Passada a turbulência no mercado de ações, causada pela China, e com a possibilidade de um reajuste de preços, as ações das siderúrgicas dispararam na BM&FBovespa nos últimos dias. Apesar de representar um alívio ao setor, que já se encontrava muito desvalorizado na bolsa, o movimento pode ter vida curta.
Victor Penna, analista do BB Investimentos, opina que dificilmente o avanço dos papéis observado no mês seja sustentável para as empresas. Isso porque as notícias seguem negativas e a demanda não dá sinais de retomada. Rodolfo de Angele, do J.P. Morgan, diz que o menor pessimismo vem com a chance de aumento dos preços do aço, sustentando muito mais no câmbio.
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"Acho que o ponto mais importante para essa alta dos papéis é o possível reajuste. Depois, vemos o lado técnico, de posicionamento de investidores para aumentarem sua exposição ao setor", comentou Angele ao Valor. O lado técnico viria, em parte, com o fechamento de posições vendidas de investidores, que agora estariam correndo para obter os papéis e cobrirem suas posições. "Não há fundamentos da economia e demanda que sustentam essa alta", observa uma fonte.
Ontem, as ações preferenciais da Gerdau - primeira a anunciar aos clientes um reajuste em aços longos de 15% - tiveram leve recuo de 0,48%, para R$ 6,24. Mas desde quinta-feira já sobem 5,2%. No mês, o avanço é de 19%. A empresa também reajustou em 7% a 8% seus produtos laminados planos (tiras a quente), pois estava defasada em relação às concorrentes. Assim, equiparou os preços.
Os papéis PNA da Usiminas ganharam 0,8%, para R$ 3,76 - em setembro, a valorização chega a 26%. A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) viu seus ativos subirem 1,64%, para R$ 4,33 - salto de 24% no mês. Procuradas, não comentaram a intenção, ou não, de reajustar seus preços.
Segundo a fonte, ao nível atual do câmbio, no entanto, é possível pensar em reajuste de 5% para os aços planos - fabricados por Usiminas, CSN, Gerdau e ArcelorMittal. Mas alerta que é preciso disciplina da parte das siderúrgicas, que vêm travando uma briga de foice po clientes. Os prêmios do importado sobre o produto nacional já chegam a ser negativos.
Outro fator positivo do câmbio é que, ao subir e não apontar uma direção firme, o dólar ajuda a conter, mesmo que momentaneamente, a entrada de aço plano do exterior, pois importadores tornam-se mais cautelosos. Em agosto, conforme dados oficiais, ficou em 95 mil toneladas, 32% menor que as 140 mil toneladas de julho, e cerca da metade sobre agosto de 2014. Com isso, sobrou algum espaço para usinas locais.
Penna, do BB Investimentos, acrescenta que a maior propensão para tomar riscos por parte dos investidores também ajuda. "Há o fator internacional, com o afastamento dos temores com a China, que possibilita impulsionar as bolsas em todo o mundo", afirma.
Mas o cenário ainda é complicado, observa Angele. A demanda por aço, tanto de longos como de planos, não dá sinais de recuperação. E, para ele, as vendas teriam de subir entre dois e três meses, a um ritmo saudável, para que a confiança no setor fosse, de fato, retomada. Enquanto isso, as empresas apertam o cinto da maneira que podem, lembra, cortando custos e tentando vender ativos.
"O terceiro trimestre será chave e vai possibilitar ao mercado ter uma ideia mais clara de se vale a pena investir ou não, ainda mais se o reajuste de preço, de fato, já se refletir", comenta Penna.
"O mais importante para o setor é ver em qual momento vai se recuperar. Não dá para saber ainda se alcançamos mesmo o fundo do poço ou não", diz Angele. "Ainda não sabemos qual o novo volume normal de vendas no mercado interno, acho que não voltamos para os níveis de 2012, mas provavelmente a baixa está exagerada."
Para compensar a depressão do mercado interno, há empresa exportando até 40%. Mas a venda ao exterior tem uma margem bem inferior à obtida no país.
Fonte: Valor Econômico/Ivo Ribeiro e Renato Rostás | De São Paulo