A indústria brasileira de óleo e gás se prepara para fazer, pela primeira vez, um inventário detalhado das emissões de gases de efeito estufa do setor no país. Enquanto autoridades do mundo todo se reúnem na 26ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP26), em Glasgow (Escócia), sob protestos de jovens ativistas contra a falta de medidas mais drásticas para conter o aquecimento global, a diretora-executiva corporativa do Instituto Brasileiro de Petróleo (IBP), Cristina Pinho, conta que as petroleiras estão cientes das pressões por descarbonização e assumirão um papel importante não só no financiamento climático, mas também no desenvolvimento das novas tecnologias da transição energética.
A pedido do Ministério de Meio Ambiente, o IBP elaborou uma lista de startups que atuam com descarbonização na indústria petrolífera. A expectativa é mostrar como esse ecossistema de inovação pode contribuir para a redução das emissões.
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Cristina Pinho diz que as petroleiras esperam investir “uma fortuna” de cerca de R$ 3 bilhões anuais, nos próximos anos, em pesquisa, desenvolvimento e inovação, como parte dos compromissos da cláusula de PD&I dos contratos de concessão - que obriga os produtores de óleo e gás a investirem, na área de PD&I, 1% da receita bruta dos campos mais rentáveis.
Depois de investirem pesado em laboratórios e formação de recursos humanos pelo país afora, as petroleiras mudaram o perfil dos investimentos em PD&I nos últimos anos, com foco cada vez mais direcionado às startups. A Agência Nacional de Petróleo (ANP) flexibilizou as regras, abrindo espaço para que as companhias aplicassem fatias maiores nesse tipo de empresas de inovação. Agora, conta a diretora do IBP, a indústria se organiza para pleitear junto ao regulador a possibilidade de formação de consórcios que permitam dar mais poder de fogo às startups com tecnologia de descarbonização.
“Não podemos abrir mão dessa receita para financiar o futuro da transição energética”, afirma Cristina Pinho ao Valor. “Até porque não se passa pela transição energética sem a indústria de óleo e gás. É uma transição, não é uma ruptura. O mundo não pode ficar sem combustível fóssil de um dia para outro. Se não vamos arruinar. O combustível fóssil tem que financiar a mudança”, complementa.
Segundo Cristina Pinho, a indústria de óleo e gás está consciente de que a transição energética não se trata só de uma necessidade ambiental. “Não estamos fazendo nenhuma bondade. É um bom negócio também. A transição energética é uma oportunidade de novos modelos de negócios, novos produtos”, comenta.
Ela afirma que, no Brasil, a pressão sobre as petroleiras ainda é maior por parte dos investidores do que da própria sociedade civil. “Mas temos, aqui, muitas empresas europeias que estão sofrendo fortemente [a pressão] pela sociedade [nos países de origem]. No Brasil estamos num momento diferente. As preocupações são outras”, diz a executiva, ao citar o aumento da preocupação do brasileiro com aspectos da crise econômica, como a inflação e a fome.
Cristina Pinho diz que, no IBP, as preocupações com a descarbonização ganharam impulso nos últimos anos. A executiva coordena a Comissão de Mudanças Climáticas do instituto, voltada para o debate técnico do assunto. A entidade também possui um Comitê de Transição Energética, subordinado ao Conselho de Administração.
Ela diz que um dos grandes pilares do posicionamento da indústria petrolífera brasileira, frente à transição energética, será melhorar o desempenho das emissões das operações nos diferentes elos da cadeia. O IBP pretende construir um inventário das emissões das empresas no Brasil, de forma a permitir, no futuro, que o setor trace metas de redução das emissões nos diversos segmentos, como na produção de óleo e gás e no refino.
Atualmente, o Inventário Nacional de Emissões e Remoções de Gases de Efeito Estufa estima que o setor energético responde por 29% das emissões do Brasil. O levantamento, porém, trabalha com números agregados, sem informações mais setorizadas.
O gerente de sustentabilidade do IBP, Carlos Victal, diz que, num primeiro momento, o instituto pretende fazer, até o fim do ano, uma “primeira depuração” sobre as emissões da indústria petrolífera, com base em dados públicos. Em 2022, a ideia é coletar os dados diretamente das empresas. “Queremos consolidar tudo para não só estabelecermos metas de redução em cima de uma base definida, mas alimentar outras organizações [que trabalham com inventários de emissões]”, explica.
Segundo Cristina Pinho, o IBP quer se posicionar como um gestor do inventário do setor e auxiliar as empresas no desenvolvimento de planos estratégicos para a descarbonização. O instituto, diz ela, também acompanha com atenção os desdobramentos da regulamentação de assuntos como o mercado de carbono - as petroleiras são contra a taxação das emissões e favoráveis à comercialização de créditos de carbono.
Fonte: Valor