Lei dos Portos completa um ano sem superar velhos impasses e diminuir insegurança jurídica -- Um ano após a publicação do novo marco regulatório, o setor portuário ainda convive com impasses e insegurança jurídica atrapalhando os mais de R$ 50 bilhões de investimentos públicos e privados estimados até 2017. Apesar da autorização para novos terminais privados fora do porto público, a licitação das 29 áreas do primeiro bloco de arrendamentos em portos organizados, prevista inicialmente para 2013, corre o risco de não ocorrer em 2014, por conta de 19 questionamentos do Tribunal de Contas da União (TCU). O governo afirma que os projetos para o setor não estão parados, mas questões chave, como as envolvendo contratos e mão de obra, precisam de solução.
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A Secretaria de Portos (SEP) só poderá lançar os editais de arrendamentos em áreas de Santos e Belém após aprovação do pedido para reexame de quatro determinações do TCU, que aguardam manifestação do ministro Aroldo Cedraz, relator de recurso protocolado pela SEP no dia 30 de dezembro de 2013. No último dia 11 de junho, a ministra Ana Arraes, do TCU, considerou satisfatórias as respostas da secretaria para as demais 15 condicionantes impostas aos estudos para licitação desse primeiro entre quatro blocos previstos pelo governo.
A previsão da SEP é que, 30 dias após decisão favorável do tribunal, será possível licitar as primeiras áreas dentro dos portos organizados. “Se o tribunal tivesse liberado os estudos em abril, como era nossa expectativa, já teríamos lançado o edital”, afirmou o então ainda ministro da SEP, Antonio Henrique Silveira, em junho, durante apresentação na comissão de fiscalização financeira e controle da Câmara dos Deputados.
Em abril, o TCU também liberou a utilização dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental da Estruturadora Brasileira de Projetos (EBP) — uma empresa privada — para concessão das 159 áreas passíveis de serem arrendadas nesses quatro blocos. A autorização dada pela SEP havia sido questionada em dezembro de 2013 pelo deputado Augusto Coutinho (SDD-PE), alegando falta de concorrência, e havia se tornado outra pendência no tribunal.
O professor em Direito Regulatório e advogado do escritório Firmo, Sabino & Lessa Advogados, Rafael Véras, diz que a elaboração de estudos pela iniciativa privada tem previsão legal. Ele explica que o procedimento de manifestação de interesse é legítimo porque a administração precisa da expertise da iniciativa privada para elaborar os estudos. “O procedimento de manifestação de interesse não é por si só ilegal. Existe previsão na lei de concessões e na lei de parcerias público-privadas que permitem a elaboração dos estudos por outras empresas”, diz.
Dividido em quatro blocos, o programa de arrendamentos dessas 159 áreas totaliza investimentos de R$ 15,8 bilhões e projeta ganho de capacidade de 219 milhões de toneladas por ano. De acordo com a SEP, 117 das 159 áreas possuem contratos vencidos ou a vencer até 2017, enquanto as demais 42 são novas áreas. O bloco 2 compreende Paranaguá (PR), Aratu (BA), Salvador (BA) e São Sebastião (SP), enquanto o bloco 3 licitará áreas em Macapá (AP), Cabedelo (PB), Fortaleza (CE), Itaqui (MA), Maceió (AL), Recife (PE) e Suape (PE). O último bloco abrange áreas em Itaguaí (RJ), Rio de Janeiro (RJ), Niterói (RJ), Vitória (ES), Itajaí (SC), Imbituba (SC), São Francisco do Sul (SC), Porto Alegre (RS) e Rio Grande (RS).
O presidente da Associação Brasileira dos Terminais Portuários (ABTP), Wilen Manteli, ressalta que o programa foi questionado pelo TCU porque a lista de possíveis arrendamentos incluiu áreas com direito a prorrogação contratual em litígio. Além disso, foram encontrados erros de projeto, como a utilização de medidas aproximadas e sub ou supervalorização dos custos de projeto, com tarifas incompatíveis com o mercado.
O diretor da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) e da Merco Shipping Marítima, Aluisio Sobreira, enfatiza que os questionamentos do TCU foram determinantes para que os arrendamentos nos portos públicos não decolassem. “O jogo só começa quando a licitação é lançada. O governo ainda não conseguiu chegar nesse ponto”, analisa. Sobreira avalia que a política de arrendamentos em blocos não deu o resultado esperado e sugere a separação dos processos com litígio e a liberação daqueles que são menos complexos.
Véras, da Firmo, Sabino & Lessa Advogados, aponta a falta de planejamento como o principal problema do setor desde a publicação da nova lei dos portos. Ele aponta a ausência de uniformização dos estudos de viabilidade técnica (EVTEAs), assim como a inexistência de estudos concorrenciais intraportos durante a modelagem dos projetos. E acrescenta que não houve previsão para alterações nos estudos de demanda dos terminais. “Basicamente, o TCU suspendeu o processo para que os editais fossem reforçados no aspecto técnico”, analisa Véras.
O diretor da Notre Dame Consultoria e diretor do Departamento de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Elias Gedeon, lembra que existem mais de R$ 10 bilhões de investimentos privados em terminais represados por falta de definição de como se darão esses arrendamentos. “Como alguém que tenha um terminal com vencimento previsto para daqui a três ou cinco anos efetuará investimentos de milhões de dólares sem saber se depois obterá a prorrogação desses contratos?”, questiona.
Gedeon defende que os contratos em vigor com prazo de vencimento próximo sejam renovados em favor das operações portuárias e a normalização do fluxo do comércio externo. Ele acredita que existe apetite do mercado para corresponder à expectativa de investimentos do governo, desde que haja mais segurança jurídica. “Não interessa judicialização do processo de arrendamento de terminais. O mercado espera que os conflitos atuais sejam resolvidos o mais rápido possível”, afirma.
A SEP alega que, apesar de o programa de arrendamentos portuários ter sido anunciado durante a tramitação da MP-595, a efetiva implementação só ocorreu em meados de 2013, com a aprovação da Lei 12.815. Desde o lançamento do Programa de Investimento em Logística (PIL-Portos), em dezembro de 2012, já se passaram 18 meses sem que o bloco I fosse licitado. Silveira menciona a construção da BR 050 (GO/MG), destacando que desde o lançamento do edital até a licitação passaram-se 14 meses. No caso dos aeroportos do Galeão (RJ) e de Confins (MG), o certame ocorreu num prazo de 11 meses.
Silveira defende que o programa evitará um processo de "favelização dos portos", referindo-se a contratos com áreas pequenas que não permitem ganhos de escala e convivência entre terminais de distintas finalidades. "O que se procurou fazer ao trazer o desenho dessa iniciativa para o âmbito centralizado foi dar um freio de arrumação, buscando planejamento sistêmico, política de longo prazo, reorganização das áreas portuárias, economia de escala e fomento da concorrência”, disse Silveira.
Os empresários, porém, alegam que riscos como taxas de câmbio e aumento da tributação serão responsabilidade do arrendatário, desequilibrando os contratos a favor do poder público. “A alocação desses riscos foi questionada pelos investidores nas audiências públicas e não foi alterada. Essa postura intervencionista do Estado no domínio econômico vem incomodando os empresários e emperrando os investimentos no país em infraestrutura”, avalia Véras.
O advogado acrescenta que existem partes do novo marco cujos regimes de transição ainda não foram disciplinados. Um exemplo é a situação dos terminais privados que já operavam dentro do porto organizado e que, pela nova lei, poderão continuar a existir. Véras alerta que, até o momento, não foi estipulado um regime de transição para esses terminais, cuja situação jurídica permanece indefinida.
Ele lembra que a lei 12.815/13 só admite terminais privados fora do porto organizado. “Não se sabe como será a questão regulatória desses terminais e se eles devem ser submetidos à licitação. Há uma grande indefinição no regime de transição do marco regulatório ainda não regulamentado pela Antaq”, identifica Véras.
A maior vitória dos investidores privados na lei 12.815/13 foi o fim da distinção entre carga própria e carga de terceiros, estabelecida pelo decreto 6.620/2008 e que limitava a movimentação nos terminais de uso privado (TUPs). O setor empresarial destaca que as regras atuais permitem fomentar investimentos nos terminais privados e a concorrência com terminais arrendados. Para Silveira, da SEP, o fim dessa distinção entre cargas para operação em terminais privados trouxe segurança jurídica para o setor.
Em contrapartida, a questão trabalhista permanece sendo um dos maiores impasses do setor. Os terminais privados dentro do porto organizado vivem indefinição jurídica em relação à contratação da mão de obra. Para a maioria dos empresários, não ficou claro como ficará o regime de mão de obra dos terminais, gerando dúvida se eles devem ou não contratar via órgão gestor de mão de obra (Ogmo).
O presidente da Comissão Portos, Edmundo Mercer, afirma que a Lei 12.815/13 se afastou das regras da convenção 137 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). Para o executivo, no aspecto trabalhista houve um retrocesso para o setor porque favorece apenas os sindicatos. “O investidor privado tem preocupação com a falta de segurança jurídica. É preciso ter regras básicas definidas. Ao critério do poder concedente, ficamos perdidos”, diz Mercer.
Pela lei, os terminais nos portos públicos não podem contratar o trabalhador diretamente no mercado, somente por intermédio do Ogmo. Além disso, a lei não cancela mais o registro do trabalhador portuário avulso (TPA) aposentado, que só perde o cadastro no Ogmo em caso de falecimento. Mercer aponta o risco de o Ogmo escalar trabalhadores que não estão mais aptos para o serviço.
O setor empresarial também alega que as regras aumentam o custo para os operadores e diminuem a possibilidade de ascensão profissional dos novos trabalhadores, além de impedir o enxugamento do contingente. O presidente da Comissão Portos defende ainda que o setor precisa de mais profissionais qualificados, para os portos se tornarem eficientes. “Se estamos com porto ineficiente, estamos encarecendo nossa mercadoria e o nosso produto vai sair caro lá fora”, observa Mercer.
Manteli, da ABTP, diz que os Ogmos foram inspirados em modelos de portos europeus e aponta que a má gestão é a causa dos problemas na maioria deles. O presidente da entidade ressalta que o Ogmo ajudou o setor a quebrar o monopólio dos sindicatos. “O Ogmo é um bom instrumento, se bem administrado. Equivale ao Departamento de Recursos Humanos do porto. Precisa de profissionais especializados para gerir. Isso não aconteceu”, analisa.
A ABTP propõe que as categorias sejam unificadas e defende mais liberdade para os terminais contratarem. Manteli afirma que, na época que precedeu a promulgação da lei 8.630/93, o setor empresarial se concentrou mais na privatização dos terminais e a questão trabalhista foi deixada de lado. Segundo ele, o mesmo aconteceu antes da publicação da lei 12.815.
Manteli lamenta que o setor empresarial não tenha se envolvido como deveria para a elaboração da nova lei. Ele diz que, na época da tramitação da MP-595, os empresários atuaram de forma fragmentada. Para correr atrás do prejuízo da nova lei, empresários podem repetir estratégia semelhante à usada no início da década de 1990, que culminou na 8.630/93. A ideia é interagir com entidades que representam terminais privados, terminais arrendados, armadores e usuários para pedir melhorias efetivas.
Ele adianta que o setor vai cobrar descentralização das decisões hoje concentrados em Brasília, liberdade de investir e liberdade de ampliar. “A 8.630 era uma lei autoaplicável, não precisava de nenhum regulamento. Lá estavam as condições, parâmetros e critérios. O governo precisa fazer cumprir a lei. Qualquer dificuldade que aparece, vamos fazer uma nova lei? Aí não avançamos”, questiona Manteli.
O diretor-presidente da ABTP diz que o setor precisa tomar coragem de discutir temas complexos como taxa interna de retorno e privatização das companhias docas. "Estamos numa fase de catalisar as entidades. Temos esperança, mas precisamos saber o que é necessário fazer nesse país para melhorar o sistema porque nós não sabemos. Sem enfrentar isso, não vamos resolver”, afirma Manteli.
A centralização das decisões na SEP é uma das principais críticas à nova lei. O novo modelo atribui à pasta a função de realizar o macroplanejamento do setor e o papel de poder concedente. A Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) é responsável pela fiscalização e regulação, além de braço operacional da secretaria nos processos de arrendamento. Já as autoridades portuárias têm papel no planejamento local, por meio da elaboração dos planos de zoneamento (PDZs) e masterplans, além do desenvolvimento da gestão portuária e melhoria do ambiente de gestão.
Na vigência da Lei 8.630, as autoridades portuárias eram o centro do sistema e tinham interação com poder concedente. Nesse período, as companhias docas eram essencialmente as signatárias e guardiãs dos contratos, além de responsáveis pelo planejamento e administração dos portos brasileiros, sendo objeto de regulação e fiscalização. Silveira diz que a retomada do planejamento do setor portuário trouxe responsabilidade à SEP sobre macro-organização dos portos e terminais, interagindo mais clara e especificamente com autoridades portuárias e Antaq.
Silveira diz que a Lei 8.630/93 contribuiu para trazer a iniciativa privada para o setor, com novos mecanismos de gestão, permitindo o crescimento da movimentação de carga baseado nas atividades e na estrutura existente na época. Ele ressalta que os problemas começaram a surgir quando foi necessário expandir essa capacidade existente. Segundo Silveira, a partir de 2002, houve dificuldade para ampliação da infraestrutura e os gargalos ficaram mais em evidência.
Para Véras, a transferência de competências da Antaq para a SEP centralizou as decisões num órgão de governo, em detrimento de um órgão técnico, que é a Antaq. O advogado entende que o empresário acostumado a lidar com a agência reguladora com regime jurídico especial pode ter dificuldades para lidar com órgão mais “político”.
Ele acredita que essa mudança foi ruim para o setor e para própria regulação do Brasil, esvaziando a agência reguladora, concentrando os poderes nas mãos dos ministérios e, consequentemente, afastando os investimentos. “Desde a década de 1990, o investidor veio ao Brasil para trabalhar com agências reguladoras. Na medida em que as agências perdem poder, isso afasta os investimentos”, analisa Véras.
O diretor-geral da Antaq, Mario Povia, conta que a agência passa por revisão do planejamento estratégico e regimento interno para balancear as novas atribuições em sua estrutura. "Não será possível para a agência acompanhar a regulação desses arrendamentos estando longe dos portos. Aprovamos a criação de 13 postos avançados. A Antaq irá, enfim, ocupar instalações dentro dos portos organizados para melhor fazer esse acompanhamento”, adianta Povia, também presente à audiência na Câmara.
Na ocasião, ele acrescentou que o concurso público incrementará em 40% o quadro da Antaq, ajudando a atender às novas competências da agência. "No novo marco legal, o setor portuário foi visto de uma forma holística, como elo na logística nacional, com uma visão de planejamento não só no âmbito intraporto, mas em todo o complexo logístico", disse Povia.
Além do programa de arrendamentos portuários, o PIL possui outras duas linhas de ação: autorizações de terminais de uso privado e processos de reequilíbrios de arrendamentos existentes e contratos pós-8.630. De julho de 2013 a maio de 2014, foram feitos 58 anúncios públicos referentes a 87 projetos de TUPs, que totalizam R$ 17,2 bilhões em investimentos.
Entre dezembro de 2013 e o início de junho, foram assinados 20 novos contratos e dois termos aditivos de ampliação, totalizando outros R$ 9 bilhões de investimentos previstos. De acordo com a SEP, 151 instalações portuárias no Brasil possuem autorização, sendo 139 TUPs, 13 estações de transbordo de carga e uma instalação portuária de turismo.
Silveira conta que existem 42 processos de autorização em análise (28 TUPs, 13 estações de transbordo e uma instalação de turismo), perfazendo total de R$ 5,2 bilhões, que estão factíveis de serem aprovado até final de 2014. "Não é correto dizer que os investimentos no setor portuário estão parados. Existe uma série de vetores de investimentos em particular os TUPs andando a pleno vapor e que corresponde ao aumento substancial de capacidade. A capacidade que se ganha com essas ações é comparável ao porto de Santos", afirma Silveira.
No caso de ampliações, o Decreto 8.033, que regulamenta a lei dos portos, estipulou limite de 25% para ampliação dos terminais privados. Véras explica que o limite de 25% previsto na lei das licitações (8.666/1993) não se aplica a terminais privados. “Isso prejudicou os investimentos. Quem já tinha terminal privado e gostaria de renovar, tinha que limitar a 25%. Isso não estava no fluxo inicial do operador. Esse limite pegou o setor de surpresa”, afirma Véras.
Gedeon, da Notre Dame Consultoria, lembra que surgiram muitas questões relacionadas à concorrência desigual entre os terminais fora do porto organizado e aqueles dentro do porto público e as assimetrias regulatórias. Um dos impasses é que os TUPs podem ampliar a área em 25% e, acima disso, dependem de licitação da Antaq. Já os terminais dentro do porto organizado não podem ampliar suas áreas sem passar por outro processo licitatório. Outra questão é que os terminais dentro do porto organizado necessitam de licitação, enquanto os TUPs precisam de uma autorização da Antaq.
Os TUPs podem prorrogar seus contratos sucessivamente a cada período de 25 anos e sem reversão de bens ao poder concedente ao final do período. Já os terminais arrendados vão prorrogar seus contratos por uma única vez e, ao final do período, haverá reversão dos ativos à União. “Tudo muda dependendo do lado da poligonal que o seu projeto está incluído”, diz Gedeon.
Com a nova lei, a delimitação da poligonal passa a ter cada vez mais influência nas regras de operação. No caso dos privados dentro do porto organizado, que não possuem regime jurídico definido, o limite será o limite do porto organizado. Os agentes temem pela vulnerabilidade das regras, permitindo a redução ou ampliação da poligonal do porto para modificar o regime jurídico.
Se um porto público amplia a poligonal e passa a englobar um terminal privado que estava fora dessa delimitação, esse terminal, em tese, teria que se transformar em arrendamento porque a lei não permite novos terminais privados dentro do porto organizado. “Se dentro só pode ter arrendamento e fora só pode ter terminal privado, essa assimetria regulatória será baseada pela modificação da poligonal do porto organizado. Ela não pode servir para ‘publicizar’ atividades privadas. Não se deve utilizar mudança na poligonal do porto para modificar regime jurídico”, analisa Véras.
O litígio de contratos anteriores à Lei 8.630/93 ainda é motivo de dor de cabeça para parte dos associados da ABTP e segue alimentando o risco de judicialização. Nas audiências públicas houve muita discussão por conta da licitação de áreas que ainda estavam com contrato de arrendamento em vigor e os respectivos arrendatários prometiam entrar na Justiça para tentar prorrogar os contratos.
A ABTP defende que os novos arrendamentos tenham direito a contrato de 25 anos, prorrogáveis por igual período automaticamente, se o contrato estiver sendo cumprido e se a empresa estiver executando um programa de investimentos. Entretanto, o Decreto 8.033 deixa em aberto quando diz 25 anos, renováveis “a critério do poder concedente”.
Silveira admite a possibilidade de arrendatários com contratos vencidos ou a vencer entrarem com recurso contra as licitações. “Principalmente em Santos, existe uma série de áreas já operadas por arrendatários com contratos vencidos ou a vencer que, eventualmente, podem sentir-se desconfortáveis com o projeto do governo que está pronto para ser licitado, assim que o tribunal der o sinal verde", afirmou Silveira, da SEP.
O governo entende que os contratos anteriores à Lei 8.630/93 não devem ser prorrogados, enquanto os posteriores ao antigo marco são passíveis de discussão. "Aqueles contratos prévios à Lei 8.630 não têm um condão de prorrogação. Por outro lado, no caso dos contratos pós 8.630 que tenham previsão de prorrogação abre-se espaço para discussão de programas de investimento e, eventualmente, até mesmo a antecipação da prorrogação para trazer impactos positivos no investimento portuário", diz Silveira.
Atualmente, existem na Antaq pedidos de reequilíbrio com ou sem pedidos de prorrogação antecipada na ordem de R$ 8,3 bilhões. Caso aprovados, os pedidos permitirão a modernização de terminais existentes. Silveira diz que os investimentos aprovados serão executados em, no máximo, três anos. “Esse é um trabalho grande que envolveu desenvolvimento de modelo regulatório para reequilíbrio com prorrogação antecipada. Esse modelo já foi testado nas áreas técnicas do Tribunal de Contas e já foram feitas considerações. Estamos na reta final dos primeiros pedidos”, adianta Silveira.
Ele destaca a eliminação de custos como fim da outorga como critério de licitação. No entanto, as garantias são motivo de preocupação. A Resolução 3.290 da Antaq estabelece as condições de garantia de proposta e garantia de contrato.
Véras diz que essas garantias são instrumentos de serviço público que não se aplicam a atividades privadas reguladas. Ele defende que essas garantias violariam a simetria regulatória do setor portuário porque está sendo regulando uma atividade privada, e não um serviço público. Diferente do arrendamento portuário, onde existe a prestação do serviço público. “Ali você pode exigir as garantias, para os terminais privados, não. As diferenças vão existir: um presta serviço público e o outro presta atividade econômica regulada. O que viola a Constituição é equiparar erradamente os agentes”, analisa.
O advogado explica que o prestador de serviço público tem deveres de universalidade, modicidade tarifária e presta um serviço de titularidade própria, ao passo que os terminais privados, que prestam atividade econômica regulada, precisam ter regime jurídico mais brando. Mas, como essa atividade é de interesse público, é regulada pela Antaq.
Em um ano da Lei 12.815/2013, o objetivo de destrancar investimentos e atrair novos aportes para o setor privado não aconteceu e aumentaram as dúvidas dos players. Os investidores privados cobram o cumprimento da lei e dos contratos, aperfeiçoamento da lei de licitações (8.666/1993), descentralização da administração portuária e o fim das sobreposições normativas e de fiscalização dos diversos órgãos estatais.
A demora nos projetos contribuiu para o Brasil chegar à 131ª posição num ranking (2013-2014) do Fórum Econômico Mundial sobre a qualidade de infraestrutura portuária, com participação de 148 países analisados. “Toda mudança de marco regulatório gera traumas na economia privada e na insegurança jurídica”, afirma Véras.
Sobreira, da AEB e Mercoshipping, diz que a nova lei dos portos criou um hiato ao centralizar o poder no governo federal. Ele observa que os processos que estavam esperando a nova legislação começaram a ser liberados, mas os investimentos devem ser mais lentos do que o governo imaginava.