BRASÍLIA - O pedido de doação de R$ 150 mil para a campanha do PT de Santa Catarina - cuja principal representante é a ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais) - feito ao fabricante da polêmica frota de lanchas-patrulha partiu de um ocupante de alto cargo de confiança do Ministério da Pesca. Karim Bacha era o secretário de Planejamento da pasta, enquadrado na faixa de remuneração mais alta da Esplanada, na época em que foi assinado o contrato com a empresa.
Trata-se de um personagem importante na compra de 28 lanchas-patrulha, ao preço de R$ 31 milhões, sem necessidade comprovada e suspeita de licitação dirigida, conforme investigação do Tribunal de Contas da União (TCU). No início de setembro de 2010, Bacha, que também é filiado ao PT, estava engajado na campanha de Ideli ao governo de Santa Catarina e pediu ao dono da Intech Boating, fabricante das embarcações, uma doação ao partido. A fabricante foi um dos muitos alvos entre o empresariado por parte do servidor que buscava dinheiro para o PT e para a campanha de Ideli.
“Durante o processo eleitoral, acabamos conversando com muitas pessoas. Eu posso ter conversado com o Neto também. Não vou dizer que não, porque faz tanto tempo”, respondeu Bacha ao Estado, referindo-se a José Antônio Galízio Neto, dono da Intech Boating. O petista admite que falou com outros empresários quando servidor da pasta, mas nega a existência de uma rede de captação de recursos.
O empresário confirma: “Tive contato com ele, sim. Foi mais ou menos uma semana, dez dias antes de eu fazer a doação, uma coisa assim. No meio da campanha, próximo das eleições, foi solicitado que a gente... bem, o resto você já sabe”, reagiu nesta terça-feira, 3, Galízio Neto, que revelara ao Estado na semana passada ter doado R$ 150 mil ao PT “por solicitação” do ministério, depois de ganhar o contrato.
A doação da Intech Boating ao comitê financeiro do PT foi feita em 13 de setembro de 2010, segundo registro do Tribunal Superior Eleitoral. O comitê financeiro bancou 81% (R$ 2,9 milhões) dos custos da campanha de Ideli ao governo de Santa Catarina. A ministra afirmou nesta terça-feira que a doação foi legal e negou ter qualquer responsabilidade pelo contrato das lanchas.
Ao perder a eleição, Ideli foi escalada por Dilma Rousseff para comandar o Ministério da Pesca. Antes de trocar o cargo pela coordenação política do governo, em junho de 2011, a ministra quitou uma conta pendente de R$ 5,2 milhões com a Intech. Mais de dez lanchas ficaram sem destino até o final de 2011, quando o sucessor de Ideli, Luiz Sérgio (PT-RJ), fechou acordo para ceder as embarcações à Marinha.
Longa história. A primeira das lanchas-patrulha encomendadas pela Pesca foi entregue em julho de 2009 à Polícia Militar Ambiental de Santa Catarina. Era o resultado de uma negociação que começara no ano anterior, segundo reconstituição feita pelo Estado com base em depoimentos de personagens da história.
O comandante da Polícia Militar Ambiental de Santa Catarina, coronel Rogério Rodrigues, conta que, em 2008, procurava uma lancha para a tarefa de fiscalização no Estado. “Eu gostei do modelo (da Intech) e solicitei ao pessoal do Ministério da Pesca que fizesse uma aquisição para nós, só isso”, resumiu o coronel, sobre o primeiro contato com o ex-secretário de Planejamento da Pesca, Karim Bacha.
O ministério não tinha competência para fiscalizar a pesca ilegal. Ainda assim, a equipe do então ministro Altemir Gregolin (PT-SC) lançou mão de duas emendas parlamentares aprovadas no Congresso pelas bancadas do Pará e do Maranhão destinadas à atividade pesqueira nos dois Estados para fazer a compra das 28 lanchas-patrulha.
O Pará recebeu uma lancha, mas ela nunca entrou em operação. Recentemente, a embarcação foi repassada à Marinha. O Maranhão só recebeu a primeira lancha em 2001, entregue à Polícia Militar do Estado. As últimas quatro das 19 lanchas que ficaram sem uso por mais de um ano ainda estão sob a guarda da Intech. A previsão é que seu destino seja definido até o final do mês.
Karim Bacha foi exonerado do cargo na Pesca cerca de dois meses após Ideli assumir a pasta. O petista hoje é pré-candidato à Prefeitura de Laguna e trabalha para o partido em Santa Catarina.
Fonte: Marta Salomon, de O Estado de S. Paulo
PUBLICIDADE