O secretário de advocacia da concorrência e competitividade do Ministério de Economia, César Mattos, afirmou que o diálogo com o Ministério da Infraestrutura tem sido produtivo, mas a pasta econômica entende que existem mecanismos de flexibilização do afretamento que podem ser mais arrojados do que as propostas atuais na mesa. Mattos disse que a Economia busca um instrumento que corrija as atuais normas do mercado e traga mais competitividade. O secretário voltou a dizer que a possibilidade de armadores entrarem e saírem do mercado brasileiro de navegação a qualquer instante não é um risco porque, na visão do ministério, daria mais incentivo para a entrada de novos players.
Ele avalia que o argumento de que é necessário lastro para evitar que os armadores estrangeiros se retirem na primeira oportunidade mais atrativa que ocorrer em outro mercado não é sólido do ponto de vista econômico. “Não vejo lealdade maior para o mercado doméstico simplesmente pelo fato de já ter estoque grande. Não vemos diferença de comportamento muito grande de um em relação ao outro (empresas nacionais de cabotagem X estrangeiras de longo curso). Ter estoque grande não parece que vai aumentar ou diminuir a fidelidade ao mercado”, afirmou Mattos na última segunda-feira (9), no seminário "A Cabotagem brasileira para o usuário", no Rio de Janeiro.
Mattos contou que o centro da discussão sobre o lastro é a possibilidade de uma liberalização mais plena no afretamento. “Pra mim sempre foi uma grande surpresa [a ideia] de que 'só poder ter mais [embarcações] se já tiver muito'. É o contrário do que vemos. Sou advogado da concorrência, quero estimulá-la de forma responsável (...) Não preciso fazer este cálculo. O objetivo ideal é não botar limite”, defendeu. Ele acrescentou que o afretamento dá mais dinamismo para o mercado e que a entrada, seja do estrangeiro, seja do próprio brasileiro, precisa ter flexibilidade.
O secretário para assuntos de transportes marítimos da Usuport-RJ, Abrahão Salomão, disse que é a favor do lastro, desde que o governo garanta empresas de menor porte igualdade de condições para construção em comparação a concorrentes com matrizes bilionárias, que compram navios todos os anos e que, no Brasil, têm maior acesso a recursos do Fundo da Marinha Mercante (FMM). “Quem opera navio, quer ter navio. Ninguém está se esquivando de formar frota. Precisamos ter igualdade de condição e o Brasil difere de qualquer outro nessa linha e valorizar os armadores genuinamente brasileiros que atendem usuários com excelência e baixo preço”, disse Salomão, que é diretor da Posidonia Shipping.
Salomão ressaltou que afretamento também é meio de formação de frota. "Não há argumento que diga que empresas maiores sejam melhores que as menores e mereçam algum tratamento privilegiado", afirmou. Ele considera que a Lei 9432/97 é perfeita porque equilibra bem a possibilidade de utilização de navio estrangeiro, abrindo possibilidade do armador brasileiro procurar construção na indústria naval brasileira. Ele alega, no entanto, que a lei nunca teve sua aplicação completa por conta de medidas no plano infralegal.
Na visão da Associação Brasileira de Armadores de Cabotagem (Abac), a Lei 9432/1997 partiu do princípio de que a empresa brasileira de navegação (EBN) precisa ter ativos para poder ampliar sua frota em 50% de sua tonelagem, com afretamento a casco nu e com suspensão de bandeira. Na ausência de frota nacional, as regras preveem a eventualidade do afretamento por viagem para não deixar usuário desassistido.
O diretor-executivo da Abac, Luis Fernando Resano, disse que os investimentos na compra de navios acontecem para mercados consolidados, enquanto se tem o instrumento do afretamento a casco nu para aqueles sistemas em maturação, o que possibilita aumentar a frota com menor capex. “A Lei 9432 parte do princípio de que é necessário lastro. A partir daí começamos a ter crescimento da frota. Associados da Abac participam em mais de 90% do transporte de cabotagem feito pela iniciativa privada. Temos 55 navios de bandeira brasileira. Não existe usuário não atendido”, destacou Resano.
A associação aponta necessidade de o governo atacar gargalos em custos operacionais, custos com tripulação e combustível. Resano também citou a burocracia de diferentes modais que, mesmo com grande quantidade de documentos eletrônicos, cobra a impressão dos arquivos. A Abac defende a necessidade de haver as mesmas regras para novos entrantes e que o crescimento da frota deve seguir as regras de navio afretado a casco nu com suspensão de bandeira e, posteriormente a circularização. “Se a frota de bandeira brasileira não está atendendo, precisamos de uma política pública para viabilizar uma frota maior de bandeira brasileira”, comentou.
Em relação a novos entrantes, a Abac sugere a reflexão sobre as razões para que grandes empresas de navegação internacionais atualmente não entrem na cabotagem brasileira. Resano questionou porque um armador como, por exemplo, a MSC teria dificuldade de comprar um navio para operar na cabotagem nacional, em vez de abrir escritório no Brasil e afretar navio para cabotagem. "Estamos abrindo para as empresas brasileiras, mas estamos abrindo para estrangeiras virem aqui morder um filão que deve ser atrativo", avaliou o diretor-executivo da associação.
Para a Abac, os armadores precisam ter ativos que lhes garantam a prestação de serviços adequados. “É um risco para o Estado permitir que empresas naveguem por tempo sem garantia para o Estado e para o proprietário da carga”, alertou Resano. Ele acrescentou que o Código comercial sinaliza que o usuário compartilha de responsabilidades e riscos junto ao armador e, por isso, precisa ter lastro para garantir aquilo que ele perdeu.
O engenheiro naval e ex-coordenador do FMM, Djalma Netto, lembrou que, em sua redação original, a Lei 9432 introduziu a ideia de de condicionar o afretamento à frota própria em construção sem colocar números, o que seria objeto de legislações complementares. Ele enfatizou a importância de o BR do Mar fazer análises adequadas sobre a necessidade de lastro. Ele considera que essas questões devem ser melhor estudadas antes de serem lançadas como soluções. “De repente importar navio pode ser uma solução. Para granéis líquidos é a mesma [solução] do que para granéis sólidos? E é a mesma para o contêiner? Existem vários tipos de cabotagem que precisam ser melhor estudados antes de sair jogando no ar”, indagou.
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