O diretor de relações institucionais da Aliança Navegação e Logística, braço do grupo alemão Hamburg Sud no Brasil, Mark Juzwiak, reclama principalmente da nova exigência de dois terços de tripulação nacional em barcos estrangeiros afretados por tempo ou viagem no projeto do BR do Mar. Ele diz que este vai ser o principal obstáculo para que as empresas optem por expandir por meio desse formato. Há uma previsão de que essa parcela de brasileiros trabalharia sob regime trabalhista internacional, mas, diz ele, o arranjo traria alto grau de insegurança jurídica ao negócio.
“Seriam navios estrangeiros em águas brasileiras com parte importante da tripulação de nacionais contratados no exterior, sob as leis de outro país. As chances de haver passivos trabalhistas à frente não são pequenas”, afirma. O executivo alega, ainda, risco potencial de falta de mão de obra, já que os brasileiros podem não aceitar os contratos internacionais, que preveem descanso menor e não remunerado, além de não exigir contribuições trabalhistas. Um terceiro problema na visão dos grandes grupos é a mistura de culturas à bordo, que resultaria em dificuldades não só de convívio, mas também de operação.
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Para o presidente da Comissão de Direito Marítimo da Ordem dos Advogados do Brasil e sócio do Kincaid Advogados, Godofredo Vianna, são claras as dificuldades impostas pelo novo arranjo trabalhista, sobre o qual o governo deveria trabalhar por mais garantias. Sobre a possível dificuldade para contratação, que acarretaria na paralisação dos negócios, Vianna afirma que a regra dos dois terços já incide sobre navios estrangeiros na cabotagem offshore, mas há previsão de preenchimento gradual do contingente por 180 dias.
“Hoje o texto prevê que o navio já comece a operar com a tripulação montada nos termos da lei. O acréscimo dessa norma de preenchimento no texto resolveria parte da insegurança”, diz o advogado.
Presidente da Log-In, que atua na cabotagem de contêineres na costa brasileira, Marcio Arany considera a imposição da maioria de marítimos brasileiros impeditivo maior ainda para empresas brasileiras como a que lidera. De fato, para promover controle tributário das operações e impedir evasão de divisas, o BR do Mar exige que os afretamentos sejam realizados por subsidiárias integrais das empresas brasileiras no exterior. Como as multinacionais já têm estrutura no país sede e possuem tripulações internacionais, se adequariam mais rapidamente.
“São duas realidades diferentes. Como está, a Log-in continuaria com o foco no casco nu [e não optaria pelas vantagens do BR do Mar]”, afirma. Para o executivo, uma saída mais aceitável para a nova lei seria limitar a exigência da nacionalidade brasileira para os cargos de chefia no barco, como comandante e chefe de máquinas.
Por trás dos argumentos listados está a antiga oposição dos armadores ao custo de uma tripulação brasileira na comparação com estrangeiros. Além de encargos trabalhistas, os marítimos brasileiros ficam dois meses embarcados e dois meses em terra a valor fixo, enquanto os estrangeiros trabalham seis meses para ter direito a um mês de descanso não remunerado.
O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Transporte Aquaviário e Aéreo, na Pesca e nos Portos (Conttmaf), Severino Almeida, diz que as organizações de marítimos vão resistir a um novo regramento trabalhista que reduza direitos dos embarcados nacionais. “A cabotagem brasileira está nas mãos de um oligopólio de maioria estrangeira que pouco constrói navios no país. A tripulação nacional é o único elo de compromisso do mercado com o país. Se sairmos, não sobra nada”, diz Almeida.
Fonte: Valor