Indicações políticas e a nomeação de gestores sem conhecimento técnico suficiente nas Companhias Docas são um dos fatores apontados pelo Tribunal de Contas da União (TCU), em auditoria recém-concluída, para a histórica ineficiência dos portos organizados.
Em meio às negociações do Palácio do Planalto com o Centrão, para formar uma base aliada no Congresso Nacional, a auditoria mostra que 70% dos representantes de terminais arrendados afirmam que a gestão da autoridade portuária no local de sua atuação é prejudicada por indicações políticas. A constatação apareceu em questionário feito com terminais operados pela iniciativa privada em portos organizados, onde o poder público administra o “condomínio portuário” (infraestrutura de acesso, segurança, dragagem).
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O relatório lembra que cinco gestores passaram pela presidência da CDRJ, somente entre 2014 e 2017, o que pode ter levado a mudanças frequentes no estabelecimento de prioridades para os portos do Rio de Janeiro e Itaguaí. Em 2018, o então presidente e dois diretores da Codesp foram presos pela Polícia Federal em Santos, por suspeita de fraude em licitações e associação criminosa em contratos no valor total de R$ 37 milhões.
“Embora não se possa estabelecer relação de causalidade entre a indicação política de gestores sem qualificação técnica ou gerencial e casos de corrupção, pode-se inferir que uma gestão deficiente, pouco comprometida com resultados e pouco transparente favorece o surgimento de ambiente mais propício à fraude, corrupção e outras práticas ilícitas”, nota o relatório.
Eis a raiz de um círculo vicioso detectado pela auditoria: “A reduzida margem de discricionariedade na tomada de decisão pelas autoridades portuárias, sujeitando-as a várias instâncias e controles (...), é uma forma de mitigar o risco de decisões que não atendam propriamente aos interesses do porto. O custo dessas medidas é o engessamento das licitações e contratos, com reflexos negativos na competitividade do porto público”.
A auditoria foi conduzida pela Secretaria de Fiscalização de Infraestrutura Portuária e Ferroviária do TCU. É relatada pelo ministro Bruno Dantas e ainda precisa ser levada ao plenário do tribunal.
A unidade técnica do TCU propõe que o plenário adote uma recomendação ao governo: estender as exigências da Lei de Responsabilidade das Estatais (13.306/2016) para a nomeação de cargos intermediários nas autoridades portuárias. Essa legislação já define critérios mais rigorosos para integrantes da diretoria ou dos conselhos de administração das empresas.
O deputado Paulinho da Força (SD-SP) afirmou recentemente ter recebido oferta do Planalto para indicar a presidência do Porto de Santos. Assessores presidenciais rebatem e garantem que não há sinalização de rifar cargos no setor portuário para partidos do chamado Centrão.
“O Ministério da Infraestrutura mantém desde o início da atual gestão a política de indicações técnicas que envolvem servidores efetivos, militares e executivos de mercado para funções-chave nas companhias docas sob gestão federal”, disse a assessoria da pasta.
Segundo o relatório do TCU, os representantes de terminais elogiam a capacidade das diretorias nomeadas pelo atual governo: “Há comentários no sentido de que isso [indicações políticas] ocorria no passado, mas não se aplica aos atuais dirigentes da Codesp, os quais têm recebido menções de elogio pelo perfil eminentemente técnico e profissional”.
O presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Jesualdo Silva, confirma essa impressão e diz que houve profissionalização das Companhias Docas. “Hoje temos instrumentos, se não para evitar, minimizar indicações político-partidárias”, afirma, referindo-se à Lei de Responsabilidade das Estatais. “Mas é uma preocupação e uma vigilância que sempre devemos ter.”
O governo Jair Bolsonaro já contratou estudos para a desestatização da Codesa (ES) e da Codesp (SP) até o final de 2022.
Fonte: Valor