O grupo alemão ThyssenKrupp pretende, a partir de outubro, quando começa seu novo ano-fiscal, iniciar uma nova era em suas operações mundo afora. O fracasso de seu projeto de produção de aço nas Américas, em especial no Brasil, deixou desgastada sua imagem. A centenária companhia quer ser reconhecida como um conglomerado industrial de tecnologia e materiais, com cinco grandes áreas de negócios, inclusive siderurgia, e com presença global. Não quer mais ser vista apenas como uma empresa alemã.
Esse movimento de ajustes passa pelo Brasil. Duas importantes decisões já são visíveis, entre outras em curso: o plano de venda da siderúrgica de aços planos no Rio, a Companhia Siderúrgica do Atlântico (CSA), buscando pôr fim a mais uma tentativa frustrada de fazer aço no país, e a nomeação de um presidente-executivo para definir e coordenar aqui a estratégia de todos os negócios do grupo, antes dispersos.
O engenheiro mecânico Michael Höllerman, de 48 anos, com pós-graduação em economia em Dortmund, Alemanha, assume, de fato, seu posto nos próximos dias. Ele não é um novato de Brasil: aqui esteve pela primeira vez em 1996, onde ficou até 1999. Em 2005, retornou ao país após três anos no México e outros três na Alemanha. Até a sua escolha, presidia a ThyssenKrupp Forging Group, unidade local de componentes para motores.
A missão, diz Höllerman, que já vem trabalhando no ajuste do portfólio de atividades, é reforçar a marca ThyssenKrupp em todos os negócios. Ele admite que essa percepção não existe no país e que o caso da siderúrgica CSA - "um ponto fora da curva, como se diz no Brasil" - deixou um desgaste para a companhia.
Esse processo de fortalecimento regional ocorre simultaneamente em várias regiões no mundo. Além do Brasil, nos EUA, Índia, China e Sudeste asiático. Juntos, esses mercados respondem por 36% da receita global da ThyssenKrupp, que foi € 40 bilhões.
Para essa nova fase, Höllerman vem montando, desde fevereiro, um novo time de executivos. A equipe, que começou pequena, atingiu 20 pessoas e deverá somar um grupo de 30 pessoas. "Os negócios agora serão mais integrados e contarão com mais ajuda financeira e institucional", diz.
Com carta branca para atuar e ligação direta com o CEO Heinrich Hiesinger e o CFO Guido Kerkhoff do grupo, Höllerman já iniciou o processo de enxugamento do portfólio no país. E isso não se resume à CSA, o caso mais emblemático, que foi uma determinação de Hiesinger. Começou também a dar os primeiros passos para ocupar oportunidades que não percebidas devidamente no país. Por exemplo, em óleo e gás e no agronegócios.
Elevadores e componentes automotivos, com a ThyssenKrupp Metalúrgica Campo Limpo, são as áreas mais conhecidas aqui. As cinco grandes divisões de negócios são componentes para indústria e infraestrutura, elevadores, soluções industriais, de serviços de materiais e aço. Com a venda da CSA - um negócio que parece cada dia mais difícil de se concretizar - passarão a quatro.
A siderúrgica responde por 50% do faturamento da companhia no país - R$ 9 bilhões no ano passado. Porém, com um prejuízo maior que R$ 4 bilhões.
Em entrevista ao Valor, pouco antes de embarcar para a Alemanha, Höllerman contou como está redesenhando a companhia no país. O processo é doloroso: tem fechamento de algumas unidades de negócios e a venda de outras cujas operações deixam de ser interessantes por estarem ligadas à CSA. Caso da RIP Serviços Industriais, cujo faturamento supera US$ 300 milhões e tem 8 mil empregados, a maioria trabalhando dentro da siderúrgica.
Adquirida em 2006, a RIP, voltada às atividades de refratários, isolamento e pintura, tem duas unidades em Indaiatuba (SP). Segundo Höllerman, "não é um negócio ruim, mas outro dono poderia fazer mais com ele". Também vão sair do portfólio a Máquinas e Equipamentos e a Comércio de Combustíveis e Gases, ambas no distrito de Santa Cruz, no Rio, ao lado e ligadas à CSA.
Em componentes para o setor automotivo, a Thyssen reduziu à metade sua operação em Diadema (SP), onde faz sistemas de montagem. "Perdeu competitividade", afirma. Mas, no mesmo ramo, está investindo R$ 100 milhões em uma nova fábrica de sistemas de injeção para automóveis em Poços de Caldas (MG), prevista para iniciar operação daqui a um ano.
Não há só notícias negativas, diz o executivo. A nova fase inclui um plano de investimentos de R$ 450 milhões de 2013 a 2016, incluindo a fábrica de Poços de Caldas. Nos últimos anos, já havia ampliado e modernizado sua maior unidade de produção de autopeças, em Campo Limpo (SP). Sozinha, essa fábrica gera 10% do faturamento no país.
Esta ampliando a capacidade de componentes de suspensão automotiva, em São Bernardo do Campo (SP) e ampliando em 33% a produção de anéis para torres eólicas em Diadema (SP).
No segmento de "soluções industriais", que gera aproximadamente 30% das vendas no país, o grupo começou a construir um centro de serviços em Santa Luzia (MG) na área de equipamentos para cimento e mineração.
A divisão de elevadores é vista com perspectivas promissoras. Fruto da aquisição da antiga Sür, em 1999, ela gera outros 10% das receitas da Thyssen no Brasil. A empresa acabou de ampliar a capacidade de produção em Guaíba (RS). A meta ambiciosa de Höllerman é crescer em um ritmo superior ao do mercado, que avança em torno de 20% ao ano. A briga é com gigantes globais: Atlas Schindler, a líder, e Otis, que estão aqui há muito tempo, e com as entrantes Hyundai e Mitsubishi. "As vendas devem ser puxadas por aeroportos e outras demandas em infraestrutura, além de prédios residenciais, inclusive em cidades menores".
Fora os negócios em que já tem presença conhecida, o grupo almeja vender mais componentes para o setor aeronáutico. Tem uma fábrica em Taubaté (SP) que já é fornecedora da Embraer - desde pequenos módulos montados para as asas dos jatos até peças de alumínio usinadas.
Também já faz prospecções no setor de óleo e gás, que usa componentes de alta resistência. O alvo são os pesados investimentos previstos para extração de petróleo nos campos do pré-sal. "Estamos em contato com Petrobras, outra empresas e universidades. Teremos novidades para contar em um ou dois anos", diz Höllerman. Recentemente, um chefe da área de pesquisa da empresa, na Alemanha, veio ao Rio de Janeiro para saber como funciona este mercado.
Na nova configuração global de negócios do grupo, aço ficará restrito à ThyssenKrupp Steel Europe e baixa sua participação na receita de 40% para algo como um quarto. No ano passado, foi 27%.
Fonte: Valor Econômico/Por Ivo Ribeiro e Olivia Alonso | De São Paulo
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