As polêmicas que envolvem a atuação da Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP) na elaboração de estudos técnicos para a concessão e arrendamento de portos conseguiram provocar um racha no Tribunal de Contas da União (TCU).
Ontem, pela terceira vez, o processo que questiona a atuação da EBP na elaboração dos estudos de viabilidade de 161 áreas portuárias foi alvo de mais um adiamento, por conta de pedido de vista apresentado pelo ministro Benjamin Zymler, durante audiência no tribunal. O pedido, que protela a decisão de um processo apresentado em novembro do ano passado, evidencia a forte divergência de opiniões sobre o assunto e os possíveis desdobramentos que a sua decisão pode acarretar.
Zymler, como já deixou claro em comentários sobre o tema, é favorável à atuação da EBP. Defendeu o papel da empresa, tida como solução para romper as dificuldades do governo em contratar projetos de engenharia. Por outro lado, sobram críticas aos métodos de operação da EBP, boa parte delas puxadas pela ministra Ana Arraes e pelo ministro José Jorge.
"Realmente, os ministros estão muito divididos sobre esse tema. O que pedi é que façam uma avaliação com muito cuidado, porque é algo importante para o país", disse ao Valor o presidente do TCU, ministro Augusto Nardes. A atenção que o governo tem dispensado ao assunto ficou clara no dia 18, quando o ministro da Casa Civil, Aloizio Mercadante, em visita ao TCU, fez questão de reforçar a relevância do tema para o Palácio
O que preocupa o governo, na prática, são as consequências que um desfecho desfavorável à EBP pode ter sobre as concessões. Se o TCU julgar que houve irregularidades na atuação da EBP apenas no caso dos portos, pode fazer determinações que atinjam somente esses projetos portuários. Se entender, no entanto, que o modelo de atuação da EBP apresenta problemas, isso significa colocar em xeque estudos que balizaram concessões já realizadas, como as de aeroportos e rodovias.
A EBP pertence a nove bancos. Além dos estatais Banco do Brasil e BNDES, tem como sócios Bradesco, Citibank, Banco Espírito Santo, Itaú BBA, HSBC, Santander e Votorantim. A empresa presta serviços para o governo sem passar por licitação. Criada em 2008, a empresa assume contratos por meio de uma "autorização" dada pelo governo. A partir daí, por sua conta e risco, banca o financiamento dos estudos.
O governo não faz repasse direto para pagar esses estudos. Tudo é financiado pelo caixa da EBP. A companhia só recebe pelo trabalho se aquele projeto que estudou for, efetivamente, concedido. Pelo modelo, quem paga essa conta é o concessionário que vence o leilão, e não o setor público.
A aprovação desse modelo, no entanto, não é unanimidade no TCU, que também vê situações de favorecimento da EBP para elaboração dos estudos. Em novembro do ano passado, o ministro-substituto Marcos Bemquerer fez uma série de críticas à empresa e seus estudos de portos. O processo, no entanto, foi alvo do primeiro pedido de vista por Zymler.
Em dezembro, o tema voltou à pauta. Ana Arraes voltou a criticar a empresa e declarou que "a EBP, empresa privada que deveria gozar das mesmas prerrogativas conferidas a qualquer outra empresa elaboradora de projetos, teve privilégio ao conhecer, antecipadamente, as intenções do governo relacionadas à desestatização de áreas portuárias, com possibilidades de tê-la, inclusive, discutido".
Em sua decisão, a ministra pediu que a Secretaria Especial de Portos (SEP), o BNDES e a EBP apresentassem explicações. No mesmo mês, o economista Helcio Tokeshi, diretor-geral da EBP, pediu demissão e deixou o cargo em janeiro deste ano, alegando razões pessoais.
Uma semana atrás, o processo voltou à pauta para ser julgado, dessa vez pelas mãos do ministro Weder de Oliveira. Mais uma vez, não avançou, por conta de pedido de vista de José Jorge, crítico da EBP. A expectativa era que a situação se resolvesse ontem, mas Zymler voltou a pedir prazo para analisar o caso.
Para complicar a situação, pesa contra a atuação da EBP a avaliação do Ministério Público Federal. Um dos questionamentos do MPF diz respeito aos valores fixados para ressarcimento dos estudos da EBP. No caso de portos, os estudos resultaram na cobrança de pagamento médio de R$ 400 mil por área a ser licitada, quando o valor médio informado pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), segundo o TCU, era de R$ 232,7 mil por área.
Em meio às polêmicas, o governo já sinalizou que o monopólio da EBP na condução do processo vai acabar. Na semana passada, o Ministério dos Transportes informou que 25 empresas manifestaram interesse em elaborar o estudo de viabilidade técnica e econômica para as novas concessões de rodovias. No TCU, não há data para o processo voltar à votação.
Fonte: Valor Econômico/André Borges | De Brasília
PUBLICIDADE