Dez dias antes do incêndio na Ultracargo, em Santos, houve um vazamento de aproximadamente 400 mil litros de gasolina no terminal por uma suposta falha na operação, segundo o Sindicato dos Trabalhadores no Comércio de Minérios Derivados de Petróleo e Combustíveis de Santos e Região (Sindminérios). A ocorrência foi no dia 23 de março, conforme denúncia de funcionários da Ultracargo feita ao sindicato.
A associação pediu esclarecimentos à empresa, o que aconteceria em uma reunião marcada para o dia 7 de abril, mas que não ocorreu devido ao incêndio iniciado no dia 2 e debelado na última sexta-feira. Procurada pelo Valor, a Ultracargo não se manifestou sobre o vazamento.
"A informação era que teria havido uma falha em uma operação interna. Não havia como remanejar esse volume sem colocar em risco os funcionários. O produto ficou retido num espaço e depois conseguiram colocá-lo em outro recipiente", explica o presidente do Sindminérios, Adilson Lima. Em entrevista ao Valor, ele não estabeleceu relação direta entre o episódio e o incêndio. Mas afirmou que vazamentos dessa proporção são incomuns, o que pode indicar que algo já estava errado no terminal.
As primeiras explosões no dia 2 destruíram dois sistemas de segurança - o de transferência interna de combustível para outros tanques pelo acionamento de válvulas e o resfriamento dos reservatórios dentro do terminal. "Ficamos só com o combate externo, o que geralmente não ocorre", disse o comandante do Corpo de Bombeiros, Marco Aurélio Pinto.
A causa do incêndio é foco da investigação aberta pela Polícia Civil. O terminal está com todas as autorizações em dia: licença da Cetesb, auto de vistoria do Corpo de Bombeiros e alvará da Prefeitura. Mas o prefeito de Santos, Paulo Alexandre Barbosa (PSDB), afirmou que "a proporção do incêndio não nos dá confiabilidade na operação".
Nesta segunda-feira começam as perícias do Ministério Público Estadual (MPE) para, entre outros, cotejar o que está nas normas de segurança com a realidade do terminal. O órgão deu dez dias - contados a partir do recebimento do ofício pela Ultracargo - para a empresa explicar a origem do fogo.
Os ministérios públicos Estadual e Federal instauraram inquérito civil para apurar os danos ambientais e definir as reparações possíveis. Pelo menos sete toneladas de peixes morreram e houve muita emissão de fumaça preta.
Para especialistas, uma série de fatores pode ter concorrido tanto para o início do fogo como para a dificuldade em combatê-lo. "Esses tanques deveriam ter um sistema de segurança para evitar incêndios dessa magnitude. Existe um sistema de válvula que permite a retirada do produto e a transferência para outros tanques, e isso não teria funcionado. O terminal tem brigada de incêndio, mas quando os bombeiros chegaram, o fogo já estava fora de controle", afirmou o promotor de Urbanismo e Meio Ambiente de Santos, Daury de Paula Júnior, em reportagem publicada no jornal Valor na semana passada.
O Sindminérios aponta que recentes cortes de pessoal na Ultracargo podem ter afetado a equipe de brigadistas próprios da empresa. Até junho de 2012 havia 190 trabalhadores no terminal; atualmente são 141. As demissões, diz Lima, foram mais acentuadas na equipe operacional. "Nesses terminais, todos os funcionários da operação são brigadistas. Se você corta esses funcionários, reduz o número de brigadistas".
A Ultracargo disse que conduziu em parceria com o Sindminérios - Santos uma reorganização de suas equipes em 2012 "para se adequar a uma redução da demanda e para reorganizar seus turnos de trabalho. Todo o processo foi acompanhado e validado formalmente pelo Sindicato", diz a nota.
Para o Corpo de Bombeiros, o incêndio demandará uma revisão completa de todos os planos de segurança. "Tudo, desde a elaboração do projeto, do tipo de combustível que pode ter, de que forma as brigadas [vão atuar], equipamentos, a estrutura do país para tudo isso", listou o comandante Pinto.
Ele comparou a complexidade da ocorrência aos incêndios nos edifícios Andraus e Joelma, ambos na década de 70 - nesses, houve mortos, o que não aconteceu no da Ultracargo. Depois desses episódios, foram alterados os planos de combate.
Fonte: Valor Econômico/Fernanda Pires | De Santos
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