Um navio carregado de terra cinzenta, arenosa, partiu do Alasca uma semana atrás rumo à China. Perdidas dentro dos detritos estavam pequenas lascas de ouro que a Corporação do Grupo Nacional de Ouro da China planeja extrair.
O embarque é um de muitos de material rico em minérios que viajam rumo aos portos chineses e formam uma parte importante, mas pouco notada, dos esforços para saciar a demanda do país por matérias-primas.
O ouro do Alasca não vai aparecer no relatório oficial das importações chinesas ou em dados comerciais das principais bolsas de commodities ou mercados de metais. As compras chinesas de sucata de cobre e seus investimentos em projetos de areias betuminosas no Canadá também estão fora do radar, revelados publicamente mas não amplamente observados.
Observadores dizem que o minério de baixo grau que chega à China reforça as evidências de que a demanda do país por matérias-primas é maior do que os indicadores comuns mostram, e maior do que muitos investidores imaginam.
Os investidores em vez disso acompanham de perto o consumo chinês de commodities bastante negociadas, como barras de ouro, cobre refinado e petróleo bruto. Sinais de que seu apetite está aumentando ou caindo podem mover esses mercados, e ajudam a definir seu crescimento econômico de maneira mais genérica.
Durante o primeiro semestre, as importações chinesas de cobre refinado caíram mais de 13%, um declínio de 239.000 toneladas em relação ao mesmo período do ano passado - um sinal aparente de demanda mais fraca. Mas o país aumentou as importações de sucata e concentrado de cobre, que precisam de mais processamento. As 362.000 toneladas de cobre adicional foram o suficiente para fazer com que as importações chinesas tivessem um crescimento líquido, segundo o Barclays Capital.
No caso do cobre, as compras chinesas de fontes alternativas pode mudar a percepção de que a demanda está fraca ou forte, diz Kevin Norrish, diretor de análise de commodities do Barclays.
Os investidores que só olham para os números de importação de cobre refinado "perdem o quadro todo", diz Norrish.
As compras também demonstram a disposição dos produtores chineses de gastar tempo, energia e dinheiro extraindo minério de toneladas de areia, rochas e terra.
Processar concentrados de ouro não é tarefa fácil. Na América do Norte, muitas fundições fecharam as portas, com poucas empresas novas, por causa das elevadas despesas de capital e de rigorosas regras ambientais. Em questão está o uso de cianeto, um químico usado para dissolver o ouro da rocha e que é tóxico para humanos e o ambiente.
A China é um dos poucos países onde a capacidade de fundição está crescendo. O país tem agora uma capacidade anual de processar 600 toneladas de ouro, mais do que produz internamente.
E, com muitos navios voltando à China depois de desembarcarem as exportações ao Ocidente, os custos de transporte estão baixos. Eles estão perto dos níveis mais baixos em mais de um ano.
"Todos os bons ativos estão presos. Eles estão tentando driblar isso", diz Derek Scissors, que acompanha as compras de commodities da China para a Fundação Heritage, dos EUA. "O que estão fazendo é colher a fruta disponível, e ela tem um estrago. Outras pessoas não querem comê-la, e os chineses dizem 'tudo bem'."
No caso do ouro, a Nacional de Ouro da China deve extrair mais de 25 toneladas de ouro ao longo dos 12 anos de um acordo com a Coeur d'Alene Mines Corp., que opera a mina do Alasca.
"O governo chinês tem um plano bem estratégico, de olho em suas necessidades futuras de recursos naturais", diz Dennis Wheeler, o diretor-presidente da Coeur d'Alene. "Eles estão executando o plano."
Wheeler se nega a revelar quanto a Nacional de Ouro da China pagou, mas diz que foi a melhor oferta "em termos comerciais gerais". A Nacional de Ouro da China informou que fez o acordo "para obter lucros com o processamento".
"O mercado encontrará meios de suprir a demanda chinesa", diz Trevor Houser, um sócio da consultoria nova-iorquina Rhodium Group, que acompanha a economia da China. Mas, acrescenta, "eles podem não vir das fontes de fornecimento tradicionais".
A estratégia também pode ajudar a China a se proteger de saltos no preço motivados por sua própria demanda em alta.
A China também tem feito incursões em areias betuminosas, uma mistura de argila, água e uma forma viscosa de petróleo cujo processamento pode ser prejudicial ao ambiente.
A compra, pela Corporação Química e de Petróleo da China, de uma fatia de 9% na Syncrude Canada, em abril, indica que espera que a demanda de longo prazo cresça além do que as já crescentes importações de petróleo mostram. A empresa pagou US$ 4,65 bilhões para comprar a participação na produtora de petróleo de areias betuminosas e tem direito a receber 25.284 barris diários da Syncrude.
É pouco perto do consumo geral da China. Mas duas outras empresas chinesas também compraram participações em projetos de areias betuminosas este ano - a PetroChina Co. assumiu uma fatia na Athabasca Oil Sands Corp. pagando US$ 1,89 bilhão e a Corporação de Investimento da China colocou cerca de US$ 800 milhões numa joint venture com a Penn West Energy Trust.
(Fonte:Valor Econômico/Carolyn Cui e Liam Pleven, The Wall Street Journal/Colaborou Sue Feng)
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