É muito tardia - pois surge só no apagar das luzes do governo Lula, quando o uso do tom eminentemente político na discussão do tema não tem mais a utilidade que teve ao longo da campanha eleitoral - a advertência do presidente da Petrobrás, José Sérgio Gabrielli, de que a exploração do petróleo da camada de pré-sal exige cautela. Mas ela é pertinente. Toda a cadeia produtiva do setor petrolífero trabalha no limite da sua capacidade e, se o governo decidir acelerar os projetos do pré-sal, a indústria nacional não terá condições de atender à demanda adicional, o que exigirá importações em grandes volumes e valores, intensificando o risco de desindustrialização do País, disse ele ao jornal Valor.
A advertência de Gabrielli é a primeira demonstração clara de que, passada a obsessão eleitoral que contaminou a administração petista, a diretoria da Petrobrás começa a recolocar os pés no chão.
Tendo o Congresso aprovado os projetos que definem o marco regulatório para a exploração do pré-sal, que institui o regime de partilha da produção em substituição ao regime de concessão e cria o fundo social - há dúvidas sobre a repartição dos royalties, pois a fórmula aprovada pelos parlamentares deve ser vetada pelo presidente da República -, e livre da pressão eleitoral, Gabrielli deixou claro que há uma tensão para a definição da velocidade dessa exploração.
De um lado, são fortes as pressões para acelerar a exploração, pois, quanto mais cedo começar a produção, mais cedo se constituirá o fundo social. De outro lado, há o fato de a indústria nacional petrolífera operar no limite. "É preciso modular o crescimento" da produção, disse Gabrielli, porque, se for muito rápido, "chegaremos a uma situação em que a indústria nacional não conseguirá atender às necessidades". Daí, "teremos um problema de desindustrialização e de incapacidade para a indústria brasileira competir".
A Petrobrás planeja investir US$ 224 bilhões em quatro anos, "o maior programa de investimentos do mundo", segundo seu presidente, que vê, entre os possíveis obstáculos à execução desse programa, a incapacidade do sistema produtivo de entregar no prazo o equipamento de que a empresa necessita.
A Petrobrás já identificou áreas problemáticas, como a de sondas, que o Brasil não fabrica. Uma sonda leva de três a quatro meses para perfurar um poço sob uma lâmina de água de mais de 2 mil metros e uma plataforma de produção opera com 15 a 20 poços. Há carências também na produção de sistemas submersos, isto é, as tubulações que ligam o fundo do mar à superfície. A capacidade mundial de produção está esgotada, mas, segundo Gabrielli, há empresas inglesas e francesas interessadas em se instalar no Brasil, para atender a Petrobrás. Há, ainda, a necessidade de compra de uma grande quantidade de outros equipamentos, como compressores.
Isso sem falar das encomendas à indústria naval. Cada plataforma de produção precisa, em média, de cinco embarcações de apoio e a Petrobrás prevê que haverá cerca de 40 plataformas na área do pré-sal. "Estamos falando, portanto, de 200 barcos de apoio de todo tipo", exemplificou. Serão necessários também petroleiros para transportar o petróleo, cuja produção esperada pela empresa é de 4 milhões de barris diários.
Toda a demanda decorrente dos investimentos programados pela Petrobrás, que inclui 3,2 mil componentes, vem sendo atualizada trimestralmente para orientar os fornecedores, e prevê as encomendas até 2014. Do ponto de vista financeiro, dos US$ 262 bilhões necessários até 2014 para os investimentos e para o pagamento das dívidas que vencerem no período, a empresa ainda precisa definir como vai captar US$ 31 bilhões (cálculo baseado no preço do barril do petróleo em US$ 80), valor que Gabrielli considera "absolutamente normal para a Petrobrás".
Mesmo que seja normal para a empresa a captação de recursos nesse volume, isso não assegura a produção, pois nem a Petrobrás tem a certeza de que poderá dispor, a tempo, de todos os equipamentos de que necessita para explorar o pré-sal.
Fonte:O Estado de S.Paulo
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