Assumimos a diretoria da Autoridade Portuária de Santos conscientes dos enormes desafios que temos pela frente. A missão a que nos propomos é realizar uma administração moderna e inovadora visando prover, com eficiência, as infraestruturas de acessos terrestre e marítimo que permitam à carga transitar ou permanecer temporariamente no Porto de Santos de forma ágil, combinando preço justo e competitividade.
Não menos relevante é o papel que o complexo portuário exerce para o desenvolvimento e qualidade de vida das pessoas. Assim, o debate sobre a destinação dos armazéns 1 a 8, na extensão do cais entre o Valongo e o Paquetá, é legítimo e, sobretudo, inescapável. Mas é necessário estabelecer uma discussão técnica e desapaixonada sobre o uso dessa ampla área, tantas vezes debatida com vários segmentos da sociedade.
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O trecho que se estende entre os armazéns 1 ao 8 abrange um corredor de escoamento rodoferroviário que é rota exclusiva de quase toda a movimentação da Margem Direita do Porto. E está estrangulado pelo perímetro urbano. O Plano de Desenvolvimento e Zoneamento (PDZ) do Porto de Santos, vigente desde 2006, grava aquela zona para revitalização portuária urbana, contemplando terminal para cruzeiros marítimos e atividades culturais e de lazer.
No passado, duas empresas apresentaram projetos de terminal para cruzeiros, ambos considerando uma passagem subterrânea para segregar o fluxo intenso de cargas, o chamado “mergulhão”. Com o trânsito pesado “enterrado”, haveria oportunidade para negócios de turismo e lazer. Contudo, esse arranjo não se mostrou economicamente viável, pois a obra do mergulhão, imprescindível para o empreendimento sair do papel, custaria aproximadamente R$ 1 bilhão aos cofres públicos. A Prefeitura de Santos contratou estudo para ocupação daquela área e sugeriu uma passagem alternativa, de passarelas com esteiras rolantes, que não evoluiu.
Posto isso, há duas dimensões imperativas no debate sobre os armazéns: a viabilidade da atividade econômica a ser explorada ali e o papel do trecho na revitalização do Centro santista.
Em que pese o cais bastante frágil, trata-se do último espaço disponível na Margem Direita para atracação de navios em um porto por onde circula 30% da riqueza nacional, bate sucessivos recordes de movimentação e não dispõe de espaço para expansão no médio prazo. A ocupação da área continental para fins portuários é outra história, ainda a ser escrita.
Certo discurso de que a recuperação dos armazéns para fins turísticos e de lazer é uma antiga reivindicação da Cidade não deve prosperar como justificativa para encerrar a questão. Muito pelo contrário. É dever da Autoridade Portuária investigar o melhor uso econômico daquela área, sob pena de incorrer em crime de prevaricação. A companhia fará isso, levando em conta, evidentemente, o nível de proteção das instalações definido por órgãos do patrimônio cultural.
Neste momento, estamos atualizando o PDZ a partir das diretrizes apontadas no Plano Mestre, instrumento de macroplanejamento elaborado pelo governo federal que coteja capacidade e demanda nos portos. Definida a vocação daquela região, a atividade econômica ideal a ser explorada no Valongo-Paquetá será apontada por estudos de viabilidade econômica, técnica e ambiental. Nesse sentido, a Autoridade Portuária fará um chamamento público para receber da iniciativa privada propostas de utilização da área – e considerará apenas os negócios que parem de pé por si só.
A Autoridade Portuária deixa claro que não despenderá recursos públicos nessa empreitada. Gerir é fazer escolhas. A companhia tem um pesado passivo trabalhista, da ordem de R$ 700 milhões, e precisa resolver, no curto prazo, um deficit de R$ 1,6 bilhão do Portus, o fundo de pensão complementar dos trabalhadores na administração portuária. E não tem caixa suficiente para isso. É prioridade da Autoridade Portuária garantir a quem deu a vida por essa companhia o direito de receber na aposentadoria o que pagou ao longo de décadas.
O segundo ponto é que, na nossa visão, a revitalização do Centro não passa necessariamente pela criação de um complexo turístico e de lazer no Valongo. Instalar um conglomerado do tipo com tal intuito pode ter efeito estéril, pois a natureza do fluxo de pessoas de um empreendimento desse gênero é sazonal.
Por outro lado, acreditamos que há medidas com grande potencial de atrair movimentação perene. Entre elas, a criação de incentivos para empresas da cadeia logístico-portuária retornarem ao Centro e o apoio à criação de uma incubadora de startups voltada para aplicações portuárias. Desde já, a Autoridade Portuária se coloca como embaixadora da causa, aberta a examinar junto à Prefeitura, à Câmara de Vereadores, ao Ministério Público e à sociedade ações que estimulem a recuperação do Centro.
Acreditamos fortemente que a revitalização do Centro Histórico pode se estabelecer em conjunto com o desenvolvimento de projetos que contemplem a cadeia portuária. A premissa é que caminhem com planejamento e harmonia. E possam se consolidar como uma exemplar relação Porto-Cidade.
Fonte: A Tribuna