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Pulso firme para definir regras

 

 


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Cenário de encomendas é positivo, mas setor ainda carece de núcleo do governo que concentre questões do setor

 

O plano de investimentos da Petrobras 2012-2016, apresentado no final do mês de junho, revisou para baixo as metas de produção de petróleo. Enquanto o documento anterior havia estabelecido uma produção diária de 3,1 milhões de barris em 2016, o plano atual prevê uma meta de 2,5 milhões de barris por dia. Para 2020, a meta nacional de produção diária diminuiu de 4,9 milhões de barris por dia para 4,2 milhões de barris diários.

Por outro lado, do total de US$ 236,5 bilhões a serem investidos pela companhia entre 2012 e 2016, cerca de 60%, equivalentes a US$ 141,8 bilhões, serão destinados ao segmento de exploração e produção (E&P).

 

“A prioridade absoluta da companhia são os projetos de exploração e produção de óleo e gás no Brasil e é fundamental que se tenha como premissa realismo nas metas de produção”, enfatizou a presidente da Petrobras, Maria das Graças Foster, durante a apresentação do plano. De acordo com o presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e da Reparação Naval e Offshore (Sinaval), Ariovaldo Rocha, o aumento dos investimentos previstos em E&P sinalizam que as encomendas para a construção naval brasileira serão mantidas. “O segmento offshore, plataformas e sondas de perfuração representa cerca de 60% da carteira de encomendas dos estaleiros e com os contratos para a construção de 35 sondas de perfuração esta participação irá aumentar”, destaca.

Para os agentes do setor naval, o cenário de encomendas continua otimista. No entanto, alguns gargalos políticos e regulatórios ainda diminuem a competitividade da indústria naval nacional.

A ausência de um núcleo do governo que concentre as questões relativas ao segmento é uma das principais queixas dos participantes do setor. “A construção naval no Brasil podia estar aspirando números muito maiores do que os que estão circulando no mercado se houvesse uma política coordenada de governo pensando em uma retomada séria da construção naval nesse país. O Ministério da Indústria [Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior], que deveria ser o pai dos assuntos navais no Brasil, não tem regras consistentes e abrangentes para o setor”, reclama o presidente da Câmara Setorial de Equipamentos Navais e de Offshore (CSEN) da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Cesar Prata.

Quem concorda com a opinião é o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Raul Sanson. “Sentimos que o governo ainda está em fase de arrumação. No nosso modo de ver falta uma coordenação com poder de diálogo entre ministérios e a autoridade máxima”, diz. O discurso também é compartilhado pelo vice-presidente executivo do Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima (Syndarma), Roberto Galli. “O Brasil continua um país complexo e as complexidades resultam de um quadro difuso de responsabilidades das autoridades com relação aos marcos regulatórios. Há uma superposição de entidades do governo no quadro regulatório e isso não é bom, as coisas não são bem definidas”, opina.

Esse empecilho acarreta outro: a ausência de uma política industrial. Prata lembra que o Brasil teve uma indústria naval pujante, que foi perdida nos anos 90 e que ainda não se recuperou por não ter uma política industrial consistente. Para ele, o que existe hoje são medidas de emergência tomadas para “apagar pequenos incêndios”. Uma das mais recentes foi a isenção de impostos na folha de pagamento de alguns setores, como o de máquinas e equipamentos e para a indústria naval.

Outra queixa dos representantes do segmento está relacionada à tributação brasileira que tem diminuído a competitividade dos fornecedores nacionais. Um dos aspectos dessa política de tributação é o Repetro, que permite a importação de equipamentos específicos para serem utilizados diretamente nas atividades de pesquisa e lavra das jazidas de petróleo e gás natural, sem a incidência dos tributos federais – II, IPI, PIS e Cofins. O presidente da Associação Brasileira das Empresas de Construção Naval e Offshore (Abenav), Augusto Mendonça, tem defendido a isonomia tributária para o setor. “Se olhar como estaleiro, prefiro comprar lá fora do que no Brasil, é muito mais simples, aqui ainda tem resíduo tributário que não tem como tirar, como o ICMS, por exemplo. Os equipamentos nacionais e importados devem ter a mesma carga tributária”, sugere.

Segundo Prata, da Abimaq, o Repetro estimula a importação, já que concede isenção inclusive de produtos com similar nacional, prejudicando assim os fornecedores locais. Embora seja positivo em alguns aspectos, o executivo destaca que deveria haver modificação no regime. “Que continue o incentivo para os itens que o Brasil não faz e nem quer fazer, mas  por que estimular a importação para aqueles produtos que o Brasil já faz com competência há décadas? Não, tem que estimular conteúdo nacional”, afirma.

A política de conteúdo local inclusive é um dos assuntos que mais tem sido debatido no setor. A Petrobras, durante a apresentação do novo plano de negócios, destacou a implantação do Programa de Medição e Monitoramento de Conteúdo Local. O objetivo é aproveitar ao máximo a capacidade competitiva da indústria nacional de bens e serviços para o atendimento das demandas do plano com prazos e custos adequados às melhores práticas de mercado. “Temos um programa montado para que consigamos acompanhar e demonstrar que conteúdo local é factível para o atingimento dos nossos projetos. Não adianta apenas planejar, mas sim comprovar que atingimos conteúdo local”, disse durante o evento o diretor de exploração e produção da Petrobras, José Miranda Formigli.

O primeiro passo do plano de ação da companhia é o planejamento do conteúdo local mínimo dos projetos do plano. Para isso serão identificados os bens e serviços importados e os itens já nacionalizados. A próxima etapa é o monitoramento do conteúdo local através do acompanhamento dos índices nos projetos e ações para recuperação de eventuais desvios de preço e prazo. A última fase é o registro do conteúdo local, onde serão elaborados relatórios de realização de conteúdo local por projeto e atualizada a base de dados para futuros projetos.

Quem poderá auxiliar a Petrobras neste programa é o Sinaval. A instituição realizou no ano passado um mapeamento sobre a situação do conteúdo local nos fornecimentos a navios e plataformas. O documento mostra que para navios petroleiros o índice já atingiu 70%. No caso de navios de apoio e plataformas tipo FPSO, o percentual é de 61% e 63%, respectivamente. A participação dos fornecimentos locais no valor total de navios e plataformas é, em média, de 64% nesses três grupos.

A Organização Nacional da Indústria do Petróleo (Onip) também tem realizado um conjunto de ações relativas ao tema. Um deles é o Programa Plataformas Tecnológicas para a Indústria de Petróleo e Gás (Platec), uma ação conjunta da organização e do Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), financiado pela Finep com recursos do CT-Petro. Esse programa foi estruturado para promover o atendimento às demandas por inovação tecnológica da indústria de petróleo, gás e naval e busca identificar fornecedores nacionais com potencial para a nacionalização de bens e serviços atualmente importados.

Primeiramente são detalhados os equipamentos não fabricados no Brasil ou com gargalos de fornecimento. Depois são identificados os fabricantes nacionais com tecnologia próxima à desejada. A partir daí, são realizados workshops tecnológicos com o objetivo de reunir as partes interessadas, como operadoras, institutos tecnológicos, agentes de fomento e investidores, para que os projetos sejam colocados em prática. O foco dos projetos são equipamentos para FPSO, sondas de perfuração, barcos de apoio e reparo naval, infraestrutura submarina e marítima, além de exploração e produção onshore.

Sanson, da Firjan, é um dos que fazem elogios à metodologia Platec. Segundo o executivo, o índice nacional é definido através do percentual sobre o valor do navio, quando deveria haver metas específicas para os componentes. “Conteúdo local não é feito para colocar em serviços, mas em equipamentos, precisamos enxergar a demanda um pouco mais real”, salienta. A ideia do Platec, explica o executivo, é levar o projeto às autoridades para que o conteúdo local seja calculado a partir da família de equipamentos. “Estamos tentando fazer com que essa porcentagem seja traduzida em valores dentro dos equipamentos, de modo que se possa dizer o percentual do que é feito no Brasil”, declara.

A expressão “conteúdo local”, na avaliação de Prata, já está inserida no discurso de todos, mas não vem acontecendo no chão de fábrica. “Quando se diz que 70% de um navio é nacional, mão de obra e chapa de aço já resolveu a conta. Toda parte inteligente vem de fora. Não temos ainda uma indústria naval, temos uma indústria de cascos”, declara. Mendonça, da Abenav, retruca dizendo que esses dois itens constituem percentual significativo apenas nos navios de transporte. “Quando se fala em embarcação de apoio já não é assim, tem muito equipamento dentro [da embarcação], e plataforma muito menos”, contrapõe.

Muito tem se falado que a política de conteúdo local tem provocado atraso nos projetos. Graça, da Petrobras, disse que tal fato não se justifica e que sondas, por exemplo, construídas no exterior e com conteúdo local zero, também têm sido entregues com atraso. “O somatório dos dias de atraso das 10 sondas entregues em 2011 chegou a 542 dias”, salientou. Das 14 sondas previstas para chegar esse ano, sete já estão em operação, quatro estão em recebimento e três estão por chegar. Segundo Formigli, o processo de construção destas sondas foi acompanhado de perto para que não houvesse mais atrasos.

As iniciativas do Sinaval e da Onip também têm como objetivo atrair investimentos de empresas do exterior para o Brasil para itens sem fabricação nacional. Existe um grande interesse de fornecedores estrangeiros em vir para o Brasil sobretudo pela demanda do pré-sal e do mau momento do mercado internacional. De acordo com um levantamento da Petrobras, há diversas empresas de offshore já se instalando de alguma forma no país. Para produtos de dutos submarinos, por exemplo, a NKT Flexibles terá uma nova planta de dutos flexíveis no Brasil em 2013. No mesmo ano, a Wellstream expandirá em 60% a capacidade da sua planta atual. Na área de turbo-máquinas, a Rolls-Royce terá uma nova unidade em Santa Cruz, no Rio de Janeiro, para a fabricação de turbogeradores. A MEP Pellegrini, especializada em guindastes offshore, estuda o estabelecimento de uma planta no Brasil.

A Abenav também observa que novos entrantes da cadeia de fornecimento, tanto nacionais como estrangeiros, estão interessados no país. A associação tem atendido delegações de diversos países que querem conhecer mais sobre as necessidades do mercado e tentar encontrar parcerias ou formas de se implantarem no Brasil. “Temos conhecimento de pelo menos seis ou sete casos de empresas que já estão de alguma forma aqui. Não existe empresário que não devesse dar uma olhada no que significa o negócio pré-sal, porque há muita oportunidade”, declara.

Além de empresas, centros de tecnologia também têm vindo para o Brasil. A Petrobras mantém parcerias com mais de 120 universidades e centros de pesquisa. No parque tecnológico da Universidade Federal do Rio de Janeiro já estão em construção e/ou operação nove centros de pesquisa e desenvolvimento de fornecedores de equipamentos e serviços. Entre eles estão Schlumberger, Halliburton, General Electric e Usiminas. Outras companhias planejam o desenvolvimento de centros tecnológicos no país, como a IBM e a Wellstream. “Não apenas braços estão se instalando no Brasil. Cérebros também estão ficando aqui e esses centros de P&D que se instalam são indicativos de que as empresas percebem a importância de gerar projetos adaptados a nossa realidade e que podem ser utilizados em outros lugares do mundo”, ressalta Formigli.

Existem vários projetos em andamento, como os da cessão onerosa, os módulos replicantes, as sondas do pré-sal, os navios do Promef e EBN. A indústria está preparada para atender a essas encomendas? As opiniões são divergentes. Para Prata, não há capacidade produtiva e nem número de estaleiros com competência para fazer frente a estas demandas. Segundo ele, é necessária a criação de novas unidades modernas, com capacidade de construção de embarcações de grande porte, e com tecnologia avançada. “A atual incapacidade dos estaleiros poderá comprometer o pré-sal”, dispara ele.

Sanson observa que o cronograma de fabricação de navios, supply boats e plataformas está prejudicado pela “locomotiva do setor”, que são os estaleiros. “Além de não ter unidades suficientes, os que estão aí ainda estão atrasados”, lamenta. Para ele, existe um desarranjo no sistema de produção da Petrobras. “Ela [a presidente da companhia, Graça Foster] está tentando dar uma reviravolta e colocar esses investimentos em dia, de modo que tenha começo, meio e fim. Os atrasos causam desconforto e queda de ritmo em toda cadeia que, no momento, está meio desarrumada, não está navegando numa constante”, opina ele, dando como exemplo o atraso da saída do casco da P-55 do Estaleiro Atlântico Sul, em Pernambuco, para o Rio Grande. Por conta disso, alguns fornecedores para a plataforma já produziram os equipamentos e não têm onde colocar as encomendas.

Já Mendonça acredita que os estaleiros conseguirão fazer frente às encomendas, enquanto que os fornecedores ainda precisam ser mais competitivos.“Não tenho dúvida de que os estaleiros podem atender. A cadeia de fornecimento também consegue, mas temos que trabalhar para melhorar a competitividade, principalmente em questão de preço de alguns itens específicos que, quando comparamos com o mercado internacional, vemos diferenças”, disse ele.

O volume de empregos diretos gerados na indústria naval até o último mês de abril totalizou 58 mil pessoas, segundo dados do Sinaval. A perspectiva é chegar em 2015 com 100 mil empregos, já que novos estaleiros iniciarão operações em 2013 e 2014. “Um novo patamar será atingido na capacidade produtiva do setor, cuja capacidade de processamento de aço aumentará das atuais 560 mil toneladas ao ano para 1,1 milhão de toneladas anualmente”, prevê Rocha. Esta nova realidade também amplia os desafios sobre a formação e qualificação de mão de obra, outro gargalo importante detectado no segmento.

Mendonça destaca que o setor tem um desafio dobrado porque, além de manter o quadro de funcionários, é preciso ampliar o número de trabalhadores. Segundo o executivo, o maior desafio é a formação de técnicos para trabalharem nos estaleiros. “Formamos gente de fábrica e engenheiro, mas na formação de técnicos o Brasil ainda não deslanchou. Temos até discutido com universidades na tentativa de montar mais cursos para a formação desse pessoal”, diz.

A mão de obra de oficiais também continua escassa. De acordo com Galli, embora a Marinha tenha tomado providências inteligentes para minimizar o problema, esse gargalo deve permanecer por, pelo menos, mais cinco anos. A instituição, diz Galli, aumentou o número de vagas nas escolas de formação de oficiais no Ciaga e Ciaba e também iniciou a formação de oficiais com profissionais que já tivessem uma formação universitária compatível, mediante apenas a complementação de conhecimento. “Com isso eles estão conseguindo e conseguirão formar oficiais num prazo de tempo menor”, acredita ele.

Um estudo da Schlumberger Business Consulting, realizado sob encomenda da Transpetro e divulgado no final do ano passado,  sobre a oferta e demanda de oficiais de marinha mercante no mercado brasileiro, apontou que em 2020 poderiam faltar 992 oficiais para atender à demanda. O déficit poderia chegar a dois mil oficiais no fim da década dependendo do cumprimento da resolução normativa 72, do Conselho Nacional de Imigração, que obriga a utilização progressiva de brasileiros no setor marítimo após 90 dias de permanência das embarcações estrangeiras em águas brasileiras.

Apesar dos desafios a serem superados pelo setor, o cenário de encomendas traz uma percepção otimista aos agentes em função do volume de projetos previstos para o setor a médio e longo prazos. Prata, da Abimaq, destaca que o panorama será tão mais positivo à medida que as riquezas fiquem retidas no país. “Ou usamos esse petróleo e desenvolvemos o país, ou, se não fizermos nada, o pré-sal vai acontecer, vamos continuar produzindo e exportando mais petróleo e a indústria nacional vai quebrar”, fala.

Sanson, da Firjan, avalia que o pré-sal e o pós-sal demandarão investimentos significativos e a expectativa é que os recursos sejam aplicados dentro de uma política que beneficie a indústria nacional. “Estou entusiasmado porque sei que tem mercado, mas o entusiasmo é relativo. Se não conseguirmos aumentar a nossa participação da indústria, será ruim para nós e para o Brasil, porque temos o ouro negro aqui e não podemos deixar isso ser explorado lá fora, sem gerar riqueza no Brasil através de emprego e renda. De maneira geral, o empresário nasce com risco na veia, o que está difícil para nós é a incerteza”, declara.

Galli comenta que grande parte do parque industrial já está comprometido no curto e médio prazos e, se não houver uma alteração dramática na demanda em função de rearrumação econômica do Brasil, já que o país corre o risco de ser contaminado pela crise internacional, a tendência é que as perspectivas continuem positivas. “O que vai acontecer no curto e médio prazos tem muito a ver com a capacidade do Brasil de se manter à margem do clima confuso que vemos fora do Brasil”, diz.

Otimismo é a palavra usada por Mendonça para definir as suas expectativas para os próximos anos. Para ele, o setor vem respondendo a demanda à altura. “Pelo lado das encomendas vejo a Petrobras numa dinâmica nova, com pessoal novo, entrando com grandes desafios pela frente e já tem nos adiantado de que prazo, qualidade e competitividade são fatores fundamentais. Eu vejo nosso setor se preparando para isso e enxergando essa questão de uma forma bastante positiva”, conclui.

 






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