O governo acredita que já há sinais de recuperação de alguns setores industriais, embora ainda tênues, que indicam que o pior teria ficado para trás. "Já batemos no fundo do poço, seguramente", disse ontem o ministro do Desenvolvimento, Armando Monteiro, em entrevista ao Valor. "Nós teremos, em 2016, um cenário ainda difícil para a indústria, mas ele será melhor do que o de 2015", afirmou.
O otimismo de Monteiro está baseado, principalmente, nos resultados da balança comercial brasileira e no efeito da desvalorização do real na substituição das importações. Segundo ele, os dados registrados pelo ministério até o início de março mostram um crescimento das exportações de produtos manufaturados. "Os setores mais tradicionais da indústria de transformação, como têxteis, calçados, vestuário e até setores como a indústria automotiva e de bens de capital devem elevar suas exportações neste ano."
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A desvalorização do real está fazendo milagres também na substituição de importações, avaliou Monteiro. O governo recebeu a informação da associação que representa a indústria têxtil brasileira de que a importação de cerca de 200 milhões de peças de vestuário deverá ser substituída por produtos locais. O ministro disse que o mesmo fenômeno está ocorrendo em outros setores industriais.
O efeito favorável do câmbio está sendo ajudado, explicou Monteiro, por medidas de acesso a mercado, como acordos negociados pelo Brasil com parceiros nos últimos meses e por uma promoção comercial mais agressiva. Ele citou o acordo automotivo com a Colômbia, que deverá aumentar a venda de veículos produzidos no Brasil para aquele país, e o acordo com o México, que vai ampliar o universo de bens com margem de preferência tarifária. Citou as gestões junto ao Irã, que poderão resultar em grandes encomendas na área de bens de capital e veículos.
Para Monteiro, a mudança de governo na Argentina produziu uma perspectiva de "maior fluidez" no comércio bilateral. "Estive em Buenos Aires há dez dias e os argentinos deram uma sinalização muito concreta favorável a um acordo [do Mercosul] com a União Europeia", informou. "Eles estão dispostos a fazer os ajustes na proposta [de abertura à UE]."
O ministro comemorava ontem o aumento nos preços internacionais das commodities, o que, segundo ele, poderá melhorar ainda mais o desempenho do comércio exterior neste ano. O governo tinha ajustado a previsão de saldo comercial em 2016 para US$ 35 bilhões. "Mas o comportamento até a segunda semana de março já nos autoriza a imaginar que essa previsão é conservadora", disse Monteiro. Entre os assessores do ministro, a hipótese de superávit comercial de até US$ 50 bilhões não é descartada.
Para Monteiro, a recuperação econômica do Brasil neste ano se dará, principalmente, por meio de dois canais: o das exportações e o dos investimentos em infraestrutura, sendo que esse último é considerado por ele de importância crucial, pois vai melhorar a produtividade global da economia.
O ministro disse que foi para destravar a agenda dos investimentos que o governo anunciou, na segunda-feira, medidas que aumentam a participação do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) no financiamento dos projetos, que reduzem o custo financeiro dos créditos e reforçam o fundo garantidor dos empreendimentos. "O ponto fundamental da agenda é o financiamento", afirmou.
Monteiro disse que, "na quadra atual da economia brasileira", não se pode prescindir de uma maior participação do BNDES. Para ele, tão importante quanto oferecer taxa adequada de retorno aos investidores e cuidar da modelagem dos projetos, para mitigar riscos regulatórios, é garantir os financiamentos. "O BNDES tem que ter ainda um papel muito relevante."
Até agora, o piso dos empréstimos do banco estatal corresponde a 30% do investimento e o teto a 70%. Com a mudança anunciada pelo governo, o piso passará para 40% e o teto poderá chegar a 80%, dependendo das características do projeto.
Havia necessidade também, de acordo com o ministro, de "fazer ajustes" nas taxas de juros dos financiamentos do BNDES para os projetos de infraestrutura. Uma das medidas aumenta a participação da Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP) na composição do custo financeiro do crédito, o que permitirá reduzir as taxas ao tomador final de 1,3 a 2 pontos percentuais.
"Seria irrealismo não aumentar a participação do BNDES no financiamento dos projetos e não promover certo ajuste nas taxas", afirmou. "Mas não significa que voltaremos a regimes anteriores, como o PSI [Programa de Sustentação do Investimento], porque isso envolveria subsídios explícitos", disse.
Segundo ele, haverá um subsídio implícito, representado pela diferença entre o custo financeiro oferecido e a Selic, a taxa básica de juros da economia, que embora tenha reflexo na dívida pública, "não produz ônus para o Tesouro no curto prazo".
Fonte: Valor Econômico\Ribamar Oliveira | De Brasília