A crise provocada pelo coronavírus levará o governo a mudar a configuração das concessões em infraestrutura, disse ao Valor a secretária especial do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Martha Seillier. Além do cronograma de leilões, as premissas de demanda e investimento precisarão ser adequadas.
O governo deverá, ainda, facilitar a entrada dos investidores financeiros nas concessões. São os que hoje detêm liquidez, enquanto os operadores de infraestrutura enfrentam dificuldades para pagar empregados e honrar dívidas.
PUBLICIDADE
“A crise nos faz pensar na revisão de regras editalícias e de contrato”, afirmou. “Quanto mais os operadores forem afetados em seus fluxos de caixa, em sua capacidade de investimento, mais será importante buscar o investidor financeiro, o capital que está em busca de retornos e bons projetos.”
A disputa por esse capital promete ser acirrada no pós-pandemia. Esse é um dos motivos que fez acender os sinais de alerta na área econômica quando começou a ganhar força uma discussão sobre o reaquecimento da economia pela via do investimento público, no plano Pró-Brasil.
“É preciso tornar o ambiente de negócios cada vez mais propício e mostrar que somos uma nação que não vai quebrar”, disse a secretária. A manutenção do teto de gastos é um importante sinal nessa direção, afirmou.
As medidas de combate à pandemia vão elevar a dívida pública brasileira para perto de 90% do Produto Interno Bruto (PIB). “Não temos condições fiscais para abraçar um grande plano de investimentos com recursos públicos.”
O programa de concessões ganha ainda mais importância na retomada, avalia a secretária. Só no Ministério da Infraestrutura, estima-se que haja R$ 250 bilhões em investimentos a serem contratados com os leilões programados até 2022.
Todo o esforço é para manter o cronograma tal como estava antes do início da crise, disse Martha. No entanto, setores mais afetados poderão precisar de mais tempo. Na área de Minas e Energia, por exemplo, os leilões de óleo e gás e os de geração e transmissão de energia tiveram seu calendário suspenso. A área de telefonia, por outro lado, vive um aumento de demanda e os preparativos do leilão da internet 5G prosseguem.
Outro setor negativamente afetado é o aéreo. O governo tem programado para este ano o leilão de concessão de 22 aeroportos nas regiões Norte, Sul e Centro-Oeste.
Já há clareza sobre algumas alterações que serão necessárias. Por exemplo, rever a exigência de participação mínima de 15% dos operadores aeroportuários nos consórcios. E alterar a programação de investimentos exigidos em contrato.
As regras das concessões exigem a manutenção de um determinado nível de serviço e conforto no aeroporto, o que é definido pela quantidade de passageiros. “A demanda projetada para 2021, com certeza, está errada”, afirmou a secretária. “O quanto, não sabemos.”
Há muitas incertezas quanto ao uso dos aeroportos após a pandemia. Não se sabe em quanto tempo os voos serão retomados, nem se eles voltarão à quantidade de passageiros de antes da crise. É possível que o uso de tecnologias de comunicação imposto pela pandemia reduza o fluxo de passageiros em rotas como Rio-São Paulo, por exemplo.
Por causa da queda na demanda, o Tribunal de Contas da União (TCU) orientou o governo a rever as projeções de fluxo na rodovia BR-153 em Goiás e Tocantins, a primeira concessão rodoviária na fila de leilões. O mesmo deverá ser feito com o trecho da BR-163 no Mato Grosso e no Pará. A rentabilidade implícita nos preços mínimos de pedágio poderá ser elevada, para atrair o investidor financeiro.
O primeiro teste do apetite dos investidores são os leilões de portos, mais adiantados. Serão oferecidos, por exemplo, três terminais de combustíveis em Itaqui, no Maranhão, um de veículos em Paranaguá, no Paraná, e um celulose em Santos, em São Paulo.
Os leilões de rodovias e aeroportos já estavam programados para o segundo semestre. A área técnica segue com os preparativos para manter as condições de realizá-los, se as condições de mercado permitirem.
Fonte: Valor