Ecobrasil

Questão de sobrevivência

 

Empresas de salvatagem buscam certificações para não perder espaço. Fabricantes veem concorrência desleal e cobram fiscalização

PUBLICIDADE

Ecobrasil


Os acidentes aquaviários sempre reforçam a importância do aperfeiçoamento de equipamentos e de serviços de salvatagem para todos os tipos de navegação. Com a expansão da construção naval, das atividades de apoio no pré-sal e das movimentações nos portos brasileiros, existe a perspectiva de um aumento gradual para o comércio e manutenção dos equipamentos de salvatagem.

As empresas mais tradicionais desse segmento buscam adequar-se às novas exigências do mercado internacional, mas algumas delas vêm encontrando dificuldades para conseguir certificações e para competir com os concorrentes estrangeiros, que chegam a apresentar preços 50% mais baixos. Há casos de empresas que já estão apostando em outras linhas de produtos. Quem não correr, pode ficar de fora.

 

 

As contratações de equipamentos de salvatagem costumam ser disputadas e o vencedor das concorrências precisa estar em dia e seus produtos, certificados. Equipamentos novos precisam atender às exigências da Organização Marítima Internacional (IMO). A convenção Solas (Safety of Life at Sea), da qual o Brasil é signatário, é atualizada e revisada periodicamente, sendo que os países membros podem apresentar sugestões para melhorar a segurança no mar, como alterações em procedimentos, equipamentos e até mesmo a obrigatoriedade de utilização dos novos produtos.

No Brasil, as Normas da Autoridade Marítima (Normam) editadas pela Diretoria de Portos e Costas (DPC) da Marinha regulam os equipamentos utilizados por embarcações de bandeira nacional. A legislação estabelece que os materiais fabricados no país para utilização em embarcações nacionais devem ser homologados pela DPC, após testes rigorosos. Todos os equipamentos de salvatagem precisam ser mantidos em condições adequadas de pronto uso, seguindo as normas para inspeções e manutenções periódicas.

A principal preocupação das empresas de salvatagem em estar em dia com as certificações internacionais gira em torno da construção de plataformas e barcos de apoio para exploração do pré-sal, um grande filão para equipamentos de segurança. “Quanto mais plataformas e navios de apoio houver e quanto mais os portos se modernizarem para aumentar o seu movimento, maiores serão as oportunidades para o setor de material de salvatagem”, avalia Paulo Van Onselen, gerente naval da Extecil Santos.

Um dos equipamentos de maior demanda pelos próximos anos são os coletes salva-vidas da categoria classe I, utilizados na área de exploração de petróleo offshore. Conseguir a aprovação desses coletes é um dos objetivos da Allo, conhecida na área de sinalização náutica, e que busca alavancar as vendas e alcançar mais espaço no mercado de equipamentos de salvatagem. Segundo o diretor da empresa, Henrique Lotito, a empresa está estudando como aumentar sua participação nesse nicho. “A Allo está passando por uma reestruturação e investirá para aumentar sua cota de equipamentos de salvatagem no mercado”, conta o empresário.

Atualmente, a Allo comercializa boias circulares e coletes salva-vidas. Uma das apostas da empresa nesse segmento serão aparelhos flutuantes para sobrevivência — balsas retangulares muito utilizadas na região Norte.

A Ativa Náutica, que produz boias e todas as classes de coletes, projeta um crescimento de, pelo menos, 15% em 2012. Em fevereiro deste ano, a Ativa tornou-se a primeira fabricante no Brasil a ter o colete classe I homologado e certificado. Em meados de 2010, a Marinha havia modificado as normas para alinhar suas exigências às regras internacionais de homologação e certificação Solas.

Desenvolvido para plataformas e embarcações oceânicas, o colete classe I da Ativa possui uma gola escamoteável, que permite livre movimentação da cabeça e pescoço para que o usuário consiga passar por locais estreitos, baleeiras e barcos de resgate. Além disso, o produto possui ergonomia que leva uma pessoa desacordada com o rosto para baixo a desvirar-se sozinha em até dois segundos. No modelo base original exigido pela Marinha, esse tempo é de até sete segundos.

Em 2011, a fabricante comercializou aproximadamente 290 mil peças, entre coletes, boias e acessórios. De acordo com a supervisora de marketing da Ativa Náutica, Julia Ramalho, os setores que mais demandam equipamentos nesse momento são o setor offshore, por equipamentos classe I; e o setor esportivo amador, por equipamentos homologados classe V e o tradicional classe III.

 

Estima-se que a Ativa Náutica ocupe entre 80% e 90% do mercado brasileiro de coletes salva-vidas. Diversos coletes salva-vidas classe I já haviam sido aprovados pela diretoria, antes de a IMO passar a exigir novas performances relativas aos materiais utilizados em sua confecção e no seu desempenho na água. Somente a Ativa, até o momento, atendeu aos novos requisitos.

O processo de homologação varia bastante, dependendo dos materiais de salvatagem. Uma boia salva-vidas, por exemplo, que é submetida a oito testes, inferior ao processo de uma balsa salva-vidas inflável, que deve ser submetida a 33 testes antes de ser aprovada. O tempo mínimo de um processo de homologação é de 45 dias, sobretudo por causa do período de duração de alguns testes.

Julia, da Ativa Náutica, conta que, para cada componente envolvido na confecção dos produtos da Ativa são executados mais de 35 testes obrigatórios, como: tração, resistência mecânica, flutuabilidade e fogo.

De acordo com a DPC, cerca de 60 certificados de homologação de materiais de salvatagem são emitidos por ano, entre novos produtos e revalidações de certificados vencidos. A demanda crescente da comunidade marítima brasileira faz com que esse número aumente a cada ano. A diretoria destaca que, em 2012 há muitas solicitações de homologação de coletes salva-vidas esportivos. Entre as exigências para a homologação desses materiais está a obrigatoriedade de a empresa possuir um sistema de controle de qualidade certificado e que o material seja aprovado em todos os testes.

A Extecil Santos representa a fabricante brasileira S.O.S. Vitta, que produz rações de sobrevivência para náufragos. As rações sólidas e líquidas também foram homologadas pela DPC e, em breve terão certificação Solas, possibilitando a comercialização internacional do produto. A ração sólida de sobrevivência da S.O.S. Vitta foi desenvolvida em parceria com o Instituto de Tecnologia em Alimentos, patenteada no Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI), substituindo as antigas rações de jujubas e chicletes, que se deterioravam mais facilmente.

Van Onselen, da Extecil Santos, enfatiza que a maior parte do mercado de salvatagem é formada por produtos importados. Segundo ele, alguns itens de balsas salva-vidas Solas, como os pirotécnicos, são trazidos de fora, pois não há fabricante nacional com as certificações necessárias. O gerente naval da Extecil Santos aponta ainda que estão sendo oferecidos no mercado produtos de menor volume, de origem chinesa, importados por várias empresas, como coletes salva-vidas e outros dispositivos. A Extecil Santos, por exemplo, representa uma marca chinesa de balsas salva-vidas.

 

Há 40 anos no mercado de salvatagem, a Índios Pirotecnia fabrica sinalizadores pirotécnicos utilizados para salvatagem e socorro. Pedro Miranda, diretor da empresa, afirma que esse mercado tem sido muito prejudicado pela entrada de produtos chineses. Segundo ele, o custo e a qualidade baixa dos produtos importados e a falta de fiscalização tornam o negócio difícil de ser competitivo. Ele afirma que a empresa sentiu o impacto da chegada dos produtos chineses a partir de 2011.

A diretora da Ilha Náutica, Sandra Bittencourt, afirma que existem muitas empresas com dificuldades por não conseguir competir com os produtos importados. Por conta isso, muitas delas estão investindo em outros negócios para não fechar as portas. “Hoje, é preciso entrar em outro segmento para a empresa sobreviver. Não existe uma empresa nessa área no Brasil que não esteja passando por dificuldades. Estamos no mercado há 31 anos e não vemos possibilidade de abertura de portas para o mercado brasileiro. Existem tantos fabricantes com bons produtos aqui, mas a situação vai apertando cada vez mais”, analisa Sandra.

Sandra observa que existe uma ‘invasão’ de produtos chineses que, junto com os altos impostos, desanimam a indústria nacional. Segundo ela, para piorar há  falta de vistoria obrigatória nas embarcações. Alegando falta de fiscalização da Marinha e a entrada de produtos importados, a Índios Pirotecnia investe em uma outra linha, na área de munições não letais. Foi o mesmo que aconteceu com outras duas empresas que atuavam com esse tipo de produto: a Condor Tecnologias Não Letais, de Nova Iguaçu, (RJ) e a IBQ Sistema de Defesa, de Quatro Barras (PR). “A tendência da Índios é buscar um mercado que dê sustentabilidade para empresa. Vamos nos dedicar ao produto que melhor se encaixar nesse mercado, seja ele na pirotecnia de salvatagem e socorro, seja na munição menos letal”, explica Miranda.

A empresa fornece equipamentos como sinal fumígeno flutuante (três minutos de tempo de queima), sinal fumígeno flutuante iluminativo (15 minutos), sinal estrela vermelha com para-quedas e sinal facho manual luz vermelha.

Miranda acredita que os produtos chineses não reúnem condições de serem aprovados conforme determina a Normam 5 da DPC. “Se a Marinha do Brasil possui determinadas exigências com nosso produto que está no mercado, eu acredito que também deveria exigir dos produtos chineses”, alega Miranda. De acordo com ele, o material de homologação da Marinha faz exigências técnicas que os produtos chineses não vão conseguir corresponder com qualidade e desempenho esperados. “A primeira medida que deveria ser tomada é a de reciprocidade. Já que os nossos produtos são submetidos aos ensaios técnicos da homologação da Marinha, os produtos que vêm de fora também deveriam ser submetidos obrigatoriamente a esses mesmos ensaios”, defende Miranda.

Lotito, da Allo, destaca que os resultados da área de sinalização náutica de sua empresa viabilizam os investimentos para o mercado de salvatagem. A estratégia da Allo prevê a manutenção de um padrão de qualidade dos produtos, a otimização da produção para obter menores custos e o estabelecimento de estoque para pronta entrega.

A Allo planeja aumentar entre 10% e 15% sua presença no mercado em 2012. “Atingir algo como 30% do mercado é difícil, porque é uma luta de preço, de imposição, comercialização e de qualidade”, relata Lotito. Ele estima que a Allo tenha em torno de 5% de participação no mercado de coletes.

Sandra, da Ilha Náutica, também cobra mais fiscalização da Marinha. “É preciso mais acompanhamento para poder dar motivação entre as empresas. Não tenho nada contra o material importado. Mas acho que, antes de abrirmos as portas temos que pensar nos prós e nos contras. Será que nossos produtos possuem facilidade para entrar lá como entra o deles aqui?”, desabafa Sandra.

Já Julia, da Ativa Náutica, observa um aumento na demanda por equipamentos de segurança classe III e V em consequência do crescimento da eficiência das fiscalizações por parte da Marinha através das capitanias e delegacias fluviais e da divulgação na mídia de acidentes e fatalidades envolvendo a falta de cuidado e segurança no mar.

 

No Brasil, são poucas as empresas de salvatagem especializadas que são certificadas por sociedades classificadoras. Em alguns casos, os fabricantes impõem restrições quanto à quantidade de estações certificadas por porto ou por região.

Van Onselen, da Extecil Santos, afirma que os estaleiros, em busca de qualidade e menores preços, procuram equipamentos no mercado internacional que melhor lhes atendam. Mas segundo ele, o alto custo das taxas e impostos que incidem sobre as importações, principalmente de balsas salva-vidas e outros equipamentos de salvatagem, tornam difícil o atendimento à demanda dos estaleiros.

O gerente comercial da Brastech, Eduardo Inácio, acredita que o crescimento do mercado offshore, na área de construção, perfuração e apoio marítimo traz a perspectiva de investimentos de médio e longo prazo. No entanto, ele diz que falta compreensão de alguns armadores em relação à interpretação da legislação inerente ao mercado de salvatagem e segurança. Ele também avalia que o treinamento específico dos operadores de equipamentos de salvaguarda ainda pode evoluir.

Souza observa, ao longo dos últimos cinco anos, a modernização no segmento de segurança e aplicação de novas tecnologias, com a instalação de fábricas de equipamentos no Brasil. Em 2011, o crescimento da Brastech foi 35% superior aos anos anteriores. Souza conta que a empresa pretende assegurar um crescimento médio relativo de 15% na área de segurança. Com a expansão do segmento de óleo e gás, a projeção da empresa é registrar um aumento médio anual de 12% nos próximos oito anos.

A Brastech prepara o lançamento de duas balsas para emprego em unidades de apoio costeiro e travessias, com capacidade para transportar 65 e 85 pessoas, respectivamente. Souza destaca que a empresa ampliou em 60% sua estação de manutenção de embarcações de salvamento (botes de resgate) e sobrevivência (baleeiras). Além disso, a empresa aumentou o quadro técnico de engenheiros em 60% e dobrou a equipe de vendas.

A Sollax, que detém cerca de 80% no mercado de cestas de transferência, ampliou seus negócios para a área de balsas infláveis, a partir de 2010. Em maio, a empresa inaugura sua nova base em Vitória (ES), que já foi homologada e certificada para parte de incêndio e salvatagem. A ideia é inaugurar uma unidade no Rio de Janeiro, em 2012, e duas outras nos próximos dois anos, ambas no Nordeste.

O gerente comercial da Sollax, Sandro Ferreira, explica que a empresa surgiu há 18 anos, com foco na área de incêndios e está crescendo na área de salvatagem. Ferreira conta que a Sollax fechará parceiras internacionais. A empresa representará no Brasil a canadense DBC Marine Safety Systems, do grupo Survitec, que atua no segmento de balsas infláveis da marca Zodiac. Dois técnicos da empresa brasileira foram enviados para treinamento no Canadá.

Outra parceria está em andamento com uma empresa norte-americana, cujo nome só deve ser divulgado em junho. Com os dois contratos, a Sollax pretende atingir em 2012 um crescimento de 30% sobre 2011. “Na área de incêndio e na área de salvatagem, o mercado é bastante competitivo. Mas temos analisado da seguinte maneira: hoje em dia poucas empresas têm conseguido se manter regulares no mercado. Os clientes têm exigido empresas qualificadas e certificadas. As empresas terão que cumprir essas exigências. Boa parte da concorrência não tem conseguido acompanhar isso”, ressalta Ferreira.

Ferreira lembra que, na época em que a Sollax resolveu investir em cestas, existiam poucos fabricantes e a empresa conseguiu conquistar grande parcela do mercado. Com as balsas, a Sollax pretende adotar a mesma estratégia agressiva que fez com as cestas quando estava ingressando nesse mercado: entrar com preço competitivo, nesse caso, dando uma nova cesta com preço de uma revisão. “A ideia é o preço de revisão da sua balsa salva-vidas. A Sollax fornecerá uma balsa nova no preço da revisão da sua antiga. A estratégia para ganhar mercado já está sendo adotada. O lançamento oficial da parceria será a partir de maio”, revela Ferreira.

 

Sandra, da Ilha Náutica, ressalta a qualidade dos equipamentos brasileiros, mas ainda vê algumas carências. Ela cita a falta de coletes em tamanhos especiais para pessoas acima de 70 quilos e obesas. “Hoje, dentro da Petrobras, existem muitas pessoas gordas embarcadas em plataformas. Essas pessoas têm dificuldade de vestir o colete. E os coletes chineses são fabricados para pesos entre 60 e 70 quilos. Não existem dentre os modelos chineses produtos extra grande”, revela Sandra.

Julia, da Ativa Náutica, acredita que a mudança das normas Solas trouxe uma invasão de coletes chineses classe I para o mercado. Segundo ela, a maioria desses produtos possui preço extremamente competitivo, mas deixa a desejar na qualidade e no acabamento. “Isso compromete e coloca em dúvida a segurança que esse equipamento será capaz de proporcionar em uma situação real de resgate”, alerta Julia.

A Índios Pirotecnia também considera a tributação sobre os produtos importados desigual. Miranda diz que os produtos chineses, por exemplo, chegam a 40% do valor do produto nacional. “Nosso produto é altamente tributado, caro para se produzir e, somado a uma folha de pagamento muito alta, o material chega a custar 42% mais.

Julia, da Ativa Náutica, também lamenta os altos números da tributação sobre equipamentos de salvatagem. Segundo a supervisora de marketing da empresa, entre impostos diretos e indiretos, o valor final do produto para o consumidor, cresce em média 35%. Apesar disso, Miranda, da Índios Pirotecnia, acredita que os eventos internacionais que o país receberá nos próximos quatro anos farão o mercado de segurança aquaviária crescer. A expectativa também passa pelo Plano Estratégico de Defesa, que buscará aumentar a segurança nas fronteiras do país.

Miranda destaca ainda que o mercado náutico no Brasil está em grande ascensão, crescendo de 30% a 40% ao ano. Segundo ele, os acidentes de maior relevância estão envolvidos com esse mercado. O diretor da Índios defende que, se não houver campanhas de esclarecimento do material utilizado e sua área de abrangência, será comum que o navegante se confunda na hora de operar um equipamento de socorro. “Se as autoridades estiverem dispostas a acentuar e afirmar a importância da indústria de defesa no país, acho que nosso segmento terá sustentabilidade. É um plano muito eficiente para indústria nacional. O que não pode acontecer é dar espaço para os produtos de fora”, pondera Miranda.  n

 



Yanmar

      GHT    Antaq
       

 

 

Anuncie PN

 

  Sinaval   Assine Portos e Navios
       
       

© Portos e Navios. Todos os direitos reservados. Editora Quebra-Mar Ltda.
Rua Leandro Martins, 10/6º andar - Centro - Rio de Janeiro - RJ - CEP 20080-070 - Tel. +55 21 2283-1407
Diretores - Marcos Godoy Perez e Rosângela Vieira