Empresas estão suspendendo investimentos na retaguarda do porto de Santos devido ao projeto do governo de expandir os limites do porto em áreas privadas. A insegurança jurídica levou a Granel Química a interromper um aporte de R$ 225 milhões na construção de seu segundo terminal para líquidos em Santos. Pela mesma razão, a multinacional Stolthaven paralisou um plano de expansão que previa investimentos de R$ 180 milhões até 2017.
A intenção de Brasília é ampliar o porto organizado incluindo, entre outras áreas, o distrito industrial da Alemoa, ocupado por 37 empresas que têm a titularidade dos terrenos. Mas pela nova Lei dos Portos, as áreas do porto organizado só podem ser ocupadas via licitação. As empresas do distrito temem, assim, o risco de seus imóveis serem desapropriados e de as operações de movimentação de cargas serem descontinuadas. A aprovação da alteração dos limites do porto, chamada de poligonal, depende de um decreto presidencial. A minuta já foi elaborada pela Secretaria de Portos (SEP).
O distrito industrial da Alemoa reúne desde terminais que fazem movimentação direta de cargas - por meio de dutos ligados ao cais público - a armazéns para contêineres vazios e instalações onde são adiantados processos de importação e exportação. Entre ISS e IPTU, as empresas geram R$ 50 milhões por ano aos cofres municipais e empregam diretamente 2.500 pessoas.
"As áreas já são produtivas, na sua grande maioria em atividades portuárias. Desapropriá-las e licitá-las para a mesma atividade nos parece totalmente sem sentido", afirma Ary Serpa, gerente-geral da Granel Química, empresa do grupo Odfjell. Dos R$ 225 milhões, a Granel já investiu cerca de R$ 80 milhões, sendo R$ 45 milhões na compra do terreno e o restante no estaqueamento e na construção das fundações dos tanques de armazenagem e nas fundações que irão conectar o terminal ao píer.
"A ideia do aumento da poligonal vai na contramão do objetivo do governo de incentivar o investimento da iniciativa privada", afirma o presidente do conselho administrativo da Associação Brasileira de Terminais de Líquidos (ABTL), Fernando Fontes. Os terminais do distrito da Alemoa movimentam por ano 2 milhões de toneladas, o equivalente a 20% do volume de líquidos operado no porto.
"Não está claro qual o interesse público em se fazer isso numa área com empresas em plena operação e com projetos de expansão", disse o presidente da Associação das Empresas do Distrito Industrial e Portuário da Alemoa (AMA), João Maria Menano. O executivo é um dos sócios no Alemoa S/A, que também seria englobado na nova poligonal. O projeto prevê a construção de um terminal e três berços de atracação, em um investimento de R$ 200 milhões. Os antepassados dos atuais controladores compraram os terrenos em 1880, da massa falida do Barão de Mauá.
Nas justificativas para a aprovação da nova poligonal, o ministro dos Portos, Leônidas Cristino, diz que a inclusão da área denominada Alemoa-Saboó é "prioritária e vantajosa" porque garantirá "acessibilidade ferroviária e rodoviária" ao porto. O documento também cita que a inclusão de novas áreas pretende evitar que a pressão imobiliária inviabilize a expansão do porto, cuja capacidade operacional está perto da saturação.
Temerosas, as empresas começaram a ajuizar ações pedindo a anulação do processo administrativo para questionar a atuação da União. O argumento, além do risco de interrupção das operações, é que a União precisa desapropriar os imóveis antes de aumentar os limites do porto. Em recente evento em Santos, o diretor-geral da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Pedro Brito, disse que o procedimento a ser adotado seria a desapropriação seguida da alteração da poligonal. "Contudo, esse não é o entendimento da SEP. Nos autos da ação judicial, a União defendeu-se informando que, em razão das alterações trazidas pela nova Lei dos Portos, 'o decreto que alterar os limites do porto organizado e incluir bens particulares estará promovendo a desapropriação dos mesmos em prol da União'", disse Igor Tamasauskas, advogado da AMA, da Tequimar, da Granel Química, da Alemoa S/A e da Vopak.
A SEP disse que em razão dos novos parâmetros da Lei dos Portos, "as áreas dos portos organizados deverão estar claramente definidas, o que poderá exigir, em alguns casos, uma revisão das suas poligonais". Mas destacou que "serão mantidos e fortalecidos os fundamentos do novo marco legal do setor, em especial a garantia da segurança jurídica, baseada em regras claras e precisas".
Fonte: Valor Econômico/ Fernanda Pires | Para o Valor, de Santos
PUBLICIDADE