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Pré-sal cria novo mapa dos royalties

As riquezas geradas com a produção de petróleo estão jorrando em outras terras. O avanço no desenvolvimento dos campos do pré-sal, que já respondem por quase metade da produção do país, mudou o mapa da distribuição dos royalties do petróleo. Com isso, pela primeira vez, Campos dos Goytacazes e Macaé, no Norte do estado do Rio, deixaram de liderar o ranking dos municípios que mais recebem os recursos. Deram lugar a novas cidades, como Maricá e Niterói, que passaram a ser beneficiadas pelo aumento da produção principalmente dos campos de Lula e Sapinhoá, na Bacia de Santos, em franco crescimento. Esse movimento impulsionou ainda cidades como Rio de Janeiro, Saquarema e Angra dos Reis.

Essa mudança no perfil da produção de petróleo também elevou os royalties de municípios paulistas, que passaram a se beneficiar com o maior volume oriundo dos campos de pré-sal. A paradisíaca Ilhabela, por exemplo, já recebe mais royalties e participações especiais que Macaé neste ano. Com a enxurrada de recursos, especialistas alertam para a importância de se fazer um uso racional desse dinheiro de forma a evitar os erros cometidos por outros municípios no passado, que não diversificaram a economia e não conseguiram elevar a arrecadação própria de forma a compensar uma redução dos recursos do petróleo em momentos adversos.


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Em Maricá, só 3% das casas têm rede de esgoto

Os royalties e as participações especiais (PE), explicam analistas, são uma compensação financeira pela exploração de petróleo. Nos contratos de concessão em vigor, estão previstos o pagamento de royalties de 10% sobre o petróleo produzido no mar. Além disso, está definido o pagamento de PE, que incide apenas sobre os campos de alta produtividade, como é o caso de Lula e Sapinhoá.

Pela lei, esses recursos não devem ser usados para despesas correntes, como o pagamento de pessoal. Mas, nos últimos anos, muitas prefeituras passaram a usá-los para pagar funcionários terceirizados, o que é alvo de crítica de especialistas. Eles citam também o caso do Estado do Rio, que usa os royalties para pagar os aposentados.

A pequena Maricá, a cerca de 60 quilômetros da capital Rio de Janeiro, é hoje a líder em arrecadação: recebeu até julho R$ 389,4 milhões, um avanço de 135% ante o ano anterior. Niterói teve alta de 137%, para R$ 338,1 milhões. Deixaram para trás Campos e Macaé, que, embora tenham registrado avanço de quase 50% na arrecadação, somaram um total de royalties e PE de R$ 263,7 milhões e R$ 228,9 milhões, respectivamente. A cidade do Rio marcou a quinta posição, com alta de 84%, chegando a R$ 90,8 milhões.

— As áreas da Bacia de Campos estão em declínio, enquanto os campos do pré-sal na Bacia de Santos estão com produção ascendente. E, pela posição desses campos em alto-mar, os municípios ao Sul do Rio e os de São Paulo são beneficiados por estarem na área de influência — explica Alfredo Renault, professor da PUC-Rio.

Royalties podem chegar a 70% do orçamento

Mas, apesar do aumento na receita com royalties, Maricá, com quase 128 mil habitantes, coleciona indicadores preocupantes: a rede de esgoto só cobre 3% das casas, e a água encanada está em 35% das residências. A lista de desafios vai além. Em Maricá, não há indústrias nem hotéis. As lagoas e a orla não conseguem atrair turistas por causa do avanço da poluição e do crescimento desordenado de moradias ilegais. Entre a população local, o otimismo com as obras na cidade, como a pavimentação e a drenagem feitas pela prefeitura, se reflete no surgimento de novos estabelecimentos comerciais e na esperança da abertura de empregos.

— Espero que sejam criados novos empregos na cidade. Aqui não tem indústria nem nada. Só comércio mesmo. Já vi algumas melhoras com o dinheiro dos royalties, como todas essas obras de pavimentação. Mas tem muita coisa a fazer, como hospital, saúde e até mesmo lazer — enumera Márcia Costa, que trabalha como doméstica.

O aposentado Li Costa mora há 20 anos na cidade e vem acompanhando com preocupação o crescimento das obras.

— Eu me pergunto por que se asfaltam todas as ruas sem uma rede de escoamento de água. O ambiental é outro problema. Sempre quando tento andar de caiaque no Canal do Bambuí me deparo com muita poluição — conta Costa.

A prefeitura, que está sob nova gestão desde o início do ano, quer fazer uma parceria com outros municípios para construir uma barragem em Tanguá, em um projeto de R$ 210 milhões, para em 2020 já ter uma rede de água no município. Quer ainda construir miniestações de tratamento de esgoto nas lagoas para torná-las balneáveis.

— Sabemos que os recursos dos royalties são limitados. Temos o pé no chão. Queremos criar um polo industrial e atrair empresas com o desenvolvimento de um condomínio industrial em alguma área — afirma Leonardo Alves, secretário municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão, destacando que o volume de recursos do petróleo deve chegar a R$ 700 milhões neste ano, 70% do orçamento da cidade.

Niterói, que sofreu os reflexos da crise da indústria naval foi o segundo município fluminense que mais recebeu royalties este ano. O prefeito de Niterói, Rodrigo Neves (PV-RJ), garante que a cidade não vai cometer os mesmos erros que outros municípios. Ele disse estar usando esses recursos em projetos de infraestrutura, como drenagem, contenção de encostas e pavimentação. Na Região Oceânica, afirma, cerca de 50% dessas obras já foram concluídas. Niterói desenvolve ainda projetos de parceria pública-privada (PPP) para aumentar o fornecimento de água e saneamento básico.

O prefeito destaca que, desde seu primeiro mandato, em 2013, quando a economia crescia forte e o barril do petróleo estava acima de US$ 100, com outros municípios recebendo fartos recursos da receita dos royalties, Niterói já implantava um plano de austeridade com corte de gastos. Ele ressalta também a maior eficiência fiscal. Nos últimos anos, Niterói dobrou sua arrecadação própria. Só com IPTU, a alta foi de cerca de 80% em três anos.

— Queremos transformar Niterói em uma referência nacional. Temos uma cláusula para não usarmos recursos dos royalties para despesa de pessoal ou custeio permanente — diz Neves.

Em Niterói, parte vai para previdência

Por outro lado, a cidade vem destinando parte dos royalties para cobrir o déficit da previdência. Mas Neves garante que, dentro de oito a dez anos, a previdência do município voltará ao equilíbrio.

A cidade do Rio também tem sido beneficiada com o pré-sal. Segundo a secretária de Fazenda, Maria Eduarda Gouvêa, a expectativa para este ano é que a receita dos royalties seja de R$ 280 milhões, R$ 100 milhões a mais do que o previsto. Ela afirmou que a prefeitura está investindo apenas em obras de infraestrutura, como saneamento e preservação ambiental.

— Nós respeitamos a legislação em relação à aplicação desses recursos. Estamos realizando muitas obras de conservação ambiental, de contenção de encostas e de águas pluviais — explica a secretária.

Outro município cuja arrecadação vem aumentando é o de Angra dos Reis. O prefeito Fernando Jordão (PMDB-RJ) garante que, apesar da situação econômica, com a paralisação de obras como a da usina nuclear de Angra 3 e a redução de atividade do estaleiro Brasfels, fez um austero programa de corte de custos. Jordão diz que os royalties estão sendo usados em obras de saneamento, tratamento de resíduos e infraestrutura em geral:

— A crise fez bem para se aprender. É hora de aplicar melhor esses recursos, que antes eram aplicados em coisas desnecessárias.

‘Essas cidades podem ser campos amanhã’

José Luis Vianna da Cruz, professor de mestrado e doutorado da Universidade Cândido Mendes, lembra que as cidades precisam ter em mente, em primeiro lugar, que é preciso reduzir os déficits de infraestrutura e ter uma responsabilidade administrativa para permitir que a arrecadação própria seja eficiente. Ele cita o caso de Campos, onde metade dos moradores não paga IPTU e mais de 60% dos trabalhadores autônomos não recolhem ISS. Somente após uma organização fiscal é possível para o município fazer uma diversificação em sua economia.

— Essas cidades podem ser Campos amanhã. É só dar uma olhada na tragédia em que o Norte Fluminense se transformou. Além de todo o problema social e a falta de diversificação econômica, houve ainda questões como a antecipação dos royalties futuros — afirma Cruz.

O economista José Roberto Afonso, professor do Instituto de Direito Público e pesquisador da Fundação Getulio Vargas (FGV), destaca que os recursos dos royalties devem ser usados não só em infraestrutura, mas também no desenvolvimento de outras atividades que garantam receita própria futura para o município.

— É fundamental aproveitar os recursos e não queimar essa receita com despesas permanentes. Não se deve fazer o mesmo que o governo do Estado do Rio fez no passado com essa riqueza, que é finita — afirma o economista.

Em São Paulo, 44 municípios passaram a receber royalties e participações especiais nos últimos dez anos. A lista subiu de 66 para 110 cidades. O volume recebido também cresceu significativamente: 933%, passando de R$ 54,4 milhões, de janeiro a julho de 2007, para R$ 562,2 milhões nos sete primeiros meses deste ano. O líder entre as cidades paulistas é Ilhabela, que neste ano, até julho, recebeu R$ 240,6 milhões, quase a metade de todas as cidades de São Paulo somadas. Em segundo lugar, aparece a vizinha São Sebastião, com uma arrecadação de R$ 50,1 milhões. O aumento também ocorreu em relação ao ano passado. As receitas com petróleo em Ilhabela cresceram 77% e, em São Sebastião, houve alta de 39%.

Fonte: Época Negócios






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