A supersafra de 290 milhões de toneladas projetada para este ano começa a ter alguns pontos de interrogação. E, mais uma vez, os desafios se iniciam pela região Sul. Calor intenso e estiagens afetam o plantio e a evolução das lavouras de milho, de soja e de arroz.
O calor afeta, ainda, pastagens, produção de leite e plantações de frutas. Na avaliação de Paulo Pires, presidente da FecoAgro (Federação das Cooperativas Agropecuárias do Estado do Rio Grande do Sul), 2022 inicia de forma melancólica.
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Segundo ele, os primeiros números indicam perdas de 59% no milho sequeiro e perspectivas atuais de quebra de 24% na soja no estado. A chuva está chegando tarde, e os prejuízos são irreversíveis.
A Emater/RS ainda não tem números, mas este será um ano ruim para o milho, diz Alencar Rugeri, diretor-técnico da entidade.
Dezembro é o principal mês para o desenvolvimento da cultura do milho, e as lavouras sofreram muito com a seca intensa, segundo ele.
As perdas são localizadas, e a intensidade dos prejuízos depende de região. Alguns produtores relatam perdas de 6%. Em alguns casos, no entanto, o relato é de 90%.
Esse número de perdas não está fechado, e as próximas semanas serão decisivas, inclusive para a soja. Janeiro é um mês decisivo para as lavouras da oleaginosa.
Segundo Rugeri, 245 municípios do estado estão afetados pela estiagem, e 138 mil propriedades foram atingidas. Em alguns casos, as famílias já não têm mais água para beber e para dar aos animais, afirma o diretor da Emater.
A seca fica aparente na produção de silagem, que teve uma quebra de 57% no Rio Grande do Sul.
Produção de leite e fruticultura também entram na lista das atividades agropecuárias afetadas pela estiagem.
A seca influi também na produção de arroz, devido à redução de água nos reservatórios das propriedades. O estado é o maior produtor nacional deste cereal, com potencial de 8,1 milhões e toneladas.
Santa Catarina também está na rota de perdas, devido à estiagem. Um polo importante na produção de frutas, São Joaquim terá a produção de maçã bastante abalada.
A seca forte afeta principalmente as variedades gala e fuji, que têm colheitas em fevereiro e março. Com potencial de produção de 350 mil toneladas de mação, a economia da região depende muito dessa fruta.
A estiagem compromete o tamanho da fruta e, consequentemente, o volume a ser produzido, segundo Mariuccia Schlichting de Martin, pesquisadora da Epagri (Empresa de Pesquisa Agropecuária e Extensão Rural de Santa Catarina).
Nas áreas mais afetadas pelo calor intenso e pela falta de chuva, as árvores estão perdendo folhas e os frutos murcham. Esse clima adverso provoca queimadura na casca dos frutos, que perdem valor comercial. Mesmo com a ocorrência de chuvas, boa parte da produção não se recupera.
A seca deste ano poderá afetar também a colheita do próximo, uma vez que as plantas estão perdendo as reservas que têm para a reprodução na próxima safra.
Alguns produtores já relatam perdas de 80% em sua produção. Esse prejuízo é irreversível, segundo Mariuccia.
A situação no Paraná, o segundo maior produtor de grãos do país, também é preocupante. O potencial de produção de soja, de milho e de feijão da primeira safra ficaram para trás. As perdas na soja serão de 7,8 milhões de toneladas; as de milho, 1,4 milhão; e as de feijão 107 mil. Os prejuízos, em relação ao potencial de arrecadação inicial, já somam R$ 24 bilhões.
As perdas no Paraná ganham uma dimensão complicada, uma vez que o estado é o principal produtor nacional de feijão, o primeiro em aves e o segundo em suínos e em leite. O custo da produção de proteínas será bem maior.
O cenário pela frente não é animador, segundo Salatiel Turra, chefe do Deral (Departamento de Economia Rural) do Paraná, uma vez que as condições das plantas se agravam.
Há duas semanas, 13% das lavouras de soja eram consideradas como ruins. Agora, são 31%. No mesmo período, o quadro para o milho subiu de 10% para 25%.
Pelos cálculos do Deral, o estado já reduziu em 10 milhões de toneladas o potencial de produção de milho na soma da safrinha de 2021 e da atual, considerada como de verão.
A preocupação agora fica com a safrinha deste ano, que será semeada após a colheita de soja. A região Sul vem com perdas na produção de milho há três anos.
A quebra no feijão, alimento básico do dia a dia do consumidor brasileiro, já supera 30% nesta safra, segundo Marcelo Lüders, presidente do Ibrafe (Instituto Brasileiro do Feijão e dos Pulses).
Fonte: Valor