A investigação da Petrobras sobre irregularidades nos contratos de fornecimento de mão-de-obra terceirizada da Hope Recursos Humanos e da Personal Service Recursos Humanos e com o Benefício Farmácia detectou envolvimento de 26 funcionários, sendo que 20 receberam sanções por desvios de conduta que a empresa não especificou. Desses, três foram demitidos na sexta-feira, inclusive "empregados com níveis gerenciais", mas não foram mencionados.
As informações foram divulgadas pela estatal em comunicado enviado por meio de sua rede interna para todos os funcionários.
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O Valor apurou que um dos demitidos foi o ex-diretor Corporativo e de Serviços, Antônio Sergio Oliveira Santana, que ocupava a gerência executiva de Responsabilidade Social. Santana assumiu a diretoria em fevereiro de 2015, com a licença de José Eduardo Dutra para tratar de um câncer que causou sua morte. Foi afastado do cargo na reestruturação da diretoria da estatal em maio, assumindo a gerência-executiva. Por meio de sua assessoria, Santana - que trabalhou 41 anos na estatal - "nega com veemência qualquer acusação relativa a irregularidades cometidas na companhia e associadas, injustamente, ao seu nome".
A Hope e a Personal foram citadas por delatores da Lava-Jato como veículos para pagamento de "comissões" mensais para a empresa JD Assessoria e Consultoria Ltda, do ex-ministro José Dirceu, e também para o ex-diretor de Serviços da Petrobras, Renato Duque, e o ex-tesoureiro do PT, João Vaccari.
Segundo uma fonte do Valor, as fraudes com os contratos envolvendo as duas empresas e o Benefício Farmácia teriam causado prejuízo de R$ 300 milhões para a Petrobras. O esquema era bastante complexo, segundo a fonte, e foi cometido por muitas pessoas que ainda poderão ser alvo de prisão.
A Hope é uma das 12 empresas que fazem parte do grupo WRR Participações e Investimentos, que controla a Hope Recursos Humanos e a Hope Serviços entre outras. Junto com a Personal, as empresas do grupo WRR tiveram contratos de R$ 6,48 bilhões com a Petrobras entre 2007 e 2016.
Até maio deste ano, os contratos ativos dessas duas empresas com a estatal somavam quase R$ 3 bilhões, tendo vencimentos entre 2016 e 2018. Com a Hope eram R$ 1,51 bilhão e com a Personal R$ 1,48 bilhão. O Formulário de Referência da companhia mostra que ela tinha 78.470 funcionários próprios em 2015 e 158.076 terceirizados em 2015, mas não informa quantos são contratados através das referidas empresas.
A Hope afirma que de um total de 15 mil funcionários, entre 4,5 mil a 5 mil estão alocados na Petrobras. A empresa informa que passou a ser gerida por executivos de mercado e que os antigos administradores e sócios se afastaram completamente da gestão.
A Personal informou ao Valor que dos seus 12 mil empregados, cerca de 3.500 estavam alocados na petrolífera. Disse ainda que estava há 21 anos no mercado e que atende 160 empresas, "seguindo regras rígidas de governança e compliance".
Estatal investigou 26 funcionários, puniu 20 mas ainda mantém contratos de R$ 3 bilhões com a Hope e a Personal
Enquanto os dois grupos eram investigados pela Lava-Jato, em Curitiba, e internamente pela estatal, a Personal foi vendida para a Quality/Embrasa. O ato de concentração do negócio foi enviado ao Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no dia 9 de março e a aprovação foi publicada no Diário Oficial da União no dia 25 de maio.
O Benefício Farmácia é um programa de assistência farmacêutica implantado em dezembro de 2006. Ele dá a todos os inscritos no plano de saúde da Petrobras (AMS) e seus dependentes acesso ao medicamentos.
A estatal informou ao Valor que o plano tem 280 mil beneficiários e que o gasto médio anual, considerando os últimos cinco anos, foi da ordem de R$ 67 milhões. A contribuição mensal varia de R$ 2,75 a R$ 16,53, dependendo da faixa salarial do titular. Até setembro de 2015, o benefício era operado pela Global Saúde, empresa que teve o contrato cancelado naquele mês. Segundo a empresa, a medida se deveu a "diversos problemas operacionais" e ao "não cumprimento de cláusulas contratuais previstas".
No comunicado interno de sexta-feira, a Petrobras informou que além de demitir três funcionários, outros oito foram suspensos e nove tiveram retenção ou cancelamento da inscrição no Programa Incentivado de Demissão Voluntária (PIDV). Quatro investigados não foram punidos porque não foram considerados responsáveis pelas irregularidades. Ainda segundo a nota, um investigado não é mais empregado e as medidas contra ele serão definidas pelo comitê de correção da companhia.
A Petrobras informou que o cancelamento do PIDV de alguns envolvidos resultará em processos de cobrança de ressarcimento no âmbito judicial, assim como o encaminhamento das investigações para o Ministério Público Federal (MPF). A apuração partiu das delações da Lava-Jato (a estatal teve autorização para compartilhar informações da investigação) e de denúncias no canal interno.
Funcionários da Petrobras avaliaram como forte o texto final do comunicado, interpretado como um duro recado da gestão do novo presidente, Pedro Parente. "Que não reste dúvidas: sempre que forem encontrados maus feitos (sic), a Petrobras punirá os responsáveis. Esse é o nosso compromisso legal, mas também a maior defesa que podemos fazer da esmagadora maioria de pessoas comprometidas que formam essa empresa", diz o comunicado.
Até maio, a Hope e a Personal ainda tinham contratos ativos com a estatal mesmo depois de terem sido expostas na Operação Lava-Jato em agosto de 2015. Foi quando o ex-ministro José Dirceu foi preso na 17ª fase da Operação Lava-Jato, batizada de "Pixuleco".
Com a Personal Service, os contratos ainda em vigor somam R$ 80,5 milhões. E com a Elfe Óleo & Gás Operação e Manutenção (outra do grupo WRR), o valor era de R$ 168 milhões segundo levantamento do Valor feito com base na lista de fornecedores da estatal. Este ano a Elfe assinou 14 contratos de manutenção offshore com a Petrobras, que somam R$ 93 milhões. Em abril, quando ainda investigava as empresas, a estatal esclareceu que adota o bloqueio cautelar "quando há fatos sobre os quais já existam provas concretas nas investigações decorrentes da citada Operação Lava Jato". A estatal não informou se tomou medidas depois das investigações.
A Hope e a Personal foram citadas por Julio Camargo e Augusto Ribeiro de Mendonça Neto, da Toyo Setal e pelo lobista Milton Pascowitch. Os pagamentos, segundo Pascowich, aconteceram entre 2004 e 2013. Ainda segundo o delator, a propina era tratada com Raúl Andrés Ortuzar Ramírez e Rogerio Penha da Silva, dois dos três sócios da WRR/Hope.
Os dois tiveram ordem de condução coercitiva no dia da prisão de José Dirceu mas não foram mencionados no pedido de condenação do ex-ministro e de outros 14 réus apresentado pelo MPF dia 7 de abril. Julio Camargo disse que eram cobrados 3% de todos os contratos. Segundo Pascowitch mesmo depois que Renato Duque deixou a diretoria de Serviços as propinas continuaram sendo pagas para empresa, a D3TM. (Colaborou André Ramalho)
Fonte: Valor Economico/Cláudia Schüffner | Do Rio