A redução ou eliminação de tarifas no comércio entre Mercosul e União Europeia (UE), prevista no acordo anunciado entre os blocos, tende a trazer maiores ganhos de exportação para a Europa, avaliam técnicos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) em Carta de Conjuntura divulgada nesta quinta-feira.
Isso porque o bloco sul-americano aplica tarifas maiores aos europeus do que o contrário, além de a UE apresentar “maior diversificação da pauta potencial de vendas”.
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“Visto numa perspectiva mercantilista, de soma zero, parece que os países do Mercosul teriam menos a ganhar com o acordo, na medida em que seus produtos já enfrentam tarifas próximas a zero e não poderão baixar muito”, afirmam Marcelo José Braga Nonnenberg e Fernando José Ribeiro.
Segundo eles, considerando apenas as tarifas “ad valorem” (tributo baseado em um percentual sobre o valor do bem), a tarifa média aplicada pelo Mercosul atualmente é de quase 13%, contra 4,7% da UE. Apesar disso, os técnicos concluem que o Mercosul também poderia obter ganhos significativos em setores industriais relevantes.
Do ponto de vista do Brasil, dizem, o acordo permitirá substancial redução de preços de produtos manufaturados, especialmente bens de capital, químicos e produtos farmacêuticos, que representam parcela significativa das importações brasileiras da UE.
“Tal redução tem grande potencial de contribuir para o aumento da produtividade da economia brasileira”, dizem. O documento aponta alguns grupos de produtos em que as tarifas médias aplicadas pela UE ao Mercosul ainda são relativamente altas (acima de 9%), como em produtos alimentícios, têxteis e de vestuário. “Portanto, parece haver espaço para ganhos importantes de exportação do Brasil nestes casos.”
Itens que apresentam maior valor de exportação – como minérios, ferro, aço, farinhas, celulose, sementes e frutos oleaginosos (basicamente soja) e café – já enfrentam uma tarifa por parte da UE bastante baixa, logo, o ganho potencial com a liberalização seria pequeno em termos de exportações do Brasil e do Mercosul.
A carta destaca ainda que os países do bloco sul-americano podem obter ganhos adicionais em produtos exportados que hoje enfrentam quotas de importação, que serão ampliadas. “Haverá um aumento efetivo de acesso a mercado em carne de frango, carne suína, etanol e mel, pois as quotas concedidas são bem maiores que as exportações atuais. Nos demais produtos, o benefício será em termos de menores tarifas incidentes sobre volumes que já são exportados hoje.”
Os técnicos dizem ser provável que parte desse ganho se reverta em redução de preço para o consumidor europeu e parte aos exportadores do Mercosul na forma de aumento da margem de lucro. “Há que se notar, contudo, que os ganhos serão limitados, no curto prazo, pelo fato de que a maior parte das quotas será implantada gradualmente (exceto no açúcar); e, no longo prazo, pelo fato de que as quotas estabelecidas serão atingidas em algum momento no futuro, limitando ganhos adicionais em função do eventual aumento da demanda europeia”, ponderam.
Ainda assim, eles dizem que, embora o acordo demore alguns anos para vigorar de forma plena, resultados poderiam ser sentidos já no curto prazo. “A sua aprovação preliminar abre espaço para investimentos externos tanto de empresas do Mercosul na UE quanto de empresas europeias no Mercosul”, afirmam, citando a possibilidade de maior estabilidade de regras, convergência regulatória, mecanismos de solução de controvérsias e transparência.
As exportações do Brasil para a UE alcançaram, em 2018, US$ 32 bilhões, sendo 40% delas produtos do agronegócio. Já as importações do Brasil provenientes da UE no período atingiram US$ 33,2 bilhões, 91% de produtos industriais.
Fonte: Valor