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Artigo - A produção preventiva de provas pelos aquaviários como importante instrumento de defesa jurídica

A produção preventiva de provas consiste na construção de elementos probatórios, físicos ou digitais, em momento anterior à ocorrência do fato ou acidente da navegação. Tem como finalidade provar o fato ou a circunstância de fato apresentado em sua defesa junto à Capitania dos Portos, quando da defesa prévia ou do depoimento pessoal, ou perante o Tribunal Marítimo, na condição de testemunha ou representado.

A prática forense perante o Tribunal Marítimo revela a dificuldade dos representados, do órgão acusador e do órgão julgador de reconstituir o fato ou acidente da navegação a partir de dados coletados antes e durante o fato ou acidente da navegação.


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Normalmente, o que se verifica é que a produção de provas somente tem início efetivo após a ocorrência do fato ou acidente da navegação, momento no qual são ouvidos os envolvidos (prova testemunhal), coletados vestígios no local dos fatos e na embarcação (prova pericial) e análise de documentos (prova documental).

Isso porque ainda não foi dada a devida relevância à produção preventiva de provas, em especial por meio da utilização de ferramentas, físicas e digitais, disponíveis ao Aquaviário como fontes de prova, capazes de servir direta ou indiretamente à comprovação da verdade que se procura no processo.

Em diversos casos apreciados pelo Tribunal Marítimo, a produção preventiva de provas pelo Aquaviário seria capaz de confrontar e afastar a narrativa apresentada pelo órgão acusador, na maioria das vezes obtida, quase que exclusivamente, por meio de provas testemunhais.

Portanto, o que se pretende com a produção preventiva de provas é deslocar o atual estágio de confronto de narrativas, obtidas por meio de depoimentos de testemunhas, para uma verdadeira reconstituição do fato ou acidente a partir do registro, da coleta e da extração de dados de navegação antes e durante o ocorrido.

Com isso, em vez de examinar versões pessoais sobre o fato, que dificilmente traduzirão com a acurácia necessária os fatos tais como ocorreram, passa-se a analisar dados sobre a real dinâmica do acontecimento. Essa prática tem sido adotada com sucesso no exterior, sobretudo para a investigação de acidentes marítimos. A título de exemplo, nos Estados Unidos, a National Transportation Safety Board (NTSB) coleta e analisa dados obtidos a partir de diferentes instrumentos (ECDIS/ARPA, IBNS,VDR, AIS, SMS, dentre outros) para subsidiar a elaboração de seu relatório final.

No Brasil, infelizmente, esse procedimento não é usual, sobretudo pelas dificuldades logísticas, financeiras e operacionais para a extração de tais dados da embarcação, seja pela Autoridade Marítima, seja por qualquer interessado. Alternativamente, propõe-se que sejam utilizadas as ferramentas à disposição do Aquaviário para a coleta antecipada de dados, que poderão, em caso de fato ou acidente da navegação, subsidiar sua defesa.

Por meio dos dados da embarcação (rumo, velocidade, deslocamento), do planejamento da derrota, das instruções transmitidas pelo Aquaviário e dos elementos externos à embarcação (condições de vento, de correnteza, de visibilidade, de tráfego), é possível reconstituir a dinâmica do ocorrido e a consciência situacional do Aquaviário com maior autenticidade.

Corroborando isso, a utilização de instrumentos eletrônicos e auxiliares na tomada de decisão como mecanismos de coleta de dados têm se revelado fundamental. Cita-se, como exemplo, o Portable Pilot Unit (PPU), sistema eletrônico comumente utilizado pelos Práticos durante a navegação e manobras de atracação e desatracação.

Na grande maioria dos softwares utilizados como Portable Pilot Unit (PPU), há a opção de gravar a navegação e as manobras da embarcação, inclusive com os dados coletados desta, o que permite substituir a extração dos dados de ECDIS, cujo procedimento varia conforme a embarcação, e auxilia na elaboração de teses defensivas em caso de representação perante o Tribunal Marítimo.

Ainda, a coleta de dados de voz, realizada pelo Voice Digital Recorder (VDR) da embarcação, cujo procedimento de extração também pode se revelar dificultoso, pode ser suficientemente substituído por qualquer outro instrumento de gravação idôneo, até mesmo de smartphones. Os dados de voz são extremamente importantes para se analisar as instruções transmitidas na ponte de comando, o que, sob o ponto de vista jurídico, permite a demonstração do cumprimento de um standard de comportamento pautado pela boa-fé do Aquaviário no exercício de sua profissão.

Em outras palavras, os dados de voz permitem comprovar que o Aquaviário atuou dentro das regras estabelecidas pela Autoridade Marítima, dos usos e costumes da navegação do local, dos preceitos da boa marinharia, enfim, dentro de tudo que era razoável e esperado de se exigir do Prático naquela situação. Consequentemente, afasta-se com maior facilidade os pressupostos da culpa náutica (negligência, imprudência e imperícia), ensejadoras da responsabilização administrativa-sancionadora do Prático perante o Tribunal Marítimo.

Diante de todo o exposto, é altamente recomendado que os Aquaviários utilizem de toda a tecnologia que têm à disposição, em especial, no momento anterior à ocorrência do fato ou acidente da navegação, para que se demonstre, com maior facilidade e robustez, o fato ou a circunstância de fato apresentado em sua defesa junto à Capitania dos Portos, quando da defesa prévia ou do depoimento pessoal, ou perante o Tribunal Marítimo, na condição de testemunha ou representado.

AutorAlexandre Lima de Oliveira é advogado pela UnB, pós-graduando pela PUC Rio, LL.M em Direito Civil e Processual Civil pela FGV - sócio do escritório Lima de Oliveira Advogados






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