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Processos tradicionais de soldagem ainda são utilizados, mas novas tecnologias trazem maior produtividade e redução de custos
A Petrobras tem sido um dos motores para o desenvolvimento nacional e é hoje a maior demandadora de produtos e serviços que envolvem soldagem no país. Como todos os equipamentos, navios, plataformas, dutos e tubulações precisam ser soldados, o processo de aplicação de solda tem impacto direto nos custos e prazos dos empreendimentos da estatal. Na indústria naval principalmente,
a soldagem está presente na construção de praticamente todas as seções que compõem as embarcações, dos aspectos estruturais às soldas de acabamento. A boa qualidade da solda é de suma importância para que não haja retrabalho, além de todo o desgaste e todos os impactos para o material que está sofrendo os reparos. Entre as maneiras de se aumentar a produtividade nos estaleiros está a introdução de novas técnicas e tecnologias no processo de soldagem.
Pela corrosão severa que acarreta, o ambiente marinho e subaquático, especialmente do pré-sal, exige materiais especiais e de alta resistência, mais complexos em relação à metalurgia e aos processos de soldagem comuns. Os procedimentos também são específicos para os materiais empregados. “O emprego de materiais nobres vem se acentuando ao longo dos anos em função da descoberta de campos com maiores teores de contaminantes. Isto é um fato”, diz o gerente de tecnologia de Materiais, Equipamentos e Corrosão (Cenpes/PDEP/TMEC) da Petrobras, Luiz Cesar de Almeida.
De acordo com o técnico, nos últimos anos a companhia obteve um avanço significativo na aplicação dos processos arame tubular e GMAW ou MIG MAG, como também é conhecido, principalmente na área naval e na construção de oleodutos e gasodutos. No entanto, os processos TIG e eletrodo revestido ainda têm sido largamente utilizados. “O processo de soldagem com maior grau de automação e produtividade são necessários. Temos que lançar mão e quebrar esse paradigma do revestido, do TIG, que é a dupla tradicionalmente utilizada, mas têm suas limitações de produtividade e problemas de defeito”, afirma o executivo.
Caso os soldadores estejam bem treinados e habituados a usar o processo de soldagem, continua Almeida, o arame tubular, por exemplo, pode trazer uma alta produtividade, gerando um rendimento expressivo. “A mão de obra envolvida na fabricação de soldagem deverá ser crescentemente melhor qualificada. Quando se utiliza um novo processo e ocorre um problema, muitos já o condenam e dizem que é difícil, mas não é isso. É que você não preparou sua mão de obra e não planejou corretamente o serviço de soldagem que deveria ser feito. Tudo é uma questão de treinamento e instrução”, afirma.
Para ele, a qualificação da mão de obra deve continuar sendo um grande desafio para os próximos anos. “Faltam no mercado soldadores, inspetores e até engenheiros de soldagem. Esse é um desafio que a Petrobras, através do Promimp, tem enfrentado de forma pesada, mas não é suficiente. As ações são necessárias de todos os lados, não só do governo. É fundamental que os empresários se juntem para que consigamos preparar mão de obra em todos os níveis na área de soldagem”, avalia.
Dentro dos processos de soldagem a arco já existem tecnologias maduras, mas que são encaradas no Brasil como novas tecnologias, segundo Almeida. É o caso do TIG pulsado, MIG/MAG curto circuito controlado, MIG/MAG duplo arame, arame tubular, arco submerso, arco submerso de onda quadrada e com balanço de onda, TIG pulsado e TIG mecanizado para revestimento interno de tubulações. Esses avanços tecnológicos estão prontos, porém frequentemente não chegam na frente de obra.
Quanto à modernização de processos para o futuro, a Petrobras vem financiando iniciativas de P&D como, por exemplo, nos processos Friction Stir Welding (FSW), laser, laser-MIG (híbrido) e sistema MAG robotizado de soldagem de tubulações. Para isso, a empresa conta com o Centro de Pesquisas e Desenvolvimento Leopoldo Américo Miguez de Mello (Cenpes), que já investiu entre 2006 e 2011 US$ 1,6 bilhão em atividades de pesquisa nas mais diversas áreas da cadeia de petróleo e gás.
Para fazer a gestão dos investimentos, a Petrobras criou em 2006 o modelo de Redes Temáticas e identificou 50 temas estratégicos na área de petróleo e gás. Para cada tema, a estatal selecionou potenciais colaboradores, que já somam mais de 100 instituições nacionais de pesquisa e desenvolvimento. Uma delas é a Fundação Brasileira de Tecnologia da Soldagem (FBTS), que mantém seu departamento de gestão tecnológica desde 2005.
“Fazemos todo o suporte de pesquisa junto à Petrobras, às áreas interessantes de pesquisa, novos desafios”, diz o superintendente do Departamento de Gestão da Inovação Tecnológica da FBTS, Marcelo Pereira. Criada em 1982, a instituição privada tem entre seus objetivos disseminar informações, contribuir para a capacitação tecnológica e para a melhoria da qualidade de produtos, processos e serviços e o aumento da produtividade da indústria.
Através de uma estratégia visando ao aumento da produtividade e redução de custos na fabricação e na construção soldada no setor de petróleo, a FBTS identificou em 2009 uma carteira de 11 projetos tecnológicos. O primeiro projeto de P&D com o Cenpes/PB, que aconteceu em 2011, foi o revestimento interno de tubos por weld overlay. Neste ano, a FBTS já assinou com a Petrobras um termo de cooperação para o desenvolvimento de sete projetos tecnológicos para elevar a competência do mercado nacional da soldagem. “Desta forma espera-se aumentar a capacidade produtiva, melhorando a competência e qualidade técnica, garantindo assim a competitividade do mercado nacional, através de ações integradas sobre fabricantes de insumos e equipamentos, sobre os profissionais e sistemas de qualidade”, ressalta Pereira.
Entre as linhas de pesquisa em andamento atualmente, segundo o superintendente, estão, entre outros, soldagem de aços cromo molibdênio vanádio cladeados com inox austenístico, modelamento computacional da soldagem, processo de soldagem laser híbrido para soldagem de chapas de aço com alta resistência, soldagem de ligas resistentes à corrosão e soldagem de aços ao níquel (9%) para injeção de CO2. Esta última inclusive, segundo Almeida, da Petrobras, tem se mostrado promissora.
“Com apoio do mercado, estamos conseguindo produzir um aço mais limpo, com nível de tenacidade e resistência bastante elevados. Estamos redescobrindo materiais que não estavam tendo a atenção devida”, avalia ele. Almeida destaca que, com o uso de novas tecnologias avançadas para aumentar a produtividade e reduzir custos, a tendência é de que os novos contratos comecem a especificar o uso de processos de soldagem para cada situação contratada.
Próximo ao Cenpes, instalado na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro, está o Parque Tecnológico do Rio, que visa criar um ambiente de cooperação e interação entre a comunidade acadêmica e os empresários, buscando o fortalecimento da capacidade de inovação. Dentro do campus universitário da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), cuja área é de cerca de quatro milhões de metros quadrados, há um espaço de 350 mil metros quadrados para que as empresas possam se instalar.
Integram o público-alvo do parque empresas com forte atuação em pesquisa, desenvolvimento e/ou produção de bens e serviços intensivos em conhecimento e que busquem a interação com as demais atividades existentes no campus da universidade. No local, estão abrigadas companhias, entre outras, das áreas de energia, meio ambiente e tecnologia da informação, como GE, Siemens, Tenaris e BG Group. “É o único site do mundo onde estão juntas, por exemplo, a Schlumberger, a Halliburton e a Baker Hughes, que são três concorrentes petrolíferas que disputam o mercado acirradamente. Elas estão logicamente competindo, mas de alguma maneira cooperando com a questão de desenvolvimento tecnológico”, destaca o gerente de articulações do Parque Tecnológico do Rio, Alfredo Laufer.
Para a sua instalação, a empresa pode optar por uma concessão de uso, por um período de 20 anos, do terreno escolhido para construção da unidade ou pode montar a empresa em uma das edificações de uso compartilhado. Já as empresas nascentes podem fazer parte da Incubadora de Empresas.
Outro objetivo do parque é a melhoria da formação profissional dos alunos da universidade. De acordo com Laufer, com a admissão das empresas no local, é possível saber seus principais gargalos tecnológicos e assim a universidade pode preparar melhor o futuro profissional.
“Precisamos saber com quais problemas essas empresas estão se defrontando. A nossa ementa, pela obsolescência rápida que tudo tem, também se torna obsoleta e precisamos escutar os problemas da nossa sociedade. A missão da universidade é melhorar a formação profissional e para isso temos que ter essa interação”, explica ele.
Embora haja diversas empresas instaladas no campus e laboratórios de alta excelência para atender às demandas, Laufer conta que a ociosidade ainda impera e que a universidade ainda está distante da iniciativa privada. “Temos dentro do parque, por exemplo, o Laboratório de Ensaios Não Destrutivo, Corrosão e Soldagem (LNDC), em que estudamos o problema da solda. Lá existem equipamentos fantásticos para o desenvolvimento de novas tecnologias e temos o problema da ociosidade. Só a Petrobras tem assinado com a Coppe mais de três mil contratos, mas com as empresas de capital nacional o envolvimento é bastante frágil. Queremos ter uma maior aproximação”, declara ele.
Além da UFRJ, a Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) também vem contribuindo para o desenvolvimento de novas tecnologias no campo da soldagem. No LabSolda, órgão de pesquisa do Instituto de Mecatrônica da instituição, alunos desenvolveram um sistema robótico integrado de automatização da soldagem na indústria naval. Batizado como tartílope, o equipamento é uma solução inovadora e flexível e propõe novas modalidades de soldagem, em substituição às atualmente utilizadas, promovendo o aumento da produtividade de toda a operação.
A diversidade de configurações geométricas a serem soldadas na construção de embarcações implica uma variedade de técnicas e procedimentos de soldagem a serem utilizados na fabricação naval. De acordo com o supervisor geral do Labsolda e coordenador do grupo de Processos de Soldagem, Instrumentação, Equipamentos e Softwares da UFSC, Jair Carlos Dutra, o tartílope consegue reproduzir diversos movimentos feitos pelo soldador. “O equipamento realiza movimentos de tecimento do tipo trapezoidal, retangular e triangular, permitindo uma ampla gama de ajustes, de acordo com a condição de soldagem requerida”, destaca. Portanto, a arte do soldador é agora tarefa do equipamento que pode armazenar programas específicos para diferentes juntas.
A interface homem-máquina é de operação simples, o que torna rápido e fácil o treinamento do operador. Definidos os parâmetros de soldagem, o equipamento realiza de forma constante e sem parada os cordões de solda, garantindo melhor qualidade e repetibilidade, já que o movimento executado uma vez poderá ser repetido com fidelidade quantas vezes forem necessárias.
Outra vantagem do tartílope é o seu sistema de seguimento de junta, que corrige automaticamente desalinhamentos entre a direção das juntas através do sensoreamento das variáveis corrente e tensão do arco. Desse modo, não é necessária a preocupação com o alinhamento entre o trilho do sistema e a junta a ser soldada. “Com isso, ele fica tanto mais automatizado, o que torna o trabalho do operador mais confortável. Não precisa estar com a máscara em cima tentando corrigir. Esse é um avanço atual no nosso sistema”, conta Dutra.
Deslocando-se sobre um trilho flexível, o equipamento se ajusta ao formato dos cascos das embarcações. Pela maneira de operação, a insalubridade do trabalho é reduzida, já que o soldador não precisa estar constantemente colocado à frente do arco voltaico, onde está sujeito a fumos e respingos gerados na soldagem. Além de maior comodidade, o tartílope proporciona também um aumento significativo da produtividade pela maior velocidade, já que não descansa como os soldadores.
Algumas das dificuldades a serem superadas durante todo o processo de construção são os diferentes tipos de chanfro, as soldas fora de posição, bem como uma variedade enorme de espessura de chapas e materiais diferenciados a serem soldados. Por ser um equipamento versátil, realiza a soldagem em todas as posições, inclusive sobre-cabeça. O tartílope V2F utiliza um trilho flexível que permite a fixação do equipamento em superfícies curvas, possibilitando a soldagem em tanques, cilindros, costados de navios, tubulações e outras superfícies com variação de forma.
Outra dificuldade relacionada às diferentes estruturas que compõem as embarcações é a operação manual dos processos de soldagem. Por razões históricas e operacionais, diz a universidade, a aplicação de eletrodos revestidos na indústria naval, apesar de ultrapassada, ainda corresponde a percentuais elevados quando comparado à utilização das demais modalidades de soldagem. O fato dificulta tentativas de automatização do processo construtivo nos estaleiros. O tartílope chega para propor uma nova modalidade de soldagem.
Iniciado em julho de 2009 e concluído no último mês de julho, o projeto contou com a Fundação de Amparo à Pesquisa e Extensão Universitária (Fapeu) como entidade proponente e o Laboratório de Soldagem (Labsolda) como entidade executora. A SPS – Soluções para a Soldagem é a responsável pela comercialização do produto. Os recursos da Finep no projeto foram de R$ 760 mil. Dutra explica que um equipamento desse tipo nunca acaba de ser desenvolvido, já que novas tecnologias, microprocessadores e novas ergonomias se fazem necessárias. “Muitas vezes, o equipamento é até customizado para determinados fabricantes. Como somos os detentores de toda a inteligência, nós podemos ir modificando à medida das necessidades. Essa é a vantagem de se ter uma tecnologia nacional”, diz.