A Vale tem um cenário de pagamento de dividendos desafiador para 2015 e para os próximos anos, caso o minério de ferro se mantenha, em um horizonte de longo prazo, no atual patamar de preços. Essa é a avaliação de analistas ouvidos pelo Valor a partir da confirmação feita pela mineradora, na segunda-feira, do pagamento de US$ 2,1 bilhões em dividendos, a ser efetuado em 31 de outubro. No entanto, embora tenham classificado a distribuição para este ano como "dentro do esperado", há dúvidas entre os analistas se a Vale vai se manter, a médio e longo prazos, como uma companhia que oferece dividendos adicionais a cada ano.
Em relatório, o BTG Pactual afirmou que o anúncio feito na segunda-feira era esperado uma vez que a Vale tinha delineado pagamento de US$ 4,2 bilhões em dividendos para 2014. No entanto, a grande questão, para o banco, são os dividendos para 2015. Isso porque, com o atual baixo patamar de preços do minério de ferro, a Vale ainda terá de lidar com um fluxo de caixa pouco flexível para o ano que vem. Uma das grandes apostas da companhia, o projeto S11D, na Serra Sul de Carajás (PA), só deve entrar em operação a partir do segundo semestre de 2016.
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Pedro Galdi, da SLW Corretora, disse que o anúncio dos dividendos foi dentro do esperado. "Não é habitual a Vale divulgar que vai distribuir dividendos e depois voltar atrás", afirmou. Mas, assim como o BTG Pactual, a dúvida é em relação ao pagamento de dividendos adicionais e aos dividendos dos próximos anos. "Diferentemente de outros anos, não acho certo agora dizer se a Vale vai pagar dividendos adicionais daqui por diante", afirmou.
Em comunicado, a Vale informou que a diretoria-executiva aprovou e vai submeter ao conselho de administração da companhia proposta de pagamento da segunda parcela de remuneração mínima aos acionistas em 2014, no montante de US$ 2,1 bilhões, conforme anunciado ao mercado em 30 de janeiro de 2014. Caso a proposta seja aprovada pelo conselho, computando-se a primeira parcela da remuneração mínima paga a partir do dia 30 de abril, a Vale terá distribuído a seus acionistas US$ 4,2 bilhões em 2014.
A Vale paga o mesmo valor para as ações ordinárias e preferenciais, conforme o estatuto social da companhia. De acordo com esse estatuto e com a lei vigente no Brasil, a empresa é obrigada a distribuir anualmente aos seus acionistas pelo menos 25% do lucro líquido na forma de dividendos, a menos que o conselho de administração informe durante a assembleia de acionistas que a distribuição não é aconselhável tendo em vista a situação financeira da empresa. Por lei, a Vale é obrigada a realizar a assembleia anual de acionistas até 30 de abril de cada ano na qual o dividendo anual é declarado.
A prática da Vale tem sido de pagar fortes dividendos, nos últimos anos, com base na geração de caixa, mesmo em períodos de alto investimento. Em 2013, o pagamento de dividendos foi de US$ 4,5 bilhões, abaixo dos US$ 6 bilhões de 2012, e também do recorde de US$ 9 bilhões de 2011. Apesar das dúvidas do mercado quanto ao pagamento de dividendos a partir de 2015, a Vale tem sido muito clara em dizer que pode ter flexibilidade adicional para pagar dividendos extras na medida em que se torna mais eficiente para investir, e reduzir custos de alavancagem.
Mas houve também quem considerou que a distribuição de dividendos de US$ 2,1 bilhões anunciada pela Vale, na segunda, pode ter surpreendido positivamente os investidores, dada a deterioração dos preços do minério de ferro. Foi o caso do Goldman Sachs. Segundo o banco, se o preço da commodity se estabilizar nos níveis atuais, o dividendo adicional esperado pode não se materializar. O modelo da casa de análise estima US$ 3 bilhões de dividendos para o segundo semestre, montante que poderia ser entregue sem aumento da dívida líquida, considerando a previsão de preço do minério de US$ 92 por tonelada.
As despesas da empresa com impostos devem ser limitadas no período, dado o crédito que a mineradora possui com o Refis, segundo o Goldman. Além disso, no terceiro trimestre, a companhia vai receber US$ 900 milhões pela venda de fatia da VLI Logística. "A gestão da Vale esteve focada em devolver valor aos acionistas e em manter pelo menos estável a distribuição de dividendos. A empresa já afirmou também que não aumentará a sua dívida para distribuir proventos. Com base nisso, achamos difícil manter a distribuição de US$ 4,2 bilhões em 2015, assumindo nossa previsão de Ebitda de US$ 14 bilhões, com o minério de ferro a US$ 80 a tonelada e US$ 11,7 bilhões de investimentos", diz o Goldman Sachs.
Os analistas do banco estimam a distribuição de US$ 3 bilhões, mas elevaram a estimativa de dívida líquida de US$ 24 bilhões para US$ 27,9 bilhões. Na visão do Goldman, a venda de ativos e o investimento menor poderiam permitir a distribuição de US$ 3 bilhões em 2015 e manter a dívida estável.
Fonte: Valor Econômico/Alessandra Saraiva, Francisco Góes e Daniela Meibak | Do Rio e de São Paulo