Em meio a sucessivas trocas de comando, a Petrobras precisará pedir ao Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica) mais tempo para vender as refinarias que precisa colocar à disposição do mercado por causa de um acordo assinado com o órgão antitruste em 2019.
Mais de dois anos após o acerto pela alienação dos oito ativos, apenas um teve a venda aprovada pela autoridade antitruste e outros quatro estão em diferentes estágios do processo. O atraso já levou a autarquia a rever o limite de tempo no início deste ano, mas agora será necessária uma nova rodada de negociação.
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Gustavo Augusto de Lima, conselheiro do Cade, avalia que as mudanças na presidência da estatal atrapalham a companhia de seguir em frente com o plano de vendas. "Há problemas de governança e mudança de liderança que ainda vão levar algum tempo e o Conselho tem que ponderar isso tudo", disse à Folha.
Lima entrou no Cade em abril deste ano e tem atuado no início de seu mandato na área de óleo e gás. Ele diz que a renegociação com a Petrobras pode ter três saídas.
A primeira é aumentar o prazo, o segundo é definir uma multa para compensar o descumprimento de parte do acordo e o terceiro é reabrir a investigação contra a estatal por práticas anticoncorrenciais no setor de refino.
Foi para justamente para encerrar essa investigação que o Cade e a Petrobras chegaram ao acordo para a venda dos ativos. "Das três, parece que o Cade está fazendo maiores esforços para que o acordo chegue até o fim [aumentando o prazo]", revelou Lima.
Em março deste ano, Cade e Petrobras já haviam estendido o prazo para as vendas. A estatal apresentou como justificativas as conjunturas econômicas internas e externas que impactam o setor. Conforme informou o Cade após a repactuação, o cronograma é de acesso restrito às partes para não prejudicar as negociações da empresa.
A refinaria mais perto de ter a sua venda concluída é a refinaria de Manaus, que chegou a receber o sinal verde do Cade na Superintendência-Geral do órgão. O caso, entretanto, deve parar no tribunal administrativo da autoridade antitruste.
Além disso, a Petrobras enfrenta problemas na única venda de refinaria que recebeu a autorização final do Cade —a Landulpho Alves, na Bahia. A autarquia abriu uma investigação relativa ao ativo, que hoje pertence ao fundo Mubadala, dos Emirados Árabes. O pedido de abertura foi feito por Lima e teve a aprovação unânime do tribunal administrativo.
A investigação será tocada pela primeira instância do Cade, a Superintendência-Geral, e terá duas frentes. Na primeira, o possível culpado é a refinaria, que estaria cobrando mais caro pelo combustível vendido na Bahia (onde tem o monopólio) do que em outros estados (onde há competidores).
Na segunda, ela é a vítima e a investigação será sobre a Petrobras. A desconfiança é que a estatal estaria vendendo combustível mais caro para a refinaria privatizada do que para as que ainda são suas.
"A sinalização que a gente quer dar é que o Cade está atento nas duas pontas. Estamos comprometidos a levar o acordo até o final com a venda das oito refinarias e temos que estar atentos de não estar simplesmente criando monopólio privado. Vamos continuar fiscalizando o setor", explicou Lima.
A Acelen, empresa controladora da refinaria Landulpho Alves, disse em nota que "possui uma política de preços transparente, competitiva e homologada pela agência reguladora do setor". "Tal política, como não poderia deixar de ser, considera, dentre outros fatores, a realidade econômica de cada localidade ".
A empresa afirmou ainda que "vai contribuir com a apuração do Cade em tudo o que for possível, inclusive na discussão de questões estruturais do setor que precisam ainda ser trabalhadas para que se possa alcançar um mercado efetivamente competitivo".
O atraso na venda dos ativos é observado após o presidente Jair Bolsonaro trocar a presidência da Petrobras três vezes durante o seu mandato, sendo que as duas últimas aconteceram nos últimos 45 dias. Em 14 de abril, José Mauro Ferreira Coelho assumiu o cargo em substituição a Joaquim Silva e Luna.
Pouco mais de um mês depois, em 23 de maio, o presidente anunciou que Coelho daria lugar a Caio Mário Paes de Andrade, hoje no Ministério da Economia. Por trás das trocas está a insatisfação do governo federal com o preço da gasolina, cuja cotação no Brasil segue preços internacionais.
Procurada, a Petrobras negou que as mudanças na presidência estejam impactando o programa de venda de ativos e aponta que, desde março deste ano, 22 fatos relevantes envolvendo transações foram publicados.
Alguns deles, no entanto, se referem a etapas diferentes de uma mesma negociação e apenas dois são de vendas de refinarias —a de Manaus e a Lubnor, no Ceará. "Os movimentos de Gestão de Portfólio da companhia seguem seu curso normal de negócios", informou a petroleira.
Fonte: Folha SP