11ª Navalshore recebe visitantes e empresas de 40 países >> Com crescimento constante que faz jus à evolução do setor naval no país, a Marintec South America – 11ª Navalshore contou este ano com a participação de 12 pavilhões nacionais e 40 países. No total, mais de 380 marcas foram expostas durante os três dias do evento, realizado de 12 a 14 de agosto, no Centro de Convenções SulAmérica, no Rio de Janeiro. Já no terceiro dia, 67% dos expositores haviam renovado sua participação para o ano que vem. Em 2015, a feira será realizada de 11 a 13 de agosto, no mesmo local.
PUBLICIDADE
A cada ano mais internacionalizada, a feira é o mais importante ponto de encontro do setor na América do Sul e vem consolidando-se como polo de discussão também para interação do polo regional sulamericano, com a presença cada vez mais constante de entidades de países vizinhos, como Argentina e Uruguai.
O promissor cenário do pré-sal para as próximas décadas polariza as atenções para a indústria naval brasileira e a Marintec-Navalshore reúne um público visitante constituído basicamente por profissionais e estudantes de nível superior, o que explica em parte seu sucesso. Este ano, 16.536 pessoas passaram pelo evento.
A defesa do conteúdo nacional marcou a solenidade de abertura da feira, diante da notícia de que a Petrobras optara por afretar no exterior parte dos barcos de apoio offshore com os quais o mercado contava para alavancar novas construções em estaleiros brasileiros. O presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), Ariovaldo Rocha, foi enfático: “Apesar de nossas expectativas positivas, nos deparamos algumas vezes com notícias que nos inquietam. Na última rodada de licitações de navios de apoio marítimo, para fabricação de 23 unidades, a Petrobras decidiu não contratar embarcações brasileiras, e sim alugar embarcações usadas no mercado internacional. Essa decisão, no nosso entendimento, contraria a política de conteúdo local iniciada no governo Lula e mantida no governo da presidente Dilma Rousseff. Causa inquietação nos estaleiros que investiram em instalações, tecnologia e mão de obra”, disse ele.
O presidente da Transpetro, Sérgio Machado, fez coro, ao afirmar que tudo o que for descoberto no Brasil deve gerar oportunidade para os brasileiros. “Sou contra reduzir o conteúdo nacional”, disse. Para ele, não se deve adotar a importação como consequência de baixa produtividade, pois deve-se atacar a causa do problema, que, acredita, é de gestão e treinamento. “Quais serão os nossos próximos passos? Criamos as pré-condições fundamentais para ter uma indústria naval competitiva, que é ter estaleiros de quinta geração. (...) Os japoneses já vieram para o Brasil, são cinco estaleiros. Temos navios em construção. (...) Temos de chegar a um primeiro patamar, de 50% [de produtividade]. É muita coisa. Mas é totalmente viável. A partir daí, tem uma subida mais fácil. Agora, ficar em 10%, 20% não é aceitável. O Brasil chegando a 50% de competitividade torna-se competitivo com a Coreia do Sul, com o Japão. O nosso caminho agora não é discutir mudança no conteúdo nacional. É descobrir, com os instrumentos que temos, como vamos aumentar a nossa produtividade. Não é chão de fábrica que perde produtividade, é gestão. Se estamos aqui com cinco grupos japoneses que sabem fazer navio, qual é a dificuldade?”, disse Machado.
O presidente da Transpetro acrescentou que não podemos perder o foco, sob pena de se matar definitivamente a indústria. “Hoje na Transpetro nós já recebemos sete navios, tem 14 em construção, cinco em acabamento, até o final do ano recebemos mais quatro. A Transpetro, ao longo desses anos de retomada da indústria naval, cresceu uma média de 14% ao ano, o Ebitda cresceu 15% ao ano e o investimento cresceu 46% ao ano. O Brasil se transformou na quarta carteira de navios no mundo e a terceira em petroleiros. Estamos no rumo certo, temos de afinar a sintonia”, disse.
Para Eduardo Vieira, presidente do Sistema Firjan (Federação das Indústrias do Rio de Janeiro), a saída é descobrir as vocações que podem agregar valor para as empresas e para os trabalhadores. "Não dá para fazer tudo. Precisamos priorizar e definir no que podemos ser melhores. Se focarmos, podemos ampliar em um milhão o número de empregos. Temos que nos estruturar para competir e estabelecer alianças para aumentar a participação do país no cenário internacional", destacou.
O presidente da Frente Parlamentar Mista da Indústria Marítima da Câmara do Deputados, deputado federal Edson Santos(PT/RJ), acredita que o governo deve oferecer esta sustentação para o segmento. "O Congresso Nacional está atento à necessidade de termos uma política governamental perene que ofereça sustentabilidade à cadeia produtiva da construção naval. O Brasil ganha com o crescimento do setor e pode ampliar a presença no mercado internacional”, disse, acrescentando: “A história contemporânea registra que nenhuma grande nação prescindiu do papel do Estado na indução do investimento e do planejamento de sua economia. O setor naval hoje em nosso país deve ser objeto de uma visão de Estado perene, que tenha continuidade”.
As entidades representativas traçam um perfil promissor do segmento. "Estamos otimistas. Vivemos um cenário em que 80% das empresas têm perspectivas positivas e um total de 51,2% têm planos de negócios, o que mostra uma visão de longo prazo. O país dispõe de uma institucionalidade entre governo, empresas e universidades. Nunca se falou tanto em inovação. Acredito que o Brasil será em breve um dos principais players do mundo", frisou Jorge Boeira, coordenador da Área de Energia da Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI).
O gerente de Desenvolvimento do Mercado da Petrobras, Ronaldo Martins, palestrante da conferência da Marintec – Navalshore, enfatiza que a empresa abraça o conteúdo local. “Decidimos que o conteúdo local é mais que um requisito legal, é estratégia da empresa. Os contratos já são publicados com claúsulas específicas de CL, incluindo os de refino e de gás, que seriam opcionais”, explicou.
Ele afirmou ainda: “A tendência é de mantermos a média de 55% e 65% de conteúdo local nos nossos projetos. Isso é um chamariz para empresas estrangeiras produzam no país e um impulso para a indústria nacional. Temos, por exemplo, 27 unidades de produção para serem contratadas entre 2018 e 2030. Isto é um fator de segurança para as empresas planejarem os seus negócios".
O gerente do Departamento de Gás, Petróleo e Bens de Capital sob Encomenda do BNDES, Luiz Marcelo Martins Almeida, ressaltou a importância da participação dos mercados mais experientes neste processo de consolidação da indústria naval e offshore no país: “A indústria estrangeira que vier investir será tratada como uma empresa nacional. As políticas de conteúdo local fomentaram parcerias estratégicas da indústria nacional com parceiros internacionais. Isso tem sido fundamental para cumprir as metas estabelecidas de CL.”
João Rossi, coordenador-geral de Petróleo, Gás e Naval do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), destacou que a indústria nacional precisa aproveitar o momento positivo. “Temos uma previsão de R$ 199 bilhões de investimentos entre 2014 e 2018, segundo dados do BNDES e, desse total, mais de 45% deste valor total de investimentos vão para a indústria. Isso será um desafio para que as empresas nacionais cumpram os requisitos de conteúdo local”, disse.
Uma novidade foi a volta da Rodada de Negócios, que havia deixado de integrar a grade de atrações nas últimas edições da feira. Em parceria com a Associação Brasileira das Empresas de Construção Naval e Offshore (Abenav), uma rodada de negócios durante a Marintec South America. Os encontros reuniram empresas como a EBR, Eisa, Aliança, Vard, MRM, São Carlos, Brasfels, Galáxia, Web e TekSea.
As reuniões aconteceram dia 13 de agosto. “A participação de empresas de grande relevância para o mercado, como os estaleiros Eisa – Estaleiro Ilha S.A, EBR – Estaleiros do Brasil, VARD, Aliança, Brasfels e o armador Galáxia Marítimo, entre outras empresas, foram decisivos para gerar interesse entre as empresas vendedoras”, disse o gerente da Marintec South America, Renan Joel.
— Esta feira vem melhorando ano a ano. Tivemos que ampliar o horário da rodada de negócios promovida, pois foram 90 empresas inscritas para mostrar suas soluções em produtos e serviços para 11 âncoras, sendo seis estaleiros. Isso mostra um cenário de pujança da indústria naval no país e uma tendência ainda maior de crescimento com o aprendizado e consolidação do setor — destacou Augusto Mendonça, presidente da Abenav.
A Abenav e a Kita (KoreaInternational Trade Association), organização privada de fomento às exportações e importações sul-coreanas, firmaram durante a feira um acordo de intenções cujo objetivo é incentivar a troca de conhecimento e tecnologia entre as empresas da indústria naval de ambos os países e incentivar a presença de corporações daquele país no mercado brasileiro. “A cadeia de fornecimento sul-coreana é muito bem organizada e o seu nível tecnológico é internacionalmente reconhecido. A indústria brasileira tem muito a ganhar com uma integração maior entre os dois países”, disse o presidente do Abenav, Augusto Mendonça.
O diretor geral da Kita, JungseokChoi, concordou com Mendonça, e mostrou-se animado com a perspectiva do aumento do volume de negócios entre Brasil e Coreia do Sul, mesmo considerada a restrição de conteúdo local. “Seria bem mais fácil se não houvesse regulamentações e se os dois países tivessem um acordo de livre comércio, mas a perspectiva ainda assim é excelente”, declarou. Segundo ele, a Coreia do Sul detém 30% de market share da indústria naval mundial.
Dois dos bancos que financiam o desenvolvimento da indústrial naval e offshore no Brasil, Caixa e BNDES, renovaram sua crença no setor: “É uma honra e uma responsabilidade muito grande a Caixa participar da Marintec South America, evento que reúne os principais players e fomenta uma reflexão sobre a indústria naval. Temos R$ 5 bilhões já investidos e R$ 12 bilhões em projetos destinados para o setor. Temos visto um mercado bem maduro e consolidado, com uma governança corporativa presente e atuante”, afirmou gerente regional da Caixa Econômica Federal no Rio de Janeiro, Rossano Macedo.
Já o superintendente da Área de Insumos do BNDES, Rodrigo Barcellos, afirmou que o BNDES participa da Marintec South America para reafirmar o compromisso do banco de participar do desenvolvimento da indústria naval e offshore. “Estamos investindo R$ 10 bilhões para impulsionar o segmento no país. Já temos cinco grandes estaleiros funcionando e dois em construção. O nosso grande desafio atual é a construção dos navios-sonda, mas acredito no potencial da nossa indústria, que está sólida.”
Na conferência da feira, o coordenador de infraestrutura do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Carlos Campos, identifica forte ligação da indústria naval com os ciclos econômicos dos países. Ele observa que o esgotamento do ciclo estatal desenvolvimentista nos anos 1990 prejudicou os avanços do setor naval e indaga se o modelo vigente no Brasil está imune aos problemas ocorridos no passado. Ele acrescenta que os problemas do setor são agravados por questões que envolvem ausência de diretrizes, falhas administrativas e corrupção. Para o professor, a falta de exigência de contrapartidas a armadores e estaleiros prejudica o ganho de competitividade internacional.
Outro palestrante, o especialista em infraestrutura sênior no Ministério dos Transportes e doutor em engenharia de produção pela Coppe/UFRJ, Sergio Iaccarino, participou de um grupo de trabalho que estudou formas de aumentar a produtividade e a competitividade de estaleiros nacionais. Ele avalia que, para atingir níveis de eficiência comparáveis ao benchmarking internacional, é necessário que o setor adote critérios para concessão de financiamento para novos estaleiros, apresente projetos de gestão e contrate novas encomendas de forma bem planejada.
Levantamento do Ipea destaca que os desembolsos do Fundo da Marinha Mercante (FMM) para a construção, ampliação e modernização de estaleiros passou de R$ 55,8 milhões, em 2006, para R$ 1 bilhão em 2012. Um dos destaques do fundo foram os desembolsos para construção de embarcações de apoio offshore, que eram de R$ 171,17 milhões, em 2005, e totalizaram R$ 2,434 bilhões, em 2012. Campos ressalta que esse acréscimo tem influência das contratações do Programa de Renovação da Frota de Embarcações de Apoio Marítimo (Prorefam) da Petrobras.
O presidente da Galáxia Marítima, Moacyr Guimarães Filho, diz que hoje sente mais dificuldades como armador do que quando atuava no segmento de estaleiros. Na construção de embarcações, ele relata dificuldades para os armadores e estaleiros apresentarem garantias aos agentes repassadores do Fundo da Marinha Mercante (FMM). No caso da operação, Guimarães afirma que as multas aplicadas aos armadores são uma das principais reclamações entre os filiados à Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo (Abeam). Ele considera a maioria das exigências rigorosas e aplicada injustamente. “Empresas de navegação estão quebrando porque as condições oferecidas para trabalhar estão terríveis”, alerta.
Outra dificuldade, segundo o armador, é o alto custo da tripulação e a dificuldade para capacitá-la. Ele alerta que os novos oficiais estão se formando sem absorver a experiência dos mais antigos. “Falta experiência acumulada que não está sendo passada para os mais novos”, aponta. Além disso, com a legislação atual é mais rigorosa em relação com a mão de obra em relação às décadas de 1970 e 1980. Segundo Guimarães, nesse período havia mão de obra de qualidade disponível e o operário da época estava disposto a “eventuais sacrifícios”.
Guimarães afirma que, se não houver políticas de construção naval bem definidas, a indústria não vai ser produtiva. Os estaleiros antigos precisam de muitos investimentos e têm dificuldade de oferecer garantias. Quando a Petrobras exige itens adicionais os estaleiros ficam em situação complicada porque ficam com pouco tempo para negociar. “Se não houver parceria bem constituída entre cliente e construtor, todo mundo sai perdendo. É ruim para armador, estaleiro e fornecedor.”
O presidente da Galáxia Marítima observa o mercado aquecido na região norte, com demanda para construção de balsas, rebocadores e empurradores. “Existe potencial enorme na área de navegação fluvial”, diz. Guimarães lamenta, no entanto, que o Brasil está longe de atender à quantidade de navios que poderia estar operando na cabotagem e no longo curso.