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Mais modesta, agenda de privatizações pode andar

De nada adianta queimar etapas e inflar planos ou anúncios que não saem do discurso

Pode-se alimentar um otimismo cauteloso, bastante cauteloso, mas de toda forma otimismo, com a agenda de privatizações do governo federal. Megalomanias trilionárias foram trocadas por uma postura “pés no chão” do secretário especial de Desestatização do Ministério da Economia, Diogo Mac Cord, que assumiu o cargo no fim de agosto. Ele substituiu o empresário Salim Mattar, que levou a Brasília o ímpeto do setor privado, mas não conseguiu transformar sua exitosa trajetória no mundo corporativo em liderança na máquina pública e necessária costura política com o Congresso Nacional.


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Tão novato na administração federal quanto seu antecessor na secretaria, Mac Cord tem um histórico negociador de sucesso com deputados e senadores. Ele foi designado, pelo ministro Paulo Guedes, como interlocutor da equipe econômica com os congressistas nas discussões do novo marco legal do saneamento - o avanço legislativo mais importante, junto com a reforma da Previdência, do atual governo. Na semana passada, em entrevista ao Valor, o secretário demonstrou foco ao colocar os Correios no topo da lista de privatizações: “Não adianta querer fazer tudo de uma vez. Não vai dar certo e precisamos de exemplos. Hoje o caminho de consenso parece ser os Correios”.

Ainda é cedo para comprovar tal afirmação. Sindicatos continuam estridentes e não se sabe qual será o grau de concordância parlamentar. No entanto, saem de cena algumas ideias que careciam de pragmatismo diante da missão de evoluir nessa agenda. A proposta de um “fast track” para as privatizações, embora jamais detalhada, não parecia ter a mínima chance de sucesso ao dar um aval prévio para o governo vender suas estatais. Faltaria aos legisladores, apegados à prática da troca de apoio político por indicações em empresas públicas, qualquer incentivo à aprovação de proposta como essa.

No sobe-e-desce das privatizações, cai um pouco a da Eletrobras, cujo projeto de lei para sua autorização chegou inicialmente ao Congresso em 2018 e nunca deu passos relevantes. Periodicamente, também surgiam balões de ensaio sobre eventual venda de algum grande banco público, tão superficiais quanto inúteis. Mais vale gastar energia com desestatizações plausíveis e com enormes ganhos potenciais, como as Companhias Docas e as estatais de mobilidade CBTU e Trensurb.

Alguns erros precisam ser corrigidos com urgência. O primeiro é a demora em contratar estudos preparatórios para as privatizações. Eles não são formalidade, mas necessários para dar segurança e transparência à avaliação de ativos públicos. No fim de julho, nem metade dos 18 projetos incluídos no Plano Nacional de Desestatização (PND) pelo governo Jair Bolsonaro estava em fase de estruturação (“Folha de S. Paulo”, 29/7). Só em setembro o BNDES assinou contrato com um consórcio para a realização dos estudos técnicos e jurídicos relativos ao Porto de Santos. No caso da CBTU e da Trensurb, o processo tem se caracterizado por morosidade e indefinição.

Sem os estudos prontos, ou encaminhados, é duvidoso fazer projeção, como se arriscou o ministro Fábio Faria (Comunicações), que deu estimativa de R$ 15 bilhões para os Correios. Tudo depende das condições. E as condições dependem de uma série de fatores, como a nova lei postal, cujo texto ainda está na Casa Civil. Portanto, enquanto se preparam as privatizações, é conveniente acelerar a discussão de marcos regulatórios que protejam investidores e o interesse público.

Outra correção de rota diz respeito à necessidade de centralizar o poder decisório em algum lugar. O ex-secretário Salim saiu reclamando, também, da resistência de ministros à privatização de empresas vinculadas às suas respectivas pastas. É natural que isso ocorra. Seja pela pressão da burocracia interna ou dos sindicatos, seja por verem riscos onde a maioria enxerga apenas benefícios, ministros setoriais podem colocar restrições. Nem a Secretaria de Desestatização, nem o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) parecem ter, hoje, força suficiente para superar impasses surgidos na máquina pública, mesmo quando há diretriz clara das instâncias políticas mais altas. Dar carta branca a alguém para executar decisões difíceis faria grande diferença na obtenção de resultados e cumprimento de cronogramas.

Não há que se temer a agenda de privatizações. Onde elas ocorreram, deu muito mais certo do que errado: da siderurgia à Embraer, da distribuição de energia elétrica à telefonia. Mas de nada adianta queimar etapas e inflar planos ou anúncios que não saem do discurso. Objetividade, estudos consistentes, marcos legais confiáveis e poder decisório nas mãos de um bom capitão são imprescindíveis.

Fonte: Valor






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