. No entanto, o plano governamental já rendeu críticas de entidades e empresários, que veem com desconfiança a necessidade de criação de uma companhia controlada pelo Estado.
A senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), considera indispensável o Brasil ter autossuficiência na produção de fertilizantes, mas não acredita que a criação de uma nova estatal seja a melhor solução para resolver o problema. Para a senadora, a livre iniciativa é marco do desenvolvimento global e deve ser respeitada. "Havendo um marco regulatório firme e um sistema de regulação eficiente e autônomo para cuidar do setor, não precisamos criar mais uma empresa pública. Uma nova estatal aumentará, sem dúvida, os gastos do governo, mas não representa garantia de eficiência", disse.
Essa opinião também é compartilhada por empresários. "Uma estatal para o setor não vai contribuir em nada, apenas criará cabides de empregos", afirma Aquiles Pio Franceschetti, sócio-proprietário da Ourofértil Fertilizantes. Ele lembra que o País já possuiu uma empresa estatal para o setor, a Petrofértil, que foi extinta durante o governo Collor. "Tínhamos que pagar sobretaxas de até 70% para manter uma companhia incompetente", destacou.
Segundo Franceschetti, o fato de o Brasil não ser autossuficiente em matérias-primas não chega a prejudicar as empresas estabelecidas no País. O empresário destaca que existem dificuldades logísticas para o Brasil expandir sua produção de matérias-primas para fertilizantes. "Enquanto nossas reservas de cloreto de potássio, por exemplo, estão a mais de 800 metros de profundidade, o que demanda muito investimento para ser exploradas, Israel obtém o mesmo produto extraindo ao nível do chão no Mar Morto", salientou.
Outros especialistas, entretanto, acreditam que o incentivo à produção nacional pode contribuir para o preço interno dos insumos em certas regiões, devido à melhor logística de distribuição. "Atualmente, para atender aos produtores do Centro-Oeste, o fertilizante precisa chegar aos portos do Centro-Sul e enfrentar longas distâncias até seu destino final, para então produzir grãos que novamente têm que ser enviados ao litoral, o que encarece o produto", destaca Rafael Ribeiro de Lima Filho, analista da Scott Consultoria.
Para Torvaldo Antonio Marzolla Filho, presidente do Sindicato da Indústria de Adubos do Rio Grande do Sul (Siargs), a expectativa é de que a nova empresa, se for criada, deverá ajudar na verificação de novas minas e supervisionar o fornecimento de matérias-primas, sejam elas produzidas nacionalmente ou no exterior. "Confio no bom-senso do governo e imagino que tudo o que está sendo planejado seja para o crescimento da indústria e do agronegócio nacional", afirma.
Fonte: Jornal do Commer4cio (RS)
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