Os sete concorrentes qualificados iniciaram uma guerra na qual trocam acusações entre si em documentos enviados à estatal
Elevados riscos financeiros e uma guerra já declarada entre concorrentes podem inviabilizar a megalicitação que a Petrobrás lançou no ano passado para contratação de até 28 sondas a serem construídas no Brasil. A abertura dos envelopes com os valores propostos está prevista para quinta-feira, e cada um dos quatro pacotes em que a licitação está dividida deve girar em torno de US$ 5,5 bilhões.
Entre os grupos que disputam a encomenda, há consórcios preparando antecipadamente recurso judicial. Da parte dos bancos que avalizam o processo, o temor é de que o pacote seja entregue a empresas técnica e financeiramente incapacitadas de cumprir uma encomenda de grande porte.
Pelo risco elevado, os juros sobre o financiamento também deverão ser maiores e, na opinião de construtores, essas taxas podem tornar a obra inviável.
São sete os concorrentes qualificados, que iniciaram uma guerra na qual trocam acusações entre si em documentos enviados à Petrobrás, aos quais a Agência Estado teve acesso. A maioria dos 40 recursos apresentados pelas empresas trata principalmente da qualificação de três grupos (Andrade Gutierrez, Eisa e o consórcio Alusa/Galvão) para a segunda fase da disputa.
Os três utilizam o design de plataforma feito pela empresa Gusto, braço do grupo holandês SBM, com impropriedades para um projeto de grande porte, segundo avaliações técnicas de auditorias contratadas pelas demais concorrentes.
O recurso apresentado pela Odebrecht - que está na disputa em consórcio com a OAS e UTC, visando a construção de um estaleiro na Bahia - possui 120 páginas e se baseou em laudo preparado pela DNV, empresa alemã de auditoria comumente contratada pela Petrobrás para avaliar a estrutura técnica de projetos.
O consórcio liderado pela Odebrecht, o estaleiro Jurong, de Cingapura, e o Estaleiro Atlântico Sul, sediado em Pernambuco, utilizam projetos da empresa LMG, em alternativa ao da Gusto. Já o estaleiro Keppel, também de Cingapura, utiliza o da Gusto, mas fez alterações que foram aprovadas nas auditorias.
Resposta. Em resposta aos ataques sofridos, os três estaleiros apresentam laudo de outra auditoria contratado pela Gusto que, na avaliação das fontes consultadas pela Agência Estado, acaba expondo ainda mais impropriedades contidas no design. Na resposta apresentada pelo estaleiro Eisa, por exemplo, consta laudo em que a Gusto especifica a necessidade de retirada de todos os trabalhadores da plataforma no caso de tormentas, sob o risco de adernamento da unidade.
Considerando que as plataformas vão atuar em áreas do pré-sal, a 300 quilômetros da costa e conectadas a poços a três mil metros de profundidade, técnicos do setor acreditam que este não seria o modelo mais adequado.
As discordâncias entre os candidatos foram confirmadas pela Agência Estado com cinco representantes de diferentes empresas e entidades envolvidas no processo. Nenhum, no entanto, concordou em se identificar, para não ter prejudicada a sua participação na disputa. O principal alvo dos ataques é o consórcio Alusa/Galvão, que também foi procurado pela reportagem, mas não retornou as ligações.
Além do problema do design, o consórcio contrariaria exigência da Petrobrás no processo licitatório, ao contratar suporte técnico da Cosco. A estatal exige que o suporte técnico tenha construído pelo menos uma sonda de perfuração para mais de três mil metros e, além disso, que a mesma esteja operando.
A única unidade nestas especificações feita pela chinesa Cosco foi destinada à própria Petrobrás e ainda não iniciou operações. Há no setor, no entanto, rumores de que o forte ataque ao consórcio Alusa/Galvão se deve principalmente à suspeita de que a empresa virá com um preço muito mais baixo na apresentação da proposta comercial.
Corte. Fontes consultadas estimam que o orçamento de corte da Petrobrás estaria na casa dos US$ 800 milhões por plataforma, e que o consórcio deverá apresentar proposta de US$ 690 milhões, enquanto os demais ficarão entre US$ 700 milhões e US$ 750 milhões.
Durante o projeto, um pool de bancos financia a obra. À medida que cada embarcação é entregue, o financiamento é assumido pela Petrobrás, com juros retroativos ao período da construção. O temor dos bancos é fundamentado em experiência malsucedida anterior da Petrobrás na contratação de pacotes de obras de equipamentos de grande porte com um único construtor.
Na década de 90, ganhou notoriedade o projeto Ametista, que previa a construção de seis plataformas pelo grupo Marítima, do empresário German Efromovich. O prazo e o preço do contrato foram estourados com larga margem e a Petrobrás, além de se ver obrigada a assinar termos aditivos com aumentos de custos, acabou recebendo apenas quatro das seis unidades.
Para lembrar
Em outubro do ano passado, a Petrobrás lançou licitação para a encomenda de 28 sondas de perfuração em águas ultraprofundas, que pela primeira vez serão construídas no Brasil. A encomenda faz parte de um pacote maior, de 40 equipamentos para perfurar principalmente a região mais promissora na exploração de petróleo no País: o pré-sal.
As 12 primeiras já foram contratadas no mercado internacional, já que a indústria brasileira não teria condições de cumprir os prazos de operação da primeira unidade, para o ano que vem. As estimativas são de que o negócio movimente mais de US$ 20 bilhões e crie cerca de 30 mil empregos. Todas as unidades serão entregues entre 2013 e 2017, para serem instaladas em áreas do pré-sal. Na época do anúncio da concorrência, o diretor da Área de Serviços da estatal, Renato Duque, explicou que a ideia dos pacotes com sete plataformas de uma vez teve como objetivo dar escala e "possibilitar a instalação de um novo estaleiro no País".
As sete primeiras sondas serão de propriedade da estatal e as demais, alugadas. A Petrobrás decidiu, também, exigir conteúdo nacional de equipamentos, em escalonamento: as duas primeiras sondas terão 25% de conteúdo nacional; as três seguintes, 40% e, depois disso, pelo menos 50%.
Navio-sonda é um navio projetado para perfuração de poços submarinos. Os primeiros sete navios terão capacidade de perfurar lâmina d"água de três mil metros.
Fonte:O Estado de S.Paulo/ Kelly Lima / Rio
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