Mudanças na gestão ambiental

Reforma portuária e regras complementares geram insegurança jurídica sobre licenciamento

A medida provisória 595 e as leis ambientais editadas nos últimos dois anos trouxeram novas dúvidas e incertezas sobre como será feito o licenciamento ambiental nos portos. Uma das questões recentes, prevista na MP, estabelece que autorizações e contratos de concessão e arrendamentos dependerão da emissão do termo de referência para estudos ambientais, ao invés da aprovação do Relatório de Impacto Ambiental (Rima). Segundo o advogado Raphael Vianna, da Consultoria Rocha, Teixeira & Advogados Associados (CRT), o texto que trata do termo de referência gerou insegurança no setor.

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Ecobrasil


A MP-595/2012 prevê que os contratos de concessão ou arrendamento e a expedição de autorização sejam precedidos da emissão, pelo órgão licenciador, do termo de referência para os estudos ambientais com vistas ao licenciamento. De acordo com a MP, a assinatura dos contratos também depende de consultas à autoridade aduaneira e ao respectivo poder público municipal, o que já era exigido pela Lei 8.630/1993.

Durante o 9º Seminário Nacional sobre Indústria Marítima e Meio Ambiente (Ecobrasil), promovido pela Portos e Navios, representantes do setor demonstraram preocupação com a qualidade dos novos empreendimentos. Eles também temem impactos ambientais por conta de modificações nos projetos ao longo do licenciamento. Isso porque o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) não descarta a possibilidade de os projetos sofrerem mudanças relevantes em relação ao termo de referência.

— O licenciamento ambiental prevê a avaliação dos projetos considerando alternativas locacionais e tecnológicas e a avaliação de impactos ambientais no estudo, fase posterior ao termo de referência. Os projetos podem, portanto, sofrer alterações após a emissão do termo — admite a coordenadora de portos, aeroportos e hidrovias do Ibama, Mariana Pereira, que participou do evento.

Lucijane Monteiro de Abreu, coordenadora geral do Laboratório de Monitoramento e Controle Ambiental em Transportes (Lamcat) da Universidade de Brasília (UNB), observa que o empreendedor precisa justitificar a viabilidade do projeto desde o planejamento até o programa de gestão ambiental. Ela explica que, quando as etapas preliminares não são feitas corretamente, a avaliação dos impactos ambientais fica prejudicada na sequência. A partir do diagnóstico, é possível identificar se a área melhorou ou piorou após a instalação do terminal.

Mariana, do Ibama, considera que a expansão do número de terminais privados no país deve aumentar a pressão sobre os processos de licenciamento ambiental. Essa demanda, motivada pelo fim da exigência de carga própria nesses terminais, reforçará a necessidade de contratações. A equipe que cuida dos processos de portos, aeroportos e hidrovias no Ibama possui apenas 20 técnicos, entre biólogos, engenheiros, oceanógrafos, geógrafos e sociólogos. A equipe é dividida em grupos por região ou tipo de empreendimento.

A  meta  da Coordenação de Portos, Aeroportos e Hidrovias do órgão (COPAH/Ibama) é contratar mais cinco profissionais até 2014. O perfil dos técnicos exige capacitação em modelagens, geoquímica, planos de emergência e atendimento a vazamento de óleo, planos de gerenciamento de riscos, biologia marinha, sistemas de informações geográficas e socioeconomia.

A carteira de empreendimentos do Ibama possui atualmente 1.557 processos, sendo aproximadamente 120 licenciamentos referentes a portos organizados, terminais portuários, estaleiros e dragagens. Em 2012, o Ibama emitiu mais de 50 licenças e autorizações, além de 275 documentos técnicos, que incluem pareceres, notas técnicas, relatórios e termos de referência. De janeiro a março de 2013, o órgão ambiental emitiu 19 licenças e autorizações.

Mariana enfatiza que existe um grande número de instrumentos legais envolvendo o setor portuário, como resoluções Conama, instruções normativas, leis e portarias. Além disso, ela conta que o Ibama recebeu 11 ações judiciais somente em março de 2013. Esses processos envolvem desde o licenciamento de cruzeiros em Fernando de Noronha até ações contra licenciamento de empreendimentos que sequer possuem licença prévia.

Ela explica que os estudos e Relatórios de Impacto Ambiental (Eia/Rima) são obrigatórios para os projetos mais potencialmente poluidores, enquanto, em alguns casos, o empreendedor entrega um estudo simplificado. Mariana esclarece que os estudos devem considerar análises complexas, impactos sobre ambientes sensíveis e a interação com atividades econômicas relevantes, como pesca e turismo.

A portaria 38/2013 da Secretaria de Portos (SEP) estabelece que os estudos preliminares contenham avaliação e descrição detalhada dos custos para viabilização do projeto do ponto vista socioambiental. São critérios para análise ambiental no estudo de viabilidade: planejamento, diagnóstico ambiental, avaliação dos impactos ambientais, área de influência, medidas mitigadoras e compensatórias, caracterização do empreendimento e programa de gestão ambiental e monitoramento.

Lucijane, da UNB, defende a compatibilidade dos programas ambientais com projetos de desenvolvimento do porto. Ela diz que os estudos ambientais devem englobar as atividades e características do empreendimento e que o empreendedor precisa delimitar a área de influência do empreendimento. “Às vezes, como no caso da Embraport, a área de influência é maior que a instalação”, observou Lucijane.

Ela diz que é recorrente a elaboração de estudos de viabilidade com diagnósticos simplificados e sem sugestões para resolução de problemas. Defende que o programa de gestão e monitoramento contenha os gastos com meio ambiente. “Se o empreendedor não inclui custos ambientais no estudo, parece que ele não tem intenção de gastar”, comentou.

Mesmo com a sanção de novas leis ambientais, a questão da competência de licenciamento persiste. Vianna, da CRT, observa que a MP-595 ratifica a inexistência de exclusividade federal no licenciamento dos portos. O advogado aponta que o artigo 11 utiliza a expressão “órgão licenciador”, não vinculando o licenciamento portuário ao Ibama. Vianna lembra que o artigo 21 da Constituição Federal estabelece que compete à União explorar a concessão ou permissão de portos marítimos, fluviais e lacustres.

Segundo a Constituição, as leis complementares, como a LC 140/2011, fixam normas para a cooperação entre a União e os estados, o Distrito Federal e os municípios. Pelo princípio jurídico da predominância do interesse, a competência para licenciar é da União quando as matérias e questões de predominância do interesse nacional. Os estados, segundo essa diretriz, seriam responsáveis por matérias de interesse predominantemente regional, enquanto os municípios devem absorver assuntos de interesse local.

Outro conflito envolve o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBIO), que tem causado entraves no licenciamento ambiental. Durante o 9º Ecobrasil, Vianna citou o caso de um cliente no Rio de Janeiro com atividade embargada devido à interferência do órgão.

O gerente de meio ambiente da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Marcos Maia Porto, lamenta que o licenciamento ainda seja um processo desgastante, em que alguns empreendedores conseguem cumprir com folga e outros com grande dificuldade. “Não dá para entender alguns conflitos entre órgãos estaduais e federais. Eles deviam ser consultados na medida em que têm interesses no licenciamento”, analisou Maia Porto, que também participou do Ecobrasil.

Para ele, o setor portuário vive um momento de amadurecimento e exercício das leis e políticas ambientais estruturadas de 1980 até 2010. Maia Porto destaca que a lei complementar 140/2011 aborda as relações institucionais no que tange a integração, cooperação e parcerias. Ele acredita que essas regras ajudarão a resolver situações que hoje não estão claras para o setor. O gerente de meio ambiente da Antaq também ressalta a necessidade de agilidade para atender ao pacote de licitações e autorizações para instalações portuárias previstas pelo governo federal.

Mariana, do Ibama, diz que o licenciamento ambiental pode ajudar o empreendedor a aperfeiçoar seu projeto. A primeira versão do Porto Sul, na Bahia, afetaria uma área de Mata Atlântica. A alternativa locacional entregue ao Ibama ficaria sete quilômetros afastada da área inicialmente prevista, mas traria impactos socioambientais e na linha de costa.

No entanto, a terceira versão do projeto prevê diminuição dos impactos relacionados à dragagem, além da redução do quebra-mar e do tempo de construção. Segundo Mariana, a versão mais recente projeta economia de R$ 850 milhões para o empreendedor. O custo original de R$ 3,6 bilhões caiu para R$ 2,75 bilhões.

Vianna, da CRT, lembra que o licenciamento ambiental costuma ser visto como um desafio para os empresários. “Porém, esse processo deve ser visto como um instrumento capaz de garantir ao empresário o reconhecimento público de que suas atividades estão sendo desenvolvidas em conformidade com a legislação ambiental”, analisa o advogado.



Yanmar

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