A baixa qualidade operacional e a reduzida independência administrativa e financeira das três agências reguladoras de transportes - terrestre, que engloba rodovias e ferrovias, aquaviário e de aviação civil - são vistas por investidores como alguns dos principais entraves ao processo de concessão de infraestrutura logística proposto pelo governo federal. A avaliação é de Rafael Valim, presidente do Instituto Brasileiro de Estudos Jurídicos de Infraestrutura (Ibej). "Adotamos um modelo de regulação, mas não o levamos a sério. Não damos as condições adequadas para as agências atuarem."
Valim diz que o processo de decisão nas agências é muito politizado. "Temos bons técnicos, mas as decisões não são técnicas, são tomadas pelo corpo dirigente, que são indicados politicamente", diz. Para ele, temos uma falsa regulação, que afasta o investidor. "A concessão é um negócio de 20, 30 anos. O investidor exige confiança na estabilidade das regras e nos órgãos reguladores. Não estamos oferecendo isso", afirma.
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Ele defende a criação de uma Lei Geral das Agências Reguladoras, com parâmetros para seu funcionamento, critérios para a escolha de dirigentes, para o processo de decisão e mecanismos que garantam sua independência operacional e financeira. Ao mesmo tempo, essa lei estabeleceria um processo de controle social e de fiscalização de suas atividades.
No Senado já tramita desde 2013 um Projeto de Lei (52/2013) de autoria do senador Eunício Oliveira (PMDB-CE) com esse propósito. Mas as propostas são polêmicas. Uma emenda apresentada pelo relator Walter Pinheiro (PT-BA) propõe a criação de um conselho de governo, "um órgão de supervisão, de caráter colegiado e ministerial, que seria responsável pela avaliação e acompanhamento de assuntos regulatórios."
Outra proposta é que os presidentes das agências compareçam, anualmente, ao Congresso para prestar contas de sua atuação. O projeto, com essas propostas incorporadas, foi aprovado no fim de setembro pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania do Senado, mas ainda não há previsão de encaminhamento para o plenário da casa.
Para o consultor econômico Raul Velloso, a supervisão governamental proposta no projeto vai aumentar a interferência sobre as agências, quando o necessário é reduzi-la. "A sociedade pede independência e o governo responde com mais interferência", diz.
José Elaeres Marques Teixeira, coordenador da 3ª Câmara de Coordenação e Revisão da Procuradoria Geral da República, diz que as agências reguladoras brasileiras foram enfraquecidas nos últimos anos e precisam passar por uma série de correções. "Só assim vai melhorar a regulação da infraestrutura e atrairemos investidores privados para o setor", afirma.
Segundo Teixeira, um órgão regulador adequado precisa unir força, eficiência, independência e transparência e um quadro técnico competente para zelar pela qualidade da regulação e dos regulamentos. Não é isso, porém, que ocorre no Brasil. Em sua analise, os executivos são escolhidos por critérios políticos e não por mérito. Não possuem independência operacional, nem financeira, e seus orçamentos são constantemente contingenciados.
Além disso, sofrem constantemente com vacância em seus quadros dirigentes. A Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) entre 2012 e 2015 trabalhou com três diretores interinos, em um total de cinco. O mesmo ocorreu com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) que entre março e agosto só contou com dois diretores, sendo que para qualquer deliberação é necessário, no mínimo, a apreciação de três de seus cinco diretores. Na Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) são três os diretores, mas por um ano só havia um diretor titular no comando da agência. "Nessas condições, uma agência reguladora é facilmente capturada pelos interesses do governo ou do empresariado, havendo uma distorção de seu propósito", afirma.
Fonte: Valor