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Resolução Normativa n. 18/2017, da Antaq: avanço ou retrocesso?

A Agência Nacional de Transportes Aquaviários, com fundamento constitucional (art. 174), foi criada pela Lei n. 10.233/01 para regular o transporte aquaviário e a atividade portuária, e proteger o interesse público.

Assim, devegarantir a movimentação de pessoas e bens, em cumprimento a padrões de eficiência, segurança, conforto, regularidade, pontualidade e modicidade nos fretes e tarifas.”


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As suas normas devem respeitar a participação dos regulados, e suas escolhas somente serão legítimas se forem sistematicamente eficazes, tecnicamente motivadas, transparentes, imparciais, observarem a moralidade e responsáveis por ações e omissões causadoras de danos juridicamente injustos. Nunca devem tratar o regulado prejudicado, que tem direito à boa administração pública, de súdito, e beneficiar o não regulado sob o argumento que qualquer procedimento para regulá-lo constitui em burocracia.

 

 

Não havia norma para regular os direitos e deveres dos usuários e da empresa de navegação, o que fez com que os abusos cometidos, os custos de transação e a judicialização aumentassem exponencialmente. Por sua vez, a doutrina e a jurisprudência brasileiras continuam acuadas e não criticam essa disfuncional regulação, o que faz com que processos demorem de 15 a 20 anos e, quando terminam, não conseguem ter eficácia na execução. O executado desapareceu, abriu outra empresa. O regulador não sabe.

Passados mais de dezesseis anos da criação da Antaq, não há pesquisa da satisfação dos que usam e operam o transporte aquaviário no longo curso. Nessa regulação espetáculo, forte no Estado de Direito ilegal, que permite a pilhagem, não há uma punição simbólica que o mercado tema, e nem modicidade e previsibilidade.

Este péssimo ambiente de negócios tem provocado muitas denúncias à Antaq, ao MPF, ao TCU e ao Cade, exigindo o cumprimento da Constituição e do marco legal, inclusive com parecer do advogado, Prof. Dr. Joaquim Barbosa (ex-Presidente do STF). Este concluiu pela inconstitucionalidade por omissão da Antaq, ao não exigir outorga de autorização da empresa estrangeira de navegação (EEN), e violação da isonomia entre a EEN e a empresa brasileira de navegação (EBN). Mesmo assim, a agência editou a RN 18, e privilegiou a liberdade contratual (direito privado), incluindo a de preços (sem qualquer limite), e não o regime de direito público.

Infelizmente, a análise da RN mostra que a regulação continuará ineficaz, e aumentará a judicialização. Nela há defeitos (mais de vinte): permanecem a demurrage de contêiner sem limite, embora o Diretor-Geral tenha tentado conter os abusos, mas foi vencido pelo voto-vista do recém-ingressado diretor Francisval Mendes, junto com o Diretor Mario Povia. Essa omissão incentivará a cobrança com preço acima de quarenta vezes o do contêiner, e bem superior ao da carga e do frete, e as dificuldades para processar e executar uma EEN, quando esta causar dano. Tratarei aqui somente da falta de outorga.

Sabemos que a regulação eficaz exige poder dissuasório, ou seja, requisitos para que EBN e EEN prestem serviços, e mensurem, ao pensarem numa prática abusiva, o risco do dano ao interesse público. Este risco depende dos poderes fiscalizatório e sancionatório, mediante advertência, multa, suspensão ou cassação da outorga que, ironicamente, permanecem somente para as EBNs.

Obviamente que tal poder deve observar o devido processo legal, a ampla defesa, o contraditório, a razoabilidade e a proporcionalidade na aplicação da sanção ao infrator.

Após mais de quatro anos de denúncias de usuários contra os abusos da omissão de portos e de cobranças extorsivas de demurrage; dois anos de estudos e duas audiências públicas (Resolução n. 4.271/16, e Resolução 5.032/16), a Antaq publicou a RN 18, em 26.12.17. Esperava-se coragem do regulocratas para não nublarem a regulação.

 

A RN “dispõe sobre os direitos e deveres dos usuários, dos agentes intermediários e das empresas que operam nas navegações de (...), cabotagem e longo curso, e estabelece infrações administrativas”.

 

A análise histórica é relevante para compreender o seu retrocesso. A Resolução n. 4271 aprovou a proposta de Norma que dispõe sobre os direitos e deveres dos usuários e das empresas que operam nas navegações de (...), cabotagem e longo curso.

 

A norma deveria regular a EEN, tanto é que no seu art. 2º, III e IV, definia as duas espécies de empresas: EBN e EEN. Inexistia agente intermediário, mas na audiência na FIESP, representantes das EEN´s solicitaram a sua inclusão. A Antaq disse que analisaria as sugestões e submeteria o texto a mais uma audiência pública.

 

 

Pois bem, foi publicada a Res. n. 5032, que dispõe sobre os direitos e deveres dos usuários, dos agentes intermediários e das empresas que operam nas navegações de (...), cabotagem e longo curso.

 

Portanto, ainda que não fosse exigida garantia financeira, o intermediário passou a ser o principal responsável pelos deveres da EEN, sendo ‘todo aquele que intermedeia a operação de transporte entre o usuário e o transportador marítimo efetivo (TME) ou que representa o TME, podendo ser: a) agente transitário: (...), sem ser responsável por emitir conhecimento de carga ou BL; ou b) agente marítimo: todo aquele que, representando o TME, contrata serviços e facilidades portuárias ou age em nome dele perante autoridades no porto ou perante os usuários.”

 

Além disso, o seu art. 2º criou um cadastro e exigiu seguro para a EEN que operasse nos portos brasileiros: “cadastro de transportador marítimo estrangeiro – CATE: formulário informatizado disponibilizado pela Antaq em sua página na internet, que contempla as operações da navegação de longo curso com origem ou destino em portos brasileiro, destinado ao preenchimento pelo TME, por agente marítimo que o represente ou mandatário – informando o (...) Clube de Proteção e Indenização (...) vinculado, com a data da cobertura do seguro.”

 

O dispositivo foi criticado porque não havia poder dissuasório, outorga de autorização e cassação, esta aplicada excepcionalmente, e foi suprimido na RN 18, que exige tão somente homologação para o NVOCC, sem garantia.

 

Foram feitas quase mil contribuições, e a de n. 739, de nossa autoria, dentre várias outras na defesa de usuários, agentes intermediários, terminais e EBNs, para criar a:VI - outorga de autorização para o transportador marítimo estrangeiro – OATME: ato administrativo que autoriza o transportador marítimo estrangeiro a operar na navegação de longo curso com origem ou destino em portos brasileiros, observados o acordo bilateral com o país da bandeira das embarcações do referido transportador e os arts. 1134 a 1141 do Código Civil (...).”

 

A justificativa foi: “Procedimento exigido para que empresa estrangeira de navegação possa operar no Brasil, nos termos do art. 46 da Lei da Antaq, art. 731 e arts. 1134 e 1141 do Código Civil. A proposta está alinhada com a decisão do TCU no Acórdão 1439/2016, itens 9.3.4. O CATE proposto é ineficaz. Sem a outorga de autorização, bem como sanções de advertência, multa, suspensão e cassação da outorga, não há qualquer possibilidade de poder dissuasório do regulador, para fins de proteção do interesse nacional, especialmente as atividades das EBN´s (que concorrem em desigualdade de condições com as estrangeiras), terminais portuários e usuários. (...)”

 

Mesmo assim, sem Análise de Impacto Regulatório, a Antaq insistiu em manter as EENs que transportam 95% dos contêineres no Comex, fora da regulação, mas, ironicamente, punir agentes intermediários, terminais, EBNs e usuários, aqueles que pagam tributos para a União pagar os seus servidores.

 

Talvez sejamos o único país no mundo, onde o direito determina que a agência regule uma EEN, mas esta é excluída, enquanto o seu agente e a empresa doméstica de navegação são regulados. Ora, se até o mototáxi precisa de autorização municipal para operar, por que não autorizar 22 EENs?

 

Em síntese, não há qualquer outorga, registro, monitoramento de preços de frete e surcharges, garantia e sanção a ser aplicada à EEN, em desacordo com o TCU que, em decisão unânime no Acórdão n. 1.439/2016 – da relatoria da Ministra Ana Arraes, determinou à Antaq que: (...) 9.3.4. com fundamento no art. 178 da Constituição Federal e no art. 1º, III, da Lei 9.432/1997, institua, em 90 (noventa) dias, procedimento que ateste e assegure que as empresas de navegação estrangeiras que atendem aos portos brasileiros estão enquadradas nos acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade, por meio de outorga de autorização ou outro ato administrativo com esse fim, (...), apresente, em 90 (noventa) dias, plano de ação voltado à regulação, ordenação e supervisão da navegação de longo curso nos portos brasileiros, de forma a permitir o controle dessa atividade, contemplando, dentre outras questões que considere pertinentes: o registro de armadores estrangeiros; o registro de preços de frete, extra-frete e demais serviços; estudos comparativos de rotas e preços praticados pelos armadores estrangeiros; e normas para aplicação de sanção aos armadores estrangeiros em caso de omissões injustificadas de portos;”

 

A fuga regulatória da Antaq, quando deveria “mostrar os dentes” para defender o interesse público e reduzir o Custo Antaq, é cristalina. Fora da regulação, permanecem 22 EENs, as externalidades negativas, o cartel, as evidências de crime de usura e de sonegação fiscal; dentro da regulação, 43 EBNs de cabotagem, 20 EBNs de longo curso, milhares de agentes intermediários, mais de 200 mil usuários e fornecedores de navios; mais de 200 terminais portuários e 18 mil magistrados para julgar mais de 108 milhões de processos, que continuarão arcando com os custos de transação das escolhas equivocadas da RN 18.

Não há plano de ação, nem outorga, nem critérios de modicidade, nem política de defesa da concorrência para as EENs que operam no Brasil. Há regulação? Parece-nos que o regulador insiste em continuar não mostrando os dentes.






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