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O contêiner: como tornou o mundo menor e a economia mundial, maior

Suyene Inoue Barboza Coelho
• Marc Levinson é economista e historiador pela City University New York. Foi editor de economia e finanças da revista The Economist. Trabalhou como economista para o banco J.P. Morgan, e foi membro sênior para negócios internacionais no Conselho de Relações Exteriores do governo americano. Hoje Levinson escreve revisões de livros sobre economia e história econômica para o The Wall Street Journal. The Box foi selecionado para o prêmio de Livro do Ano pelo Financial Times / Goldman Sachs Business e foi homenageado com vários outros prêmios. Foi selecionado como um dos melhores livros de negócios de 2006 pela Business Week, e citado como um dos melhores livros de negócios do New York Times. Bill Gates o nomeou o melhor livro que ele leu em 2013.

A obra de Levinson se refere a uma análise histórica intensiva e descritiva sobre o contêiner. Mas por quê escrever sobre o contêiner? Afinal, o contêiner é, em sua essência, uma mera caixa metálica - objeto cotidiano de transporte de carga, e muitas vezes desinteressante na percepção da população em geral. E por isso o economista diz ter sido bem questionado na época, se a história do objeto utilitário seria de fato merecedora de uma pesquisa de cunho científico. Pois ao final de sua pesquisa, Levinson, em uma primeira instância, defende a tese de que foi o contêiner que primeiramente estimulou em larga escala, a velocidade da internacionalização do comércio. Explica também como a intervenção governamental encorajou (e reprimiu) o seu desenvolvimento. E em uma segunda instância, a importância da inovação é explorada densamente no livro: capital e mão-de-obra, fatores básicos de produção, acabaram perderam muito do seu fascínio para aqueles que se esforçavam em entender como as economias prosperam. O autor coloca que a questão chave atualmente não se trata do quanto de capital e mão-de-obra uma economia pode acumular, mas sim como a inovação ajuda a empregar estes recursos para produzir bens e serviços eficientemente.


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Em 1956, o carreteiro Malcom McLean desenvolveu sua ideia prática de transportar e transferir a carga da sua carreta diretamente para o navio. Curiosamente, o período da década de 50 foi marcado pelo boom científico e tecnológico mundial em consequência das políticas públicas para o fomento tecnológico do pós-guerra. Dentro deste cenário fértil da institucionalização do conhecimento científico, conhecido também como o Big Science, o contêiner surge como uma invenção não científica, de tecnologia extremamente simples e de embasamento empírico, mas que representou uma grande inovação de ruptura que transformou a economia mundial.

A realidade do comércio antes do contêiner, e da década de 50, era bem desafiadora. O embarque de mercadorias era extremamente lento e custoso: lento porque os carregamentos eram realizados por estivadores que manuseavam a carga individualmente do costado para o bordo do navio; e custoso por causa do enorme número de mão-de-obra empregado nos portos. O surgimento do contêiner foi, portanto, um novo mindset que rompeu este paradigma da forma como as mercadorias eram transportadas. O valor do utilitário não estava em como ele é, mas sim em como ele é usado. Dessa forma, uma série de esforços econômicos, sociais e políticos surgiram para adaptar a infraestrutura terrestre e marítima para o seu uso, o que tornou o comércio internacional muito mais barato e viável.

O livro de Levinson é dividido em quatorze capítulos. Cada capítulo retrata um tema sócio-político e econômico do cenário de inserção do contêiner. Destaco o Capítulo I, “The World the Box Made”; Capítulo IX, “Vietnam”; e Capítulo X, “Ports in a Storm”; como aqueles que mais se aproximam com as abordagens feitas em disciplinas sobre inovação, empreendedorismo privado e público.

No Capítulo I, “The World the Box Made”, Levinson narra a história de Malcolm McLean, um carreteiro cansado das longas esperas no costado do navio enquanto os estivadores manuseavam mercadorias individualmente da carreta para bordo. A logística de mercadorias era um processo lento e caro por causa dos muitos furtos e avarias consequentes da frequente manipulação dos bens. McLean percebeu a falta de visão sistêmica na logística das mercadorias, e passou a ver no contêiner uma solução tecnológica de unitização e transporte para resolver este problema. McLean desenvolve seus negócios do contêiner a partir desta perspectiva, e mais tarde torna-se um grande empresário proprietário de caminhões e navios. Ele então abre seu negócio, uma empresa chamada SeaLand, que passa a transportar contêineres da origem até seu destino final, seja via terrestre ou marítima, em seus navios. Apesar do contêiner ter originalmente surgido de uma experiência empírica, Levinson mais tarde descreve em seu livro, vários fatos que comprovam que o aperfeiçoamento da concepção do contêiner foi mais tarde desenvolvido por estudos e pesquisas. Portanto o contêiner, de objeto criado à partir das experiências práticas dos transportados, se modernizou a ponto de ser considerado como uma tecnologia de embasamento científico.

O Capítulo IX, “Vietnam”, retrata como a guerra no Vietnã representou um novo marco na história da navegação mercante. O Exército americano enfrentava uma situação onde necessitava de um volume gigantesco de suprimentos, alimentos, roupas, remédios, em um lugar extremamente carente de infraestrutura. McLean ganhou a concorrência para transportar suprimentos em contêineres, abastecer o Vietnã para o governo americano, e ainda construir a infraestrutura portuária necessária no pobre país da Ásia. McLean, no entanto, tinha um “problema”: retornava do Vietnã com seus navios vazios. Como não havia prejuízo, porque o valor do serviço pago pelo governo americano já cobria esta despesa, ele viu uma oportunidade de ganhos extras caso embarcasse mercadorias no Japão para transportar para os Estados Unidos na viagem de volta. Surge a partir daí, uma nova rota comercial Ásia-Estados Unidos, impulsionando todo um segmento industrial mundial: de indústrias exportadoras e importadoras, de construção naval para atender ao aumento das encomendas de navios, e de pesados investimentos governamentais em modernização portuária.

O Capítulo X, “Ports in a Storm”, retrata como os governos atuaram decisivamente para a modernização da infraestrutura portuária. Para os portos existentes antes do contêiner, absorver o tráfego de navios conteineiros não seria uma tarefa fácil e muito menos, barata. A maior parte destes portos era localizada em áreas urbanas, com pouco espaço para armazenar contêineres e sem o capital necessário para investir em novos equipamentos pórticos, por exemplo. Então enquanto crescia o tamanho dos navios e o comércio marítimo, o tráfego marítimo era limitado a um menor número de portos maiores. Portos e navios maiores significavam dragagem de canais, infraestrutura, aquisição de equipamentos e pórticos e etc. O escopo de investimento em infraestrutura portuária era de tal magnitude e complexidade que só o poder governamental poderia assumir. Levinson relata em detalhes como o Porto de Nova York foi desmobilizado da área urbana, tendo suas atividades transferidas para Nova Jersey, mais todos os imbróglios e percalços causados por protestos generalizados da estiva. A consequência de massivos investimentos públicos portuários para adaptação à nova realidade foi o surgimento de grandes portos modernos nos Estados Unidos, Reino Unido, Yokohama, Singapura e Hong Kong, durante a década de 70.

A inovação em si (o contêiner) não traz benefícios econômicos se não houver empreendedores como McLean, que descobrem maneiras de tornar a inovação realmente útil beneficiando todo um sistema. Levinson apresenta em sua obra o histórico cenário inusitado de inovação e empreendedorismo público e privado causado pela invenção do contêiner. Acredito que a narrativa rica em detalhes e dados apresentados na obra deveria ser de leitura obrigatória para acadêmicos e profissionais da área de logística marítima e portuária, que desejam aprofundar seus conhecimentos em história econômica e marítima.

Suyene Inoue Barboza Coelho, atualmente aluna do Mestrado em Estudos Marítimos do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Escola de Guerra Naval. Trabalhou como Shiplanner e como Analista Comercial do Sepetiba Tecon em Itaguaí. Atua profissionalmente como Analista de Logística da Itaguaí Construções Navais, empresa contratada pela Marinha do Brasil para a construção de quatro submarinos convencionais, da classe Scòrpene.






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