Empresas estrangeiras têm cem meses para pagar imposto sobre importação temporária de guindastes. Nacionais têm de recolher à vista >> Os acontecimentos recentes envolvendo corrupção e má administração – com reflexos na economia, namoral e na confiança do País – levam a população a questionar profundamente a ética nas relações comerciais entre a iniciativa privada e empresas estatais. O problema tem sido debatido em rodas de conversas, nas redes sociais e na mídia, pois a sociedade não suporta mais a improbidade sistêmica, uma cultura disseminada pela impunidade, que finalmente parece ter seu paradigma quebrado pela Operação Lava Jato.
Ante o grande foco da opinião pública na corrupção, outro aspecto relevante tem sido colocado relativamente à parte na discussão: a má administração nas empresas estatais, considerada mal menor diante dos escândalos, mas tão nociva ao Brasil quanto a corrupção.
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Alguns órgãos governamentais têm contribuído para perda de competitividade de setores produtivos, com leis excessivas e equivocadas, falta de fiscalização onde a fiscalização faz falta, impostos exagerados e políticas públicas precárias. A longo prazo, empresas quebram, setores fragilizam-se e o desemprego cresce.
Exemplo disso ocorre na importação temporária de equipamentos do setor de transportes especiais e içamento de cargas pesadas. A ausência de fiscalização sobre a origem das máquinas utilizadas em obras de infraestrutura – caminhões-guindaste e guindastes-esteira, dentre outras – abre brechas para a importação ilegal. Beneficiadas pela falta de fiscalização, empresas estrangeiras trazem as máquinas de seus países para atuar em obras em território brasileiro e podem declarar à aduana brasileira valor menor do que o real, burlando assim, o pagamento dos impostos e causando enormes distorções no mercado.
Anteriormente, a aduana usava laudos de avaliação, que comprovavam o valor real da máquina. Isso foi extinto pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior em 2011. Tramita, na Coana (Coordenação de Administração Aduaneira), há mais de três anos, proposta para aferir o valor dos equipamentos tendo por base a nota fiscal de compra.
Outro exemplo de má administração que impacta fortemente o setor de transportes especiais e içamento de cargas pesadas é a forma de recolhimento do imposto sobre a importação temporária. Segundo a legislação brasileira, a empresa estrangeira tem até cem meses de prazo para pagamento –correspondente a 1% ao mês – enquanto a empresa nacional tem de pagar à vista. Sobre esse tema, existe norma global estabelecida pela Convenção de Istambul relativa à Admissão Temporária, celebrada em 26 de junho de 1990, segundo a qual os impostos inerentes a essas operações devem ser pagos em até 20 meses, e não cem. Tal acordo, porém, não foi integralmente homologado no Brasil.
O setor de transportes especiais e içamento de cargas pesadas movimenta no Brasil cerca de R$ 3 bilhões ao ano (junho 2014 a junho 2015) e gera 28 mil empregos (janeiro a abril/ 2016). Os números referem-se a estimativas do SINDIPESA (Sindicato Nacional das Empresas de Transporte e Movimentação de Cargas Pesadas e Excepcionais), SINDILEQ (Sindicato dos Locadores de Equipamentos, Máquinas e Ferramentas de Minas Gerais) e SINDUSCON (Sindicato da Construção).
A forma de pagamento do imposto desigual e claramente benéfica às empresas estrangeiras dificulta aconcorrência das organizações brasileiras em nosso próprio país. Somada aos vícios da importação citados anteriormente, tem causado perdas de cerca de 50% dos negócios, numa concorrência desleal e predatória para o Brasil.
Constatamos, com pesar, aceleração na ociosidade das máquinas das empresas nacionais, com consequências diretas para a continuidade dos negócios e crescimento de desemprego. Desde 2014, foram reduzidos sete mil postos de trabalho no setor. Paralelamente, observamos que os resultados obtidos pelas empresas estrangeiras nesse ramo de negócios são totalmente retirados do Brasil e repatriados. Ou seja, há uma exploração sem qualquer retorno para o nosso país, inclusive na geração de empregos, pois as companhias trazem seus funcionários do país de origem. Também não há transferência de tecnologia ou qualquer avanço do parque industrial.
Finalmente, quando nossa economia entra em desaceleração, como ocorre hoje, as empresas estrangeiras simplesmente deixam de fazer negócios aqui, enquanto as organizações nacionais lutam para não demitir e continuar investindo. Em resumo, as concorrentes externas vêm, levam o sumo da jabuticaba e nos deixam a casca.
À grande reforma moral pela qual o Brasil está passando precisamos adicionar uma revisão administrativaque busque com urgência a eficiência. A carência de eficácia no setor público gera distorções graves, como as que afetam os negócios de um setor que busca, incessantemente, apoiar o Brasil em sua imensa demanda por infraestrutura.
José Henrique Bravo Alves é engenheiro eletricistae vice-presidente comercial da Locar Guindastes