O governo interino de Michel Temer resolveu acionar o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) e anunciou ontem duas medidas para socorrer empresas em dificuldades econômico-financeiras. Um dos objetivos é dar fôlego às companhias para atravessar a crise atual. O governo tentar evitar também que outras empresas cheguem à mesma situação. As iniciativas vão envolver R$ 9 bilhões em operações de crédito, valores que podem até ser maiores se houver demanda das empresas.
Ontem, após se reunirem com Temer, o ministro interino do Planejamento, Dyogo Oliveira, e a presidente do BNDES, Maria Silvia Bastos Marques, divulgaram que o banco está criando uma linha de crédito com R$ 5 bilhões para ajudar empresas saudáveis na compra integral ou parcial de companhias que estão em recuperação judicial, extra-judicial ou falência. Maria Silvia considera o valor da linha relevante, mas o valor poderá ser revisto conforme a demanda.
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O diretor das áreas de crédito e financeira do BNDES, Cláudio Coutinho, negou que a nova linha vá transformar a instituição em um "hospital de empresas", como aconteceu no passado. "Não vamos dar dinheiro para ninguém em má situação [econômico-financeira]", afirmou. O objetivo do banco ao abrir a linha é para que empresas saudáveis possam comprar ativos de empresas em dificuldades, afirmou. Nessa categoria, podem estar companhias em recuperação judicial, extra-judicial ou falência. Ou empresas em crise, mas que ainda não pediram proteção à Justiça contra credores.
A linha deve estar disponível a partir de 1º de setembro, mas as operações indiretas, envolvendo agentes financeiros do BNDES, podem exigir mais tempo uma vez que os bancos vão precisar adaptar seus sistemas. As operações indiretas se darão nos casos em que as empresas em dificuldades estejam em recuperação judicial. Nesta nova modalidade de crédito, a taxa de juros será de mercado e o custo financeiro será equivalente ao crédito já preexistente do BNDES junto a empresa vendedora do ativo, limitado, nesta segunda hipótese, ao valor do referido crédito. A linha será válida até agosto de 2017.
A segunda medida de estímulo anunciada foi a elevação em R$ 2,3 bilhões do orçamento na linha de capital de giro chamada de Progeren, que terá custo financeiro menor. Os recursos para essa modalidade, que terá como foco principal as micro, pequenas e médias empresas com faturamento anual de até R$ 90 milhões, passou de R$ 7,7 bilhões para R$ 10 bilhões. Como já foram contratados R$ 6 bilhões, restam R$ 4 bilhões para contratação até 31 de dezembro de 2017. O prazo de financiamento é de cinco anos e a linha é feita em parceria com agentes financeiros. Segundo Maria Silvia, o custo total para o crédito para a micro e pequena cai de 10,2% para 9,5% ao ano. Para a média e grande empresa, recuou de 14,61% para 13,06% ao ano e para grande empresa de 17,11% para 16,61% ao ano.
O "socorro" para as empresas que estão com dificuldades financeiras ou de contratar crédito no mercado financeiro foi apresentado no mesmo dia do início da votação do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff no Senado Federal. Durante o anúncio, o ministro interino do Planejamento fez questão de dizer que os recursos das linhas de crédito são do BNDES e, portanto, não envolvem equalização das taxas de juros ou injeção de recursos do Tesouro Nacional.
"Tivemos reunião com presidente Temer e ele determinou o lançamento de duas iniciativas no BNDES. Uma linha visa à melhoria das condições de financiamento para capital de giro, e uma segunda é voltada para melhorar as condições de recuperação de empresas que estejam em dificuldade, especialmente em recuperação", explicou o ministro. O objetivo é garantir que tenham mais liquidez e consigam atravessar esse momento turbulento.
Mesmo sem falar diretamente sobre casos específicos a medida pode ajudar potenciais interessados em comprar empresa como a de telefonia Oi, que está em recuperação judicial. Maria Silvia frisou apenas que a nova linha é destinada a ajudar companhias que queiram adquirir uma empresa em dificuldade. "O crédito será para que uma empresa saudável compre parcialmente ou todo o ativo da empresa em recuperação judicial", explicou Maria Silvia. Ela salientou que no Brasil, apenas 1,1% das empresas saem desse processo num prazo de seis a dez anos. Nos países desenvolvidos, afirmou ela, chegam a 20% as empresas que se livram dessa condição no prazo de dois anos. "Temos um elevado número de empresas em recuperação judicial. Somente 1,1% tem saído da recuperação judicial. A linha entra onde o mercado não está atuando", disse Maria Silvia.
Para justificar a criação da nova linha de crédito, Maria Silvia reforçou que as empresas em recuperação judicial não têm acesso a empréstimos e criam muitos passivos, como os tributários. "Objetivo básico é a manutenção da atividade produtiva e dos empregos associados", disse Maria Silvia. "Neste caso, ganha a empresa para sair do processo de recuperação, [ganha] os potenciais compradores e ganha o país", emendou.
Cláudio Coutinho, diretor de crédito e finanças do BNDES, disse que a criação da linha de apoio às empresas em dificuldades não foi uma demanda do mercado. "Foi da observação da quantidade de recuperações judiciais no país." Ele disse que foram 923 recuperações judiciais só no primeiro semestre. "Queremos que esses ativos voltem de forma rápida ao mercado. Mas de forma alguma vamos financiar empresa em má situação."
O ministro interino do Planejamento aproveitou para defender a aprovação da Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 241, que limita o crescimento do gasto público. "Temos consciência da situação fiscal do país, que é muito grave. Procuramos salientar [na audiência pública da Câmara] a urgência, importancia e necessidade de que seja adotada medidas como as que estão sendo propostas na PEC do gasto", afirmou. Segundo ele, o país já dá sinais de retomada na economia e a expectativa é de recuperação mais forte em 2017.
Fonte: Valor Econômico/Edna Simão, Andrea Jubé e Francisco Góes | De Brasília e do Rio