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Artigo - Terminal Handling Charge - menos do mesmo

Com data de 20 de junho de 1996, a CIAF – Conferência Interamericana de Fretes (isso mesmo, uma Conferência de Armadores com imunidade antitruste, que determinava os fretes oceânicos mínimos) publicou o seguinte anúncio em jornais de grande circulação:

Conferência Interamericana de Fretes (Ciaf)
Aviso aos importadores e exportadores
A partir de 1 de julho de 1996, as linhas membro da Conferência Interamericana de Fretes abaixo relacionados assumirão a cobrança das taxas de Capatazias estipuladas pela Codesp (Cia. Docas do Estado de São Paulo) de acordo com os valores publicados nas suas tarifas.
Este novo procedimento, no qual os armadores passam a ser os agentes recolhedores das taxas de capatazias, certamente beneficiará os srs. exportadores e consignatários, contribuindo para uma maior agilização nas suas operações portuárias.
Rio de Janeiro, 20 de junho de 1996

Seguiam-se as assinaturas de nove empresas de navegação.

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MCI


Considero este anúncio como sendo a Certidão de Nascimento do THC (Terminal Handling Charge) no Brasil, embora o termo ainda não tivesse sido literalmente utilizado.

Para melhor entendimento, vamos então tentar contextualizar os fatos e ambiente político à época:

Em 1994 o presidente Carlos Menem havia privatizado o porto de Buenos Aires (as conhecidas Dársenas). Já existia o conceito e a cobrança do THC na Argentina, sendo que os armadores da Ciaf, por conta das rotas atenderem também esse porto, já praticavam a cobrança no país vizinho.

A movimentação de cargas nos portos brasileiros no ano de 1996 estava ligeiramente abaixo do ano anterior, sendo que as operações portuárias relativas à carga geral (produtos industrializados e geralmente mais nobres) caíram cerca de 4%, um pouco mais que os granéis. A movimentação de contêineres quando medida em unidades, também teve uma ligeira queda.

O Terminal 37 do Grupo Libra (privatizado no ano anterior), em 1996 já possuía índices de produtividade maiores do que o porto público, colocando pressão sobre a privatização de outros terminais. No ano seguinte, várias seriam as privatizações de terminais nos portos do Rio de Janeiro, Rio Grande e Santos.

A otimização da produção e a concorrência internacional exigiam cada vez mais eficiência e competitividade das empresas exportadoras, tornando-se imperativo o investimento na produtividade das operações portuárias. Estimava-se que a Logística, parte importante e significativa dos custos, poderia alcançar 23% do custo total de produção, e mais de 100% da margem de lucro.

Em se tratando de movimentação de contêineres, os portos brasileiros eram públicos (exceção feita ao Terminal da Libra), estavam sujeitos a restrições orçamentarias e tecnologicamente desatualizados. O ATP (Adicional de Tarifa Portuária) criado em 1988 para gerar recursos para investimentos em projetos portuários, estava na casa de 20% e não apresentava resultados satisfatórios. Era motivo de várias ações judiciais e seria extinto logo mais em outubro de 1996.

O porto de Santos, até então o maior em movimentação de contêineres no país, possuía uma estrutura tarifária complexa que datava de 1934, composta por 17 tabelas. Com a colaboração da Universidade de São Paulo, esta estrutura foi simplificada e reduzida para apenas cinco.

A nova tarifa da Codesp, após homologação pelo CAP — Conselho de Autoridade Portuária do Porto de Santos —
passaria a vigorar a partir de 1º de setembro de 1996, tomando por base também o tempo de utilização da infraestrutura portuária e produtividade, e não somente a tonelagem de carga movimentada. Dentro do novo conceito, os armadores passaram a ser os “naturais” contratantes dos operadores portuários, segundo eles.

Estava então criado o cenário para a implantação no Brasil do conceito já utilizado em outros países, e que viria a criar muita discussão até hoje, quase 30 anos após sua efetivação, o THC - Terminal Handling Charge.

Seguiram-se então vários comunicados publicados pelos armadores, justificando o novo conceito e utilizando literalmente, pela primeira vez, o termo THC/Capatazia.

Segundo estes esclarecimentos, os fretes oceânicos constantes das tarifas das Conferências, devidamente aprovados e arquivados juntos às autoridades brasileiras e estrangeiras, eram “Liner Terms”. Resumidamente, as despesas na exportação até a chegada da carga no costado do navio corriam por conta do exportador. Da mesma forma, na importação, as despesas do costado do navio até a saída da carga do Terminal Portuário seriam de responsabilidade do consignatário.

A partir de 1º de setembro de 1996, portanto, a Companhia Docas passaria a cobrar então do operador portuário a tarifa correspondente às Tabelas I a V, mais o ATP, o ISS e a mão de obra. O operador portuário repassaria ao armador as cobranças na forma do Box rate (cobrança por contêiner movimentado), e este último cobraria dos exportadores e consignatários a sua parte no Box Rate, o THC.

Pela natureza “Liner Terms” do contrato de transporte, o custo do içamento da carga do costado ao porão do navio, e sua estivagem a bordo (vice-versa na descarga), seria despesa do armador, inclusa no Box Rate pago ao terminal e cobrada do cliente no frete oceânico. Em resumo, o Box Rate cobrado pelo operador portuário seria então o THC mais o custo de movimentação da carga do costado ao porão do navio no embarque, e o reverso na descarga.

Não é difícil concluir então que o THC (cobrado do embarcador / consignatário) era menor que o Box Rate (cobrado do armador pelo operador portuário).

Além disso, “todas”, isso mesmo, “todas” as despesas “regulares” da carga antes cobradas pela Codesp, e a partir de então pelo operador portuário, estavam incluídas no THC.

Estas despesas cobriam a chegada do veículo no gate do terminal, todo o controle, seguros, conferência de documentação e lacre, descarga do contêiner do veículo, segregação, depósito na pilha pré-embarque, armazenagem durante o free time e posterior entrega no costado. A mesma lógica conceitual se aplicava na importação.

Posteriormente, seguiram-se distorções aos olhos da autoridade reguladora, agravadas por interpretações possivelmente equivocadas e resoluções não respeitadas, sendo que a família do THC cresceu com despesas e cobranças extras que, ou já estão, ou deveriam estar inclusas na cobrança do Terminal Handling Charge, segundo o conceito original.
Cada um tire, portanto, suas próprias conclusões sobre o que mudou de lá para cá, e o que estaria ou não incluído na cobrança do THC - Terminal Handling Charge, mas que existem atualmente muitas discussões equivocadas e cobranças difíceis de explicar, podem estar certos que existem.

Valter Branco é engenheiro, consultor, possui MBA em Comercio Exterior e Finanças Internacionais, tendo mais de 30 anos de experiência em navegação, comercio exterior e logística multimodal.



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