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Transporte “limpo”: os desafios (e oportunidades) da descarbonização

A retomada da postura dos EUA em relação às questões climáticas e uma onda crescente de pressão popular, especialmente na Europa, vem chamando o setor marítimo a posicionar-se muito rapidamente na questão de reduzir ou até mesmo neutralizar suas emissões.

Em sua 3ª edição, o estudo dos GHG (gases de efeito estufa) realizado pela IMO (Organização Marítima Internacional) demonstrou que o transporte marítimo emite cerca de 940 milhões de toneladas de CO2 anualmente, portanto, algo em torno de 2,5% das emissões de GHG. E essas emissões podem aumentar significativamente caso medidas de mitigação não sejam implementadas rapidamente.

De acordo com esse estudo da IMO, as emissões do transporte marítimo poderiam, em um cenário “business-as-usual”, aumentar entre 50% e 250% até 2050, prejudicando os objetivos do Acordo de Paris.

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A estratégia inicial da IMO prevê uma redução das emissões de carbono do transporte marítimo em 40% até 2030 e 50% até 2050, comparado com às emissões de 2008. Contudo, entidades como BIMCO, CLIA, International Chamber of Shipping (ICS) e o World Shipping Council, que juntas somam 90% da frota marítima mundial, juntamente com outros grupos da indústria, enviaram recentemente uma proposta à IMO para antecipar a discussão a respeito das MBM´s – Market based measures, ou seja, medidas de descarbonização compatíveis com o mercado.

Nesse sentido Sadan Kaptanoglu, Presidente do BIMCO, diz: “Uma maneira de tornar as atuais tecnologias de baixa emissão competitivas com os combustíveis tradicionais é por meio de alguma forma de medida baseada no mercado. Precisamos de mecanismos que equalizem o custo entre o uso de combustíveis de baixo carbono e tradicionais combustíveis fósseis”.

Uma das propostas que está na mesa é a criação de um fundo a ser gerido por um comitê chamado IMRB (International Maritime Research and Development Board), no âmbito da IMO, e que pretende atingir o valor total de US$ 5 bi num prazo de 10 anos para pesquisa e desenvolvimento de combustíveis alternativos de baixo carbono. Esse fundo seria alimentado pela contribuição de US$ 2,00 por tonelada de combustível fóssil utilizado pelos navios.

Alguns armadores estão começando a utilizar o gás natural liquefeito (LNG), como a CMA CGM, que fez recentemente uma encomenda de 22 novos navios, dos quais 12 usando esse combustível. Seu uso, porém, recebeu uma recomendação negativa do Banco Mundial. Um amplo estudo sobre a transição para uma economia azul conduzido pela Diretoria Global de Meio Ambiente, Recursos Naturais e Economia Azul do Banco diz: “Recomenda-se abandonar o uso de combustíveis fósseis de bunker e voltar-se para combustíveis com zero carbono para reduzir e, em última instância, eliminar seu impacto climático”.

É preciso aqui esclarecer que a tão falada IMO2020 tratou apenas da redução das emissões de enxofre, ao demandar que a frota mundial a partir de 1º de janeiro de 2020 passasse a utilizar o óleo VLSFO ou instalasse “scrubbers” para “limpar” o IFO 380. As discussões atuais tratam, portanto, da redução/eliminação das emissões de carbono, visando frear o efeito estufa.
Em outro relatório intitulado “O Potencial dos Combustíveis de Carbono Zero em Países em Desenvolvimento”, o Banco Mundial identifica a amônia e o hidrogênio como os combustíveis mais promissores para o transporte marítimo atualmente e avalia que o Brasil, Índia, Maurício e Malásia seriam os países mais bem posicionados para aproveitar essa oportunidade de investimento.

O Brasil inclusive já está tomando seus passos para aproveitar essa oportunidade. O Governo do Ceará, Complexo do Pecém (CIPP S/A), Federação das Indústrias do Estado (Fiec) e Universidade Federal do Ceará (UFC) em parceria com a White Martins estão lançando o projeto “Hub de Hidrogênio Verde Pecém” para produzir o H2V. A meta é tornar o Ceará um fornecedor global de H2V, contribuindo com a redução dos níveis globais de Dióxido de Carbono (CO2). e que poderá ser utilizado no abastecimento de navios (saiba o que é H2V).

Segundo o Diretor Executivo da ABAC (Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem), comandante Luís Fernando Resano, contudo, “Um dos combustíveis alternativos em estágio mais avançado talvez seja o metanol”. E essa seria mais uma ótima oportunidade para o Brasil, dado sua agricultura altamente desenvolvida e competitiva.

O comandante Resano disse ainda que: “A armação nacional segue as regras da IMO, mais especificamente da MARPOL, da qual o Brasil é parte, e todas as alterações que são aplicáveis aos navios de longo curso são também aplicáveis aos navios brasileiros. Sempre que possível destacamos que é preciso analisar esse tema de forma abrangente, já que se as medidas para descarbonização dos navios aumentarem muito o custo operacional, no transporte de cargas nacionais isso poderia aumentar o uso do rodoviário, caso esse não seja igualmente chamado a adotar medidas de redução de emissões dos caminhões” e complementa: “Certamente novas encomendas de navios (quando ocorrerem e se houver interesse do Brasil em investir em navegação, pois o BR do Mar desestimula) deverão incorporar tecnologias já desenvolvidas. Não vejo a curto prazo a frota brasileira usando LNG e os outros combustíveis dependerão da logística do fornecimento. Temos um Grupo na ABAC que acompanha o assunto.”

Muitos armadores já estão se posicionando quanto a reduzir das emissões de carbono, antes dos prazos a serem definidos pelas autoridades e recomendações dos órgãos internacionais. O armador Höegh Autoliners, por exemplo, está lançando um “car carrier” para entrar em serviço ao final de 2023 emitindo carbono zero. O navio, da classe Aurora, terá capacidade para 9.100 CEU (car equivalente units).

Uma outra opção, que vem deixando de ser romântica e se tornando fato, é o uso do vento na propulsão de navios. Nesse quesito os franceses estão na liderança com a empresa Zéphyr & Borée que desenvolveu o navio Canopée, com 121m de comprimento, que deverá fazer o transporte dos foguetes Ariane da Europa para o seu local de lançamento na Guiana.
Outra empresa francesa, a Neoline, já tem contrato com a Renault e Michelin dentre outros para o transporte em navios movidos a vento. Pretendem lançar sua primeira rota transatlântica RoRo conectando St. Nazaire à Costa Leste dos EUA já em 2023.

Mas o mais ousado projeto é também da Zéphyr & Borée que está projetando um full container, com capacidade para 1.830 TEUs, equipado com oito velas-asa. Com um LOA de 185m poderá reduzir a pegada de carbono em 80%, navegando a uma velocidade de 11 nós.

Não só os armadores estão entrando “de cabeça” nesse processo de descarbonização, mas outros elos da cadeia logística estão igualmente percebendo se tratar de um caminho sem volta. O porto de Leixões, por exemplo, estabeleceu uma meta de atingir zero emissões até 2035, pretendendo ser o primeiro porto Europeu a atingir tal meta. Desse lado do mundo, o Canal do Panama inicia uma transição para se tornar carbono neutro até 2030. Diz seu administrador, Ricaurte Vásquez Morales: “Este processo terá como base nossos esforços de longa data para minimizar nosso impacto ambiental, incluindo encorajar os clientes a usar combustíveis limpos e reduzir sua pegada de carbono.”

No Brasil o Porto de Suape passou a integrar o seleto time dos que aderiram ao Environmental Ship Idex (ESI), um movimento global que estimula o uso de soluções que reduzam as emissões de carbono na atmosfera. Como incentivo aos donos de navios são oferecidos desconto nas tarifas portuárias que variam 10% a 60%.

O Reino Unido sediará de 1 a 12 de novembro de 2021 a 26ª Conferência sobre Mudança Climática da ONU (COP26). Espera-se que a cúpula da COP26 acelere as ações em direção aos objetivos do Acordo de Paris e da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Os desafios, e as oportunidades, para o transporte marítimo e todos os seus stakeholders certamente serão discutidos nesse evento.

RoRobert Grantham é sócio da Solve Shipping Intelligence

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



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